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2204 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 109

O Sr. Delfino Ribeiro: - Sr. Presidente: Ao subir a esta tribuna em (momento de especial solenidade para aqueles que tom o privilegio de servir na presente legislatura, manifesto a V. Ex.ª, mais por dever que em razão de mera cortesia, quão grata me tem sido esta experiência parlamentar sob a sua elevada e distinta direcção.
Os factos e problemas, as necessidades e preocupações, a que a marcha do tempo vai imprimindo feições variadas e novas tonalidades, demandam cuidada observação e análise com vista a que se trace, através de ajustamentos e correcções, a melhor linha de adaptação para as soluções e fórmulas de acção até então perfilhadas.
Esse permanente fluir das realidades, a que não podem quedar-se indiferentes os processos do Governo e as instituições políticas, nem por vezes os próprios Estados ou nações, surpreende-o e certeiramente o contempla a nossa lei fundamental, ao prever a revisão periódica do seu texto.
Em obediência a tal imperativo, impende agora sobre esta Casa a apreciação das alterações preconizadas pela proposta governamental e pelos projectos de alguns ilustres Deputados.
Sendo elas muitas e de índole vária, deter-me-ei, como ultramarino que a si tem procurado chamar, e vive, quanto às terras de além-mar respeita, nas que a estas se dirigem.
E ainda dentro destas coordenadas, não cuidarei da propriedade ou impropriedade de certos termos utilizados, nem da concepção formei do articulado, nem tão-pouco de eventuais lapsos, que são o juro da falibilidade da palavra como meio de expressão do pensamento humano. De resto, é assunto específico do debate na especialidade.
As modificações em referência reconduzem-se a duas categorias: uma, visando a sistematização normativa do diploma, reúne o que é comum ao todo nacional e isola, em título que assinala, as regras definidoras do estatuto constitucional das províncias ultramarinas; outra, realçando a situação destas parcelas na actual conjuntura política, acentua a descentralização administrativa de que necessitam e vinca a autonomia legislativa de que gozam. Lado a lado, portanto, preceitos que, quando muito, suscitam divergências no seu ordenamento ou arrumo e normas que, pelo seu significado e alcance, talvez se prestem a apoquentações de fundo.
Os valores absolutos e sagrados da comunidade portuguesa, que em todas as circunstâncias, e sejam quais forem os sacrifícios, importa defender, como a sua integridade territorial e unidade, estarão porventura em jogo?
As modificações de base acham-se na verdade impregnadas da seiva necessária e tonificante para que a Nação siga em frente «sem negar a sua identidade, sem comprometer a sua coesão e sem perder de vista os seus interesses e os seus destinos»?
Por recomendação constitucional, deve a organização política e administrativa das províncias ultramarinas ser adequada à situação geográfica e às condições do meio social e tender para a assimilação espiritual das suas populações « desenvolvimento das suas terras, de molde a que fracções diferenciadas deixem de o ser e se insiram no regime geral da administração de outros territórios.
O especial condicionalismo do ultramar exige, efectivamente, que em vários sectores recaia o acento tónico numa autonomia a processar por via de maior desconcentração de funções e da consequente intervenção de entidades locais, não apenas na gestão e execução de assuntos administrativos do seu particular interesse, como também na feitura de lei em matérias não reservadas à competência dos órgãos de soberania.
Este o depoimento dos factos que não pode nem deve ser ignorado ou sequer diminuído pelo legislador que se proponha a defesa e prossecução dos interesses das partes e do conjunto.
Se serviços existem que devam assumir a dignidade de serviços nacionais, outros há - e são talvez a maioria - que muito perderiam em rendimento e eficiência se assim fossem organizados.
Em palavras autorizadas e mais incisivas, diz a Câmara Corporativa:

Trata-se de, com mente fria e ânimo tranquilo, admitir, realisticamente, que há serviços públicos provinciais que devem ser integrados e outros que só «contra a natureza» o poderão ser;

e afirma o Sr. Presidente do Conselho, que governa ensinando:

Mas quanto à Administração - que erro enorme se cometeria se pretendêssemos tratar os territórios do ultramar como simples circunscrições a que se aplicasse um código administrativo uniforme! Que equívoco seria pensar na possibilidade de os governar de Lisboa através de governadores civis! E que lastimável confusão a das suas economias tropicais, com estádios próprios de desenvolvimento e sujeições inevitáveis ao meio e à localização dos territórios, com a economia metropolitana!

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Nem se pretenda, por outro lado, que a descentralização da tarefa legislativa é incompatível com ais aspirações do povo, que, a despeito de etnias, credos e culturas de múltiplas origens, é, pelo seu conceito de vida, necessidades, anseios e fins, um só.
Basta, para tanto, recordar as seguintes palavras de quem, ao longo de uma vida de quarenta anos de entrega total à causa pública, foi o guardião cioso e intransigente dos valores essenciais e eternos de Portugal:

A estrutura constitucional não tem, aliás, nada que ver, como já uma vez notei, com as mais profundas reformas administrativas, no sentido de maiores autonomias e descentralizações, nem com a organização e competência dos poderes tocais, nem com a maior ou menor interferência dos indivíduos na constituição e funcionamento dos órgãos de Administração [...] Só tem que ver com a natureza e solidez dos laços que fazem das várias parcelas o todo nacional.

Ponto é, por conseguinte, que o poder político permaneça, na sua plena pujança, o mesmo para todos os territórios, a nenhum destes sendo concedidas faculdades constituintes.
Necessário é todo um complexo de medidas que levem a autonomia até onde ela possa ir, sem que se caia em excessivos regionalismos.
E tudo isto acontece.
Destarte, em cada. uma das províncias os órgãos que criam a lei, os que da administração se incumbem e os que servem a justiça exprimem unicamente a soberania da Nação, continuando, em vista disso, a integração política a ser respeitada, com a vantagem da participação crescente, e de forma activa e útil, das suas classes mais esclarecidas e ilustradas.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!