DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 49 1014
Inteiro e seguro de si, Portugal poderá continuar afoito na demanda Ide melhores condições de vida para seus filhos. Quanto, sem a firmeza e a inteligência desses quarenta anos, teríamos pendido no caminho, não é das capacidades humanas assentar: mas, avaliando pelos antecedentes, e sem embargo de fugazes satisfações de propugnadores de outros métodos, é lícito crer que muitíssimo!
Salazar: homem e estadista, principios em acção. Vontade só obediente à razão e à lei morou; inteligência capaz das mais altas concepções, mas também cuidadosa dos mais miúdos pormenores. Indivíduo que honrou a espécie; português que engrandeceu a Pátria. Deixou-nos uma lição e fortificou-nos para o futuro.
É justo que o honremos!
Tem a palavra o Sr. Deputado João Manuel Alves.
O Sr. João Manuel Alves: - Sr. Presidente: Atrevo-me a subir a esta tribuna, a evocar a figura de Salazar, deslustrando o lugar e a memória do homenageado, com a modéstia do meu discurso, por duas razões que adiante enumerarei.
Entendo dever desculpar-me perante VV. Ex.as, Srs. Deputados, porquanto o momento é de tal modo sublime, pelo que encerra de gratidão, e são tais as responsabilidades desta Assembleia que não bastará, a quem queira entrar na composição da coroa de flores que a Câmara, ao iniciar os seus trabalhos, quer depositar na campa rasa do cemitério do Vimieiro, nem os sentimentos de profunda admiração pelo homem que se recorda, nem a sinceridade e independência dos juízos acerca da sua obra. Necessário se torna, ainda, que se lhe dê a forma que só a eloquência pode fazer bela, digna e nobre - como convém as responsabilidades e à tradição desta Casa e, naturalmente, aos desejos de todos nós.
Arrisco-me, por isso, a que as minhas palavras fiquem como peças destoantes do monumento que a eloquência dos demais Srs. Deputados vai deixar erigido.
Julguei, porém, que não devia negar o meu contributo, antes se me impunha tal atrevimento, já por representar aqui o circulo de Viseu, com a circunstância especial não só de ter responsabilidades político-administrativas na sua terra natal, como também de aí viver, já, ainda, porque, tendo nascido depois de Salazar ter anunciado ao País a Ordem Nova por que Portugal passou a reger-se, não entoam nos meus juízos, acerca da sua personalidade e da obra do Regime que instituiu, conhecimento directo dos factos (a não ser pela história que fizeram) precedentes do seu advento ma cena política do Pais.
Por outro lado, não tendo recebido favores pessoais, nem, do Regime, especiais responsabilidades, posso apresentar-me - e de facto sou- independente nas minhas
Quem acreditar que a Providência, nos seus divinos desígnios, vela tanto pelas pessoas como pelas nações, encontrará, tanto na personalidade de Salazar, na sua expressão endógena, como mós factos ou circunstâncias exteriores que contribuíram para a formar e robustecer, motivos bastantes para alimentar a sua crença.
É que sem Salazar, sem o sábio e pensador que ele ara das coisas políticas, quando o Exército, em 1926, tomou sobre os seus ombros a heróica tarefa de salvação nacional, pondo termo a anarquia em que a Nação mergulhara1 desde há um século, a ditadura que instituiu ficaria - como outras vezes aconteceu - ou como episódica reacção ao statu quo anterior ou descambaria para o despotismo, que haveria de ocasionar reacções de consequências ainda piores.
Salazar entra para o Governo apenas como técnico - uma das tarefas que se impunha para salvar a Nação era a reorganização das finanças do Estado -, mas, dentro em pouco, ele se mostrará ser o único, nesse Governo, que tinha, por formação intelectual, uma mensagem política.
E é o frio técnico de finanças que, dentro em breve, passa a ser porta-voz da orientação política da Ditadura e em quem se adivinha, afinal, também o seu definidor.
Estavam encontrados o homem e a doutrina, de que aquele momento difícil tão urgentemente carecia, de modo a que pudesse encher-se o vazio, que a supressão pêlos militares do anterior regime trouxera a vida política do País, e a Ditadura fosse o que afinal veio a ser - o início de uma nova era política para os Portugueses.
Podem discutir-se as soluções que defendeu e intransigentemente seguiu, mas do que ninguém duvidará é de que, sem elas, passado o período eufórico, ou se voltaria aos erros recentes ou se institucionalizaria a própria Ditadura, com os perigos do poder despótico e das reacções de que a História nos dá permanentes exemplos.
No primeiro caso, o movimento militar não passaria de mais um episódio heróico-romântico da nossa longa existência política; no segundo, talvez fosse acontecimento para esquecer, senão para só amarguradamente recordar.
Parece, assim -e aqui volto ao pensamento inicial-, que a Providência havia ordenado as coisas para que não fosse vã a acção desses militares, para que não fossem vãos os seus sentimentos puros de amor pátrio, que os levou a empunhar o gládio -que afinal nem usaram - para salvar a Nação da mediocridade e anarquia em que havia mergulhado. E ofereceu-lhe, na pessoa do Professor de Coimbra, um homem a quem, natural e carismaticamente predisposto para as grandes tarefas do espírito, várias circunstâncias, que rodearam a sua vida, haviam fortalecido a inteligência, apurado a vontade, sublimado a consciência do dever, gerado a renúncia material, desenvolvido o amor ao seu semelhante e á Pátria.
Essas circunstâncias levam-me a que acrescente aqui algumas reflexões à sua biografia.
Nasceu Salazar «pobre, filho de pobres», veio de baixo, do povo, da pobreza, de uma família de modestos agricultores, o que lhe deu, não só a vivência da inferioridade das condições de vida dos humildes, mas também uma perspectiva exacta do povo, do verdadeiro povo português, das suas carências materiais e das suas virtudes morais.
Quando a sua inteligência se começa a abrir para o mundo que o cerca, é Portugal sacudido da mórbida apatia em que havia caído, pela gesta heróica de Mouzinho e pelas acusações que este dirige aos políticos da época.
Ao contrário de muitos de igual condição, os pais fazem-no aprender as primeiras letras e mais: dada a falta de professor na sua terra, não hesitam, apesar das suas poucas posses, no sacrifício providencial de o mandar para Viseu concluir a instrução primária.
Concluídos os estudos primários, entra para o Seminário de Viseu.
Os seus biógrafos dão-nos conta de que desde muito novo Salazar se definiu como um espírito introspectivo, seduzido pêlos livros, pelas coisas da inteligência e do saber.
O recolhimento, a profunda vida interior, constituem o enquadramento, onde agora essa avidez de conhecer se começa a realizai1; a disciplina e a serena reflexão que se cultivam nessas casas mais lhe acrisolam o espí-