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2190 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 117

citar o Sr. Gama Barros, que na sua História da Administração Pública dedicou à história do clero português e da organização eclesiástica um capítulo muito notável, mas incompleto, mesmo em relação à época de que se ocupa.
Ainda hoje, os mais exigentes especialistas não sentiriam repugnância em subscrever a substância destas anotações histórico-críticas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Merece o devido relevo não apenas o trabalho, mas também a dignidade mental e a modéstia exemplar de Fortunato de Almeida. Não se aproveita das tarefas alheias, não usurpa méritos e glórias de ninguém. Da sua mesma tentativa, diz que lhe foi sugerida, mal saía da Universidade, pelo Dr. José Joaquim Lopes Praça, que nele descobrira amor ao trabalho, certo espírito de disciplina e predilecção pelos estudos históricos. Perfeitamente consciente das limitações com que lutava, anotou:

Quem formasse o plano de escrever a história da Igreja em Portugal depois de revolver os arquivos do reino jamais conseguiria realizar a sua obra. Esse
programa de trabalho excede as forças de um só homem e demanda despesas e sacrifícios de interesses que não teriam compensação. Os arquivos carecem de ser revolvidos, mas por conta do Estado, para se publicarem e oferecerem aos estudiosos os documentos que em tão grande número lá jazem esquecidos. A consulta dos arquivos está, no meu plano, limitada a determinadas épocas e assuntos.

Fortunato de Almeida concretiza o seu objectivo específico: organizar um corpo de trabalho com os materiais que existem dispersos em centenas de volumes, respigando e joeirando, para se dar à construção a maior solidez possível. Assentar os alicerces e urdir a contextura geral é a parte mais difícil e menos atraente; caiba-me a satisfação de o haver tentado, com inteiro amor à verdade.
Foi assim que trabalhou Fortunato de Almeida na História da Igreja em Portugal. E Mons. Miguel de Oliveira, como uma autoridade que todos reconhecemos, apreciando o seu labor, escreve:

Deve-se a Fortunato dê Almeida o trabalho monumental de aproveitar e pôr em ordem quase tudo quanto se havia publicado sobre a história da Igreja em Portugal, desde as obras de conjunto, mas incompletas e falhas de crítica, até às crónicas monásticas, histórias particulares de diversas igrejas, memórias académicas, biografias de prelados, etc. Dependerá sempre do trabalho deste benemérito autor tudo que se faca com os mesmos elementos, sob pena de se gastarem inutilmente energias que melhor se empregariam em investigações documentais.

Durante dez anos, mesmo quando ocupações profissionais lhe não permitiam estudar e coordenar, Fortunato foi reunindo materiais. Não direi que seja perfeito o seu trabalho de estruturação da História da Igreja em Portugal, quer na distribuição das matérias, quer na proporção e harmonia das suas divisões ou partes integrantes, mas a validade, o préstimo, a dignidade e grandeza monumental do seu trabalho são indiscutíveis.
Já foi sublinhado que trabalhou por amor, por amor à Igreja, este leigo. E esse amor lhe valeu ser atingido por algumas granadas... de amêndoas.
Porém, Fortunato de Almeida nunca se arrependeu, apesar de ter morrido pobre, sem deixar a família instalada. E não é caso único nem foi o primeiro. Antes dele, Ludovicus Pastor correu da Alemanha para Roma, quando Leão XIII facultou aos historiadores a devassa dos arquivos do Vaticano. Neles dormiam, dizia-se, os grandes segredos da história da Europa. E a alguns parecia-lhes ouvir ressonar, em leitos do pó dos séculos, os crimes da Igreja. Leão XIII não hesitou, considerando válida a divisa de Cícero (veritas, tota veritas, sola veritas...) e reconhecendo que possíveis manchas, se realmente existissem, reforçariam, por contraste, os esplendores das benemerências da Igreja na história da civilização e da libertação do homem, escravo de ignorâncias e de sujeições a ídolos e fantasmas terroristas. Patentearam-se os arquivos do Vaticano e a Igreja saiu glorificada em vez de humilhada. Ludovicus Pastor ofereceu à Igreja, à Europa e u humanidade a famosa e monumental História dos Papas, em vários e grossos volumes, hoje traduzidos em diversas línguas. No seu trabalho, em que se empenhava com devoção e amor que chegam a comover, foi coadjuvado pelas filhas. E também Fortunato de Almeida pôde contar, nas tarefas da sua História da Igreja em Portugal, com a dedicada colaboração das suas filhas, que ainda vivem e a quem endereço uma palavra de saudação respeitosa e de homenagem de reconhecimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Fortunato de Almeida amou e serviu a Igreja, a que guardou exemplar fidelidade. E amou e serviu também a cultura do seu país, a sua pátria. Sabia que as actividades da Igreja foram a coluna de suporte ou o esqueleto da história da civilização europeia. E da de Portugal diz:

Pretender estudar a evolução histórica do povo português abstraindo previamente da sua vida religiosa e da missão do clero regular e secular seria o mesmo que tentar compreender o mecanismo circulatório fora dos vasos sanguíneos...

Sublinha ainda a importância da História da Igreja para corrigir desvios ideológicos nos termos seguintes:

Por não se ter estudado devidamente a história eclesiástica de Portugal, muitas páginas da nossa história política e social não foram ainda compreendidas, e, acerca delas, se têm emitido os juízos mais desarrazoados e, por vezes, os mais absurdos e caprichosos.

Uma vez que Fortunato de Almeida foi benemérito da Igreja, da Pátria e da cultura nacional, atrevo-me a sugerir que a Igreja, a Pátria e as instituições culturais do País celebrem, condignamente, o primeiro e próximo centenário do seu nascimento, que se cumprirá em 1969.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O seu grande monumento, bem sei. é a sua História da Igreja em Portugal, que se ia tornando raridade bibliográfica e está novamente em publicação, em edição orientada por mão de mestre, mestre insigne, que é o Prof. Doutor Damião Peres, cuja tarefa se apoia nesse exemplar da edição anterior, com notas e observações pessoais do próprio Fortunato de Almeida. Outro monumento, monumento perene, é o exemplo que Fortunato de Almeida nos legou... de homem, de cristão e de português.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Mas a circunstância não diminui, antes acrescenta, a obrigação moral de celebrar o seu centená-