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27 DE FEVEREIRO DE 1960 3289

legislação vigente quanto ao problema da assistência à velhice. Isto porque me parece não terem sido suficientemente integrados na instrução desse problema que se vem processando nesta tribuna sobre o aviso prévio do ilustre Sr. Deputado Agostinho Cardoso.
Vêm sendo focados, aliás com larga competência o sabedoria, sobretudo aspectos de ordem sociológica, médica, moral, de assistência, previdência; que sei eu?
Tudo está muito bem como condições à formulação e planificação de uma política da velhice, que o douto avisante sugere constitua objecto do labor construtivo de uma comissão de estudos dos problemas da velhice, a instituir pelo Governo.
Mas a esse estudo não pode escapar aquilo que. já sobre a matéria constitui lei vigente, quite de se aperfeiçoar, jurídica e administrativamente, e coordenar com futuras providências de natureza pública ou quase pública a instituir.
Quero referir-me em particular à matéria designada na doutrina civilista por «alimentos» e que constitui o objecto do título V do livro IV - «Direitos de família» - do vigente Código Civil (artigos 2003.º e seguintes).
No Código de Seabra, a obrigação de alimentos achava-se especificadamente consignada na secção do capítulo atinente ao poder paternal (artigos -171.º e seguintes).
A matéria legislada transitou de um para outro diploma, quanto ao essencial, na mesma sendo no entanto de louvar o aperfeiçoamento que &e nota no Código vigente quanto à sua localização e sistemático, corrigindo-se os vícios de dispersão do anterior.
Assenta o assim legislado ainda no princípio de que, regra geral, tal matéria se integre na dominante do instituto da família, ao fogo do amor que os respectivos membros devem alimentar-se reciprocamente: o «amarás teu pai e tua mãe» do catecismo.
Em face das realidades presentes já, contudo, ensinava advertidamente a propósito o Prof. Vaz Serra no seu estudo sobre a «Obrigação de alimentos», publicado como preparatório do Código vigente no n.º 108 (Julho de 1961) do Boletim do Ministério da Justiça, a p. 20, nota que:

A obrigação alimentar não tem actualmente a importância prática que possuía antes, porque o Estado (através da segurança ou previdência social e da generalização do regime de aposentações), a diminuição de muitas fortunas particulares e a dispersão das famílias têm-lhe tirado grande parte dessa importância.

Esta observação, se condiciona, não obsta aos princípios definidos nas citadas disposições legais e apenas impõe que os aspectos sociais novos do problema SB venham a edificar partindo da raiz válida do amor da família, ou no da sua aproximação pela caridade cristã, sem o que as suas supostas soluções não corresponderão senão a paraísos artificiais, porventura lindíssimos por fora, mas mirrados por dentro.
Nas citadas disposições do Código Civil define-se logo, no artigo 2003.º, entender-se por «alimento tudo que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário». No artigo 2004.º se estatui que na sua fixação - que quando não por acordo é definida pelo juiz - se atenderá «aos meios de quem houver de prestá-los e às necessidades do quem houver de recebê-los. Pelos artigos 2009.º e 2020.º se prescreve a obrigação de alimentos dos descendentes em favor dos respectivos ascendentes.
Estes preceitos eram os tradicionais do nosso direito, como ver se pode nas Instituições, de Coelho da Rocha, §§ 318 e seguintes - segundo haviam sido definidos pelo Assento de 9 de Abril de 1772.
Como o mesmo autor salienta, «a obrigação de alimentos ordinariamente anda anexa ao direito de sucessão legítima». E isto ainda residualmente o sugere tanto o n.º 2.º do artigo 2009.º do Código vigente como o artigo 177." do de Seabra. E a sua natureza de um direito, como que originário, se traduz em não poder ser objecto de renúncia, nem de pactos sucessórios (artigo 2008.º).
Inculca o douto Sr. Deputado avisante na alínea c) do seu discurso entre os estudos a fazer precisamente o da possibilidade de uma legislação a favor dos descendentes. As linhas gerais dessa reforma seriam precisamente as promulgadas já, segundo oremos, através das citadas disposições do Código Civil.
Em abono do avisante, neste ponto há que reconhecer não dever causar surpresa, passe esta legislação despercebida dos que não sejam técnicos de direito pelo que respeita aos descendentes, isto é, aos velhos, tão corrente tem sido a prática do seu desuso.
Assim, devemos ter como assente que esta matéria de protecção à velhice não pode deixar de basear-se nos citados princípios do Código, embora ampliados, completados e tornados mais actuais e eficazes contra a maré de agressão à estabilidade da família a que, com ansiedade, assistimos.
A efectivação das respectivas obrigações tem de realizar-se normalmente hoje, pelo recurso aos meios de processo ordinário, tão moroso quão dispendioso. E o que é paradoxalmente curioso é que esses meios só se vêem abreviados quando se trata, não de defender a família, mas de prover, aquando da dissolução desta pelo desquite de qualquer índole, à subsistência dos desquitados.
Tanto basta para dever encarar-se uma reforma processual em que essas dificuldades sejam reduzidas, prevendo-se processo especial simplificado para o efeito, que por agora só existe na fase executiva das respectivas pensões (artigo 1118.º do Código de Processo Civil).
Atendendo ainda a que tal processo é de natureza predominantemente administrativa sobre a contenciosa, não se deveria de preferência desenrolar, quando possível, nas estancias tutelares de menores, para o efeito alargadas?
Não tende a velhice para uma segunda infância?
Por outro lado, em apoio quanto a alimentos aos provectos descendentes, ou outros, não seriam de encarar medidas coactivas penais análogas às previstas pela Lei n.º 2053, de 22 de Marco de 1952, a favor dos menores quanto a alimentos?
O benefício desta lei, em boa hora inspirada no projecto do nosso ilustre colega Sr. Paulo Cancella de Abreu, tudo parece aconselhar a que se possa estender aos alimentos relativos aos descendentes.
A súmula das considerações que acabamos de fazer parece deverão ser tidas em conta ao redigir-se a moção dirigida ao Governo, a ser votada como fecho deste diálogo monologado em série.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Estas as razões que me levaram a quebrar o propósito de não intervir em assuntos atinentes ao que poderia considerar-se como em causa própria. E aqui deixo, intervindo no debate, esta pequena achega para a solução integrada, como o douto avisante