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25 DE FEVEREIRO DE 1987 1829

sacramentos da queda do dólar e da baixa do preço dos combustíveis? É bem verdade! Mas é no sector da justiça que mais arriscadamente se joga o futuro desse supremo referencial humano, cívico e político que o cidadão é.
Há sete anos ao leme da justiça, o PSD e os seus ministros não dão o menor sinal de insatisfação em face da rotina. Aparentemente, ainda se não deram conta de que, precisamente no decurso desse septénio, se tornou indisfarçável o mundo novo que aí está, e seguramente aí vem, a envelhecer irremissivelmente a ideia e o sistema de direito que herdámos da colonização romana e que, desde então, temos mantido com o mesmo empenho conservador com que se preserva uma víscera num frasco de álcool!
Entretanto, o nosso Ministério da Justiça dorme! Mal encoberto pela simpatia transbordante do actual Ministro - o que da Justiça mais tempo o foi depois de Abril -, conformado assiste e acha que a melhor política é deixar correr o marfim.
Sr. Ministro já teve a bondade de esclarecer que o seu Ministério não é o «guardião das leis». Se fosse assim, chamar-se-ia, logicamente, o Ministério das Leis. Mas não: é da Justiça que se chama. Mas como «da Justiça» se autogovernam, zelosas da sua independência, as magistraturas e são «irresponsáveis» pelos seus juízos os magistrados?
Tem acaso o Ministério da Justiça algo a ver com a morosidade crescente das decisões judiciais? Acaso é a ele que tempos de responsabilizar por o saldo dos processos entrados, relativamente aos julgados, crescer continuamente? Ou o facto de, ao ritmo a que julgam, os processos pendentes só ao fim de quatro anos terem sido todos julgados, se mais nenhum entrasse?
Ou com o facto de, ao fim de anos, já ninguém relacionar a decisão com o conflito ou a pena com o delito? Ou com a circunstância de, ao fim de anos, a partilha de bens ter perdido o interesse, a falência ter perdido eficácia, a indemnização ter perdido valor ou a reparação da honra já não fazer nenhum sentido?
Ou será ele o culpado de os processos continuarem a ser cosidos a agulha e baraço, como no tempo da Maria Castanha?
Ou de a informatização da justiça continuar a ser uma miragem, quer ao nível dos dados sobre legislação e jurisprudência, quer ao do dia a dia da vida nos nossos tribunais?
A única polícia que depende do Ministério da Justiça - a Judiciária - vai ela também reforçando cada vez mais o seu capital de autonomia!
Da justiça dos registos ou do arquivo de identificação não é pertinente falar. São burocráticos, tabeliões, preto no branco, lidam com dados computorizáveis, ainda que não computorizados. E laboram em tal ritmo de stress que só poderão ser expressão de justiça quando com esta se confunda a confusão!
O sistema prisional e os serviços tutelares de menores não têm nada a ver com a justiça. São mesmo a terra prometida da iniquidade. Pois como? Justo uma cadeia? Apeteceria ser admitido nela! Justo um reformatório? Que restaria do amor de mãe?
Ter-se-á a justiça refugiado nos serviços de combate à droga?
É sabido que não! Existem para fazer o seu número, mas desde que foram criados e tirando alguns relativos êxitos da brigada que na Polícia Judiciária dá caça ao traficante, no mais goza de inteira liberdade o toxicodependente - inclusive a de morrer!
Fica o quê? A justiça da construção e conservação dos tribunais? Foi chão que deu uvas! Desde que os cofres dos tribunais, sob a gestão do PSD, «abriram
falência» e pedem esmola ao Orçamento do Estado, desapossados do orgulho da sua independência, o Ministério da Justiça praticamente deixou de construir, deixou de conservar e os pingos da chuva que entram no pretório, curiosos de saber como nele se julga, são recebidos, não de empreiteiro em riste, mas de balde em punho!...
Conhecidas as concepções do PSD sobre a justiça, que fazem do Ministério da Justiça em espectador, perdida ao fim de sete anos a esperança em que o Ministério mude, ou bem que mudamos de governo ou bem que prescindimos de justiça, pelo menos da que do Ministério deveria vir e não vem! ...
Eça - sempre Eça -, atento aos ministérios do seu tempo, achava que reformavam demais, ainda que só na letra dos decretos. E legou-nos esta visão inquietante: «Todo o Ministério que entra deita reforma e cupé. O Ministro cai - o cupé recolhe à cocheira e a reforma à gaveta.»
Bom observador, mas mau profecia, Eça foi por antecipação injusto para com os ministérios do PSD e, sobretudo, para o actual governo. É mentira que façam reformas! E vão, seguramente, deixar vazias as gavetas!
O seu a seu dono: ao PSD e aos seus ministérios o conservadorismo das concepções e o imobilismo das políticas!
Das mudanças que a contragosto faz, não é sequer o actual governo o verdadeiro «culpado». Pois, se tivesse governado sozinho no tempo do anterior, com o dólar e o preço do petróleo a subirem todos os dias, teria ele baixado a taxa de juros ou feito subir o saldo da balança de transacções correntes? Ninguém hoje poderia «acusá-lo» dessas «perigosas inovações». É sabido que quando presidiu ao executivo em conjuntura idêntica à do anterior governo, elevou o défice da balança até ao zénite dos números e empurrou para cima, tanto quanto pôde, as taxas de inflação e de juros.
Inversamente: podia este governo, com o dólar e o preço do petróleo a baixarem até ao aviltamento, opor-se com êxito à queda das taxas de inflação e de juros e ao saldo positivo da balança? É claro que não podia!
Onde pode, este governo conservador conserva! Conserva o desemprego, conserva a anarquia escolar, conserva doente a saúde, agónicas as empresas, paleolítica a agricultura. Tem acaso política para a indústria? Ninguém o pode acusar disso! Mas regressemos ao nosso tema: tem, porventura, incomodado a rotina no sector da justiça? Seria injusto um tal libelo!
O cidadão perde confiança na justiça? Os poderes de facto penetram nos circuitos de deliberação e decisão? A autoridade do Estado dissolve-se na poliarquização do poder? O crime organizado reforça-se? O crime comum já não consegue cama nas prisões? O suicídio prisional epidemiza-se?
O Instituto de Reinserção Social arrasta-se penosamente (depois de extinto e de novo convalidado) por falta de meios? Os juízes não aplicam as penas alternativas da pena de prisão? Os presos preventivos coabitam com os definitivamente condenados e aprendem o crime com eles? Há prisões que são uma enxovia? A reabilitação pelo trabalho continua a ser uma fraude? O emprego após a saída da prisão continua a ser uma miragem? A tutela de menores produz suicidas e rebeldes? A Polícia Judiciária, ao prender corajosamente os seus corruptos, denuncia o icebergue da própria corrupção? A justiça continua morosa? O Centro de Estu-