1718 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 92
Queremos assinalar o que foi consequência de uma directa verificação, embora facto já consabido e justamente destacado, no que toca ao que as gerações de hoje e as de amanhã ficam a dever à multiplicidade das tarefas das forças armadas, visando não só garantir a soberania do solo pátrio em terras de África, mas também o seu progresso material, o seu fomento económico e assistência médico-sanitária, a preparação e evolução do nível técnico-profissional dos aborígenes - súmula de uma obra notabilíssima de convívio fraterno e de cariz cristão, obra de criação de riqueza e de valorização social, de civilização e de cultura! Pois à luz da história, produto da lição dos factos, ontem como hoje, não correspondeu sempre o domínio de Portugal ao reino de cristãos e não foi inalteravelmente missão mais alta dos Portugueses respeitar a eminente dignidade da pessoa humana, espalhar a semente da fé e conquistar almas para Deus?!
Não querendo, nem podendo, sem grave pecado de injustiça, omitir as homenagens devidas ao patriotismo e intrepidez de todas as forças de segurança e voluntariado de defesa, referimos a nossa presença em Vila Cabral na exposição de material moderno, diversificado e abundantíssimo, de origem russa, chinesa e checoslovaca, apreendido aos terroristas apenas e exclusivamente pelos destemidos elementos da milícia, em vigilante actuação nas regiões mais densamente infestadas pelo inimigo vindo do exterior.
Como já acontecera na capital daquele distrito, na cidade de Nampula também visitámos detidamente, na companhia amável e esclarecedora dos Srs. Oficiais Generais e elementos superiores das forças armadas, todas as instalações do departamento hospitalar, na parte ligada à sua actual estrutura e na que concerne à complementaridade dos pavilhões em construção. Apraz-nos pôr em relevo, a par da eficiência técnica dos serviços, a nota de simpatia humana, despertadora de funda emoção, emergente do carinho e dedicação atenciosa com que são tratados e assistidos os militares hospitalizados. Estivemos junto da cabeceira dos leitos desses bravos rapazes, dialogámos com eles, ouvimo-los sobre a natureza dos agentes provocadores das suas enfermidades e quisemos ansiosamente saber da evolução dos seus padecimentos. Pois à fé de nós mesmos podemos jurar que nenhum revelou sintomas de acabrunhamento moral, de depressão psíquica, de desilusão ou de desespero contra os fados da vida, de tal sorte, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, se lhes era possível, graças a Deus, manifestar sinais de estarem somaticamente a recuperar-se, a sua alma continuava incólume, plena de fortaleza, todos desejando e gritando a esperança de uma pronta e total recomposição física para rápido regresso ao serviços das armas, na continuada luta imposta pela indeclinável defesa da causa sacrossanta da Pátria! Como isto é grande, é edificante, é sintomático e é enternecedor, Sr. Presidente!!!
Partindo de Porto Amélia, sobrevoámos, através de larga e inesquecível viagem feita a bordo de um bimotor, o Nordeste do distrito de Cabo Delgado, onde fora mais violenta a erupção terrorista, como se sabe manobrada, repetimos, do estrangeiro e efectivada por meio de elementos estranhos às populações autóctones, aliciados, treinados e municiados nos territórios vizinhos, sob a tutela de vozes de comando vindas ainda de mais longe ...
Aterrámos em alguns aldeamentos o mais descontraidamente que possa imaginar-se, contactando com as suas populações, nas quais os elementos de raça branca quase se podiam contar pelo número de dedos de uma das mãos, e por elas fomos recebidos em ambiente de alvoroço entusiástico e de franca hospitalidade. Na aldeia de Quissengue. bem ao norte de Cabo Delgado, com cerca de 1500 almas e mais de 250 crianças em idade escolar, surpreendeu-nos e comoveu-nos, Sr. Presidente, a apresentação esmerada de números de ginástica, recitativos, bailados e cânticos da nossa Beira, do nosso Minho, e até da nossa ilha da Madeira, graciosamente interpretados por gente de palmo e meio, revelando uma presença, um à-vontade e um poder de comunicabilidade difíceis de prever. Do mesmo modo nos misturámos, confiadamente, sem a mínima precaução, com os habitantes de Nica de Rovuma, na parte mais cimeira de Cabo Delgado, em plena zona terrorista, muito perto da fronteira com a Tanzânia. Pois também aí fomos carinhosamente recebidos pelos nativos, velhos, novos e crianças, em perfeita paridade de alvoroço e de alegria esfuziantes.
Mais uma vez, Sr. Presidente, admirámos e nos extasiámos com o aprimoramento da exibição das crianças e dos jovens, que, exprimindo-se em bom português, bem silabado, através de uma dicção impecável, nos deram um impressionante testemunho dos belos atributos que por modo excelente os qualificam como seguramente iniciados na arte de declamar, de interpretar e de representar! Se grande embevecimento nos tomava a alma contemplando, ao raso dos aldeamentos, esse quadro maravilhoso de ternura, de calor humano e de reconfortante espírito lusíada, o nosso coração de portugueses pulsava ainda mais forte sempre que, ao alçarmos os nossos olhos, enxergávamos, drapejando ovante, ao vento, recortada no fundo azul do céu, bem no tope de mastro alto e desempenado, a sagrada bandeira bicolor, que, no seu cromatismo simbólico, recordando o sangue rubro dos heróis e dos mártires e a clara esperança e a fé robusta dos que aguardam e não desesperam nem temem, era a mensagem expressiva e viva da Pátria, íntegra e sempiterna no caldeamento e unidade das suas etnias e dos vários territórios em sua expressão pluricontinental.
Momento altamente solene por nós vivido foi aquele em que, junto aos seus colegas em formatura, na expressiva singeleza circundante, sem espectaculosidades cenográficas de qualquer espécie, numa visível concentração e meditação e respeito gerais, pelo que imprime de grandeza e dá verdadeiro significado à vida, foram condecorados alguns elementos das milícias, nobres portugueses de cor que receberam a justa consagração dos seus feitos excepcionais em operações de campanha.
A aterragem em Mocímboa da Praia facultou-nos um contacto estreito e sumamente agradável com as categorizadas entidades oficiais e demais elementos representativos da sua fidalga população, atingindo-se de seguida, em penúltima etapa do nosso roteiro aéreo, uma base de natureza puramente militar, situada algures na vastidão daquela região moçambicana. E mais uma vez, mercê do que cuidadosamente observámos e das impressões largamente trocadas com os jovens metropolitanos e ultramarinos que naquelas inóspitas paragens, numa situação de completo isolamento, estão firmemente de ronda à figura augusta da Pátria, velando sem descanso, dia e noite, pela segurança das vidas e defesa das fazendas dos seus irmãos de cor, colhemos a ratificação inequívoca da fortaleza de ânimo, da têmpera de vontade, da clara determinação, do exemplar desprendimento, da fibra rija, que distinguem e singularizam, dignificam e enobrecem os nossos soldados, que se dão por inteiro à grandeza e à excelsitude da missão de que estão incumbidos, correspondendo plenamente às responsabilidades da sua ascendência lusíada e às distintas tradições do exército heróico a que pertencem! Pensando na epopeia das nossas forças armadas, possuidoras de uma tão firme vontade e decidida coragem, desassombradas, destemidas e insensíveis ao sacrifício, na consciência de que dar a vida pela Pátria é suprema