1162 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 56
como golpe do fatalismo em cuja crença o destino parece querer trazer preso o bom povo alentejano ...
Debatido na crise agro-pecuária (com abuso da circulação de dinheiro e meios de pagamento puramente artificiais e ilusórios, ou simbólicos os mais das vezes, representados por letras que se descontam e não são pagas no vencimento), com um fraquíssimo nível de industrialização e turismo - o Baixo Alentejo bem merece e precisa que o Governo o ausculte e ampare.
Mas é a altura oportuna para acusar também o próprio alentejano, o capitalista, o grande proprietário, que com a sua falta de espírito empreendedor, de mentalização, de dedicação ao bem público «tem graves culpas no cartório» ... Por que não investem, decididamente, na sua própria terra, em unidades fabris ou para agrícolas, os seus capitais, os homens ricos do Alentejo? Louvam-se as excepções, pois, felizmente, já as há. E, com efeito, ninguém espere que o Governo possa fazer tudo. Nunca foi assim. Não o é aqui, nem na Rússia, nem na América ou no Japão.
Andam o Governo e a Companhia Portuguesa de Electricidade (C. P. E.) empenhados na construção de centrais térmicas e da primeira nuclear para a produção eléctrica. Por que não se encara a sério a hipótese do Baixo Alentejo, onde, de resto, como aludimos já, são tão deficientes a rede e o potencial eléctricos, constituindo estes, como também é sabido, infra-estrutura essencial ao desenvolvimento industriail, a par da água (que já vamos tendo e com possibilidades de maior aproveitamento)?
Por recente despacho do Ministro da Economia, também subscrito pelo Secretário de Estado da Indústria, foi traçado o novo plano petrolífero e petroquímico e que visa, em especial, «a expansão da capacidade de refinação e a instalação de petroquímicas de aromáticos e olesfinas no continente».
Nesse mesmo despacho vemos já contempladas, novamente, outras zonas da metrópole.
Foi por ele também autorizado o exercício da indústria de refinação de petróleos e seus resíduos a uma nova sociedade portuguesa. A futura refinaria será instalada no Sul.
O seu local será oportunamente aprovado pelo Governo e terá de possuir, como é natural, bons acessos ferroviários, rodoviários e marítimos.
Ora, o Baixo Alentejo, o distrito de Beja, tem, além de redes ferro e rodoviárias, também orla marítima (concelho de Odemira), desprezando já a possibilidade de abertura de canais ou o lançamento de oleodutos.
Assim, não deixará de ser razoável que um Deputado do distrito de Beja - tão carecido de industrialização - aqui lembre, a tal propósito, o seu distrito, que, aliás, tem um vizinho já tão brindado com unidades industriais, como é o de Setúbal. Ali, podem crer, ainda não temos problemas de poluição ida atmosfera...
certo que os empreendimentos do valioso Plano de Rega do Alentejo - alguns já em funcionamento - hão-de fomentar a riqueza e um maior desenvolvimento económico-social da região sul-alentejana. Mas está já bem esclarecida a importância decisiva que terá nessa processo de benfeitoria a conveniente comercialização e industrialização dos produtos da terra.
Está também estudado que, entre outros, poderemos contar com a produção, nas várias áreas do regadio, de tomate, arroz, beterraba sacarina, forragens, pimentão, espargos, alcachofras e frutas.
Ora, é certo existirem já no distrito de Beja duas unidades industriais para concentrados de tomate, mas, e mesmo apesar da sua não grande dimensão, não parece aconselhável, no ponto de vista da comercialização, a instalação de mais, por agora.
Assim, haveria toda a justiça e vantagem em que fossem atraídas para o distrito de Beja, quanto antes, unidades industriais de bom porte, relacionadas com a transformação dos restantes mencionados produtos ou outros que se mostrem viáveis.
Consta estar prevista a construção de uma fábrica de descasque de arroz, mas a localizar em Alvalade, que é já distrito de Setúbal.
A beterraba sacarina foi considerada pelos serviços competentes como base económica de alguns regadios. Mas o incremento e apoio dessa cultura muito lucraria com a instalação de fábricas de açúcar, e consta que há já pedidos em tal sentido.
E parecer-nos-ia que a criação de um complexo agro-industrial, ou pólo de atracção, para já, dentro do distrito, relacionado com tais produtos agrários teria manifestas vantagens sobre a dispersão, na medida em que, além do mais, como está bem de ver, conduziria ao aproveitamento de instalações técnicas, comerciais e administrativas comuns a uma maior produtividade do pessoal e técnicos ao serviço, dado o carácter sazonal da laboração da maior parte dessas indústrias, facilitando, ao mesmo tempo, o aproveitamento dos seus subprodutos, por exemplo, através de uma fábrica de rações.
Ora, pela análise cuidada do Plano de Rega do Alentejo (1965) - do qual temos presente uma planta parcelar para consulta de quem o deseje fazer -, verifica-se que a vila de Ferreira do Alentejo é o centro geográfico natural de uma zona com 25 km de raio e cuja área já beneficiada e a beneficiar pelas obras de rega anda por 80 000 ha a 90 000 ha (cerca de metade do total do Plano).
Seria assim razoável pensar-se na instalação de tais indústrias (ou da maior parte, pois a especial natureza de algumas pode aconselhar outro local) nas proximidades da vila de Ferreira do Alentejo, que, aliás, poucos favores tem recebido da Administração Central.
Acontece mesmo que na citada vila já existe uma cooperativa de agricultores, cuja principal secção é o lagar de azeite, bem como, a poucos quilómetros, em Montes Velhos, uma outra, que se tem dedicado, em especial, ao concentrado de tomate. Pois é uma ideia a meditar a possível dinamização dessas cooperativas, no sentido de lhes cometer a industrialização e a comercialização da maior parte dos produtos produzidos e a produzir pelo regadio e mesmo do sequeiro envolvente, podendo vir a ser criadas nelas as secções de secagem de arroz e outros cereais, destilaria polivalente, horto-industriais, estação fruteira, fábrica de rações, fábrica de açúcar de beterraba, central leiteira, etc.
Não desconhecemos que a localização das indústrias há-de obedecer a um avisado critério selectivo.
Reconhecemos, em consciência, que o Governo se está esforçando pelo estudo e realização de um desenvolvimento económico regional mais harmónico e equilibrado, que, inclusivamente, implicará a revisão de estruturas e métodos da própria administração pública em sectores pertinentes.
Também deve recordar-se, como já fizemos, que à actuação do Governo deve juntar-se a colaboração dos interessados de cada região - das populações das empresas, das autarquias e autoridades locais, dos organismos corporativos, como ainda há dias o lembrou o Subsecretário de Estado do Planeamento Económico no colóquio de Vila Real, em Trás-os-Montes.