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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 19 1016

As várias correntes filosóficas que histórica e evolutivamente marcaram épocas cronológicas do pensamento europeu, até ao final do século XIX, seguem-se sucessivas e rápidas explosões e consequente desabamento, no viver, no sentir e no pensar.

É esta ainda uma das características da era que vivemos.

É certo que entre nós, então, vivia-se politicamente ainda sob o domínio das ideias do século anterior.

Tanto pior.

Tornava-se necessário substituir essas e, sem se perder no torvelinho das actuais, encontrar a posição de equilíbrio para os vários valores que se chocam.

Simples, de facto, se não pensarmos «que a luz que ilumina a jorros tem por detrás um labirinto de raciocínios».

O homem humilde, quando filósofo, interroga-se também humildemente, afastando-se de todo o abstractismo, untes voltando-se para uma existência concreta do caso português:

O que é a Nação Portuguesa?

Como se deve organizar o Estado Português?

Quais os seus fins?

As respostas a estas questões serão as ideias mestras do seu sistema, do nosso sistema político.

Ora, a nação não se confunde com o conjunto de indivíduos que, em cada momento, a constituem. É, ontològicamente, um ser distinto dos seus componentes, constituída por uma comunidade de tradições, de língua, de costumes, de crenças e de leis, «somatório de realizações morais e materiais das gerações passadas».

Mas a nação tem, na sua base, outras realidades sociais: a família, a freguesia, o município, as corporações morais e económicas.

Só integrado nesses grupos naturais o indivíduo realiza os seus fins de homem.

Logo, o Estado deve exprimir a nação assim organizada, isto é, a forma que representa a sua ordem natural e racional.

Mas o Estado existe para, e realização do bem comum, entendido como categoria distinta da do bem particular ou da soma dos bens particulares de todos os indivíduos.

Daqui deriva a necessária autoridade do Estado, para impedir que os interesses particulares se sobreponham ao interesse geral e para a salvaguarda da paz e da justiça, nas mútuas relações dos indivíduos e dos grupos e nas relações destes com o Estado, temido, porém, como limites a Moral e o Direito.

O bem comum que o Estado prossegue não é apenas o de garantir aos cidadãos o bem-estar material, mas ainda o desenvolvimento dos valores espirituais, no que eles contêm de realização humana.

Por outro lado, voltando à observação da Nação Portuguesa, facilmente se apercebe uma constante de, sua história: a do absoluto domínio dos valores cristãos.

Se «nem todos os portugueses aceitam explicitamente a fé cristã, todos aceitamos uma oferta concepção de vida residualmente cristã que nos define como povos - dizia há pouco o episcopado.

Daqui derivam duas consequências:

O conteúdo ético da moral que deve limitar a acção do Estado é-lhe dado pêlos valores cristãos;

Garantir-se aos indivíduos poderem realizar livremente os seus fins eternos e transcendentes, fins estes que não podem ser prosseguidos pelo Estado, mas só pela Igreja, a quem o Estado deve dar condições para cumprir a sua missão domina.

O Estado, aqui, mais uma vez se põe de acordo com a Nação. E, deste modo, se superaram os obstáculos que as doutrinas filosófico-jurídicas, racionalistas ou empiristas e de raiz agnóstica, encontraram na sua realização prática.

O que deixo dito parece-me ser a súmula, embora de formulação modesta, da génese e da conceitualização do pensamento político de Salazar e as ideias mestras que informaram o «Estado Novo».

No perscrutar, na realidade objectiva e ontológica da Nação, o seu valor e os seus fins, está o seu nacionalismo, um nacionalismo nem exarcebado, nem romântico.

Divulgada a sua mensagem política, enquanto Ministro dos Finanças, com a adesão entusiástica dos contemporâneos, estava descoberto o chefe natural de que, naquela hora, os Portugueses precisavam. Daí, ao chefe de direito, na Presidência do Ministério, foi só um passo.

A partir de então, o que era só pensamento e ideias passa a ter expressão jurídica.

A Constituição Política de 1983, o Acto Colonial, a Carta Orgânica do Império, o Estatuto do Trabalho Nacional, o próprio programa da União Nacional e, finalmente, a Concordata com a Santa Sé, formam um todo, onde Re contém esse pensamento.

Não faço aqui qualquer juízo acerca da política levada a cabo, sob o domínio dessas ideias, no seu aspecto existencial e concreto, nem tão pouco à obra governativa pessoal do seu inspirador.

Deixemos que a história o faça, e ainda é cedo para o fazer.

Não quero terminar sem deixar duas reflexões: uma relativa à visão de conjunto dessa obra; outra referente à personalidade do seu principal responsável.

No transcurso destes quarenta anos assistiu-se a um mero suceder de factos políticos sincréticos, eclodidos pragmaticamente, por virtude de forças de vários sinais, surgidos no decorrer do tempo?

Ou antes estão esses factos indissoluvelmente ligados entre si por eles, que representam uma mesma força criadora, capaz de imprimir ao País uma feição nova, na sua estrutura política, económica e social, que o individualiza, nesta época, no desordenado mundo dos nossos dias, e também perante outras épocas da nossa história?

Suponho que ninguém se recusará a responder afirmativamente, mas tão-só a segunda interrogação.

Então é porque o sistema era válido.

Creio também que ninguém de boa fé pode negar que os Portugueses -a grande maioria, pelo menos, dos portugueses- aderiram sem reservas às ideias o princípios de acção que esse sistema contém e que, só assim, foi possível a longevidade do Regime.

Então, é porque o sistema era válido para a Nação Portuguesa, por um lado, e, por outro, porque as estruturas criadas têm o poder de adaptação suficiente para, sem prejuízo dos princípios e dos valores essenciais, responder às tensões de cada momento.

E nesta época ímpar na vida política do País, que felizmente continuamos a viver, não pode deixar de avultar e de projectar-se em toda a sua dimensão história a personalidade do homem que a idealizou e que até há pouco foi o principal responsável pela sua realização.

Dele se pode dizer, como um dia escreveu, que «a ponderação, o sentido das oportunidades, o equilíbrio, a independência, a firmeza temperada de maleabilidade, o conhecimento dos homens e das suas paixões, o dom de adivinhar a consciência pública e de prever o enca-