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1974 I SÉRIE - NÚMERO 57

Naturalmente, os jornais são para serem muito lidos e pouco processados e nem podemos dizer que foi apenas uma notícia de jornal, pura especulação, porque o que está em causa é a vida das pessoas.
Então, que disse este jornal? Disse que fez uma pequena investigação e que, apesar do inquérito ministerial a que ele também se refere, continua a verificar-se nos Hospitais Civis de Lisboa a utilização de sangue sem análise prévia e os próprios cirurgiões muitas vezes mandam extrair o sangue, injectam-no, fazem as transfusões e dizem «agora seja o que Deus quiser» - frase esta que vem na referida notícia.
«Seja o que Deus quiser»! Só que muitas vezes Deus quer bem e outras vezes, quando se morre, não se sabe se foi por causa da transfusão - o que estou a dizer foi literalmente retirado deste jornal.
Tendo em conta a categoria do jornal, a circulação que tem e as graves acusações que faz, esperei que houvesse um desmentido do seu Ministério, porque isto realmente cria alarme e recebemos até muitos pedidos para que colocássemos esta questão à Sr.ª Ministra.
Portanto, é em função destes pedidos e não digo, por enquanto, do grande alarme, mas pelo menos do desassossego que esta notícia causou em grande parte dos leitores, que venho formular esta pergunta, para que a Sr.ª Ministra nos diga o que há de verdade sobre ela.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Deputado Narana Coissoró: Nos Hospitais Civis de Lisboa, o serviço de imuno-hemoterapia é um serviço centralizado, como, aliás, são alguns outros serviços, dado que se trata de um grupo hospitalar com um determinado tipo de organização daí decorrente.
Na sequência do regulamento actualmente em vigor para os Hospitais Civis de Lisboa, que modifica bastante a estrutura do grupo tal como anteriormente estava concebida, nomeadamente no sentido de uma autonomia maior por parte de cada um dos hospitais, o serviço de imuno-hemoterapia é justamente um daqueles que está e virá a ser atingido na estrutura que tem tido até agora, nomeadamente através da criação de serviços dessa especialidade dos hospitais pertencentes ao grupo.
Aliás, em meu entendimento, também essa descentralização do serviço de imuno-hemoterapia virá melhorar substancialmente a forma como o sangue é utilizado e obtido por parte dos hospitais do grupo. Por exemplo, parte das dificuldades, que reconheço existirem nos Hospitais Civis de Lisboa e que estão referidas nesse jornal, têm a ver com algum sangue vir a ser desperdiçado em virtude de o respectivo prazo de validade se ultrapassar. Justamente o facto de o serviço ser centralizado em relação a todos os hospitais do grupo traz dificuldades acrescidas num domínio como este e o problema está a diminuir substancialmente com a divisão dos serviços de sangue em relação a cada um dos Hospitais Civis de Lisboa.
Em relação à questão concreta que coloca das análises, todos os dados de que disponho vão no sentido de que o sangue fornecido nos Hospitais Civis de Lisboa é sistematicamente analisado e, em particular, em relação aos problemas resultantes da SIDA, porque são aqueles com os quais hoje as pessoas vivem mais razoavelmente alarmadas, e digo razoavelmente no sentido de que é razoável e perfeitamente compreensível que as pessoas se preocupem com o que acontece nesse campo.
Hoje, os Hospitais Civis de Lisboa e o respectivo serviço de imuno-hemoterapia procedem sistematicamente ao despiste dos anticorpos anti-HIV l, o que acontece desde 1985 e na sequência de uma determinação nesse sentido que eu própria fiz, mas procedem também sistematicamente - e este é um ponto importante- ao despiste dos anticorpos anti-HIV 2, desde 1987.
Repito que a informação que tenho é no sentido de que o despiste em relação ao sangue fornecido nos Hospitais Civis de Lisboa é sistematicamente feito. Não posso em caso algum garantir que nunca acontece, aliás tive ocasião de dizer isto largamente, pelo menos das duas vezes em que foram aqui debatidas as questões do sangue, que não possa haver casos em que os técnicos eventualmente procedam de outra maneira.
É evidente que se o fizerem estão a violar regras e estão por esse facto a incorrer em responsabilidade aos mais variados níveis, que num caso desses até podem ser não só disciplinares.
Agora, a informação que tenho dos Hospitais Civis de Lisboa é que sistematicamente se faz uma série de análises e entre elas estas para despiste dos dois vírus conhecidos da SIDA.
Porque levantou a questão dos Hospitais Civis de Lisboa e porque há algumas outras questões que são levantadas, nomeadamente no artigo do jornal a que fez alusão, já agora vou referir-me a outra questão, que também é aí levantada, que me preocupa especialmente, que é o relacionamento entre um serviço de sangue de um hospital do Estado e uma entidade privada que também actua no mesmo domínio.
Justamente no inquérito que foi mandado fazer pela Inspecção-Geral dos Serviços de Saúde, e como também é aí aludido, foram levantados alguns problemas sobre o relacionamento entre o serviço de imuno-hemoterapia dos Hospitais Civis de Lisboa e um determinado laboratório privado.
Tenho tentado seguir o que se passa nesse domínio, porque é absolutamente essencial clarificar as coisas; sei que hoje o recurso a esse laboratório privado, por parte dos Hospitais Civis de Lisboa, é feito em última instância e quando não têm outra alternativa.
Quando foi feito o inquérito da Inspecção-Geral dos Serviços de Saúde, 30% do sangue aplicado nos Hospitais Civis de Lisboa provinha de outra origem, que não do obtido nos próprios hospitais, e este é um grau de dependência preocupante para um grupo hospitalar como esse.
Portanto, também grande parte do esforço que os serviços de cada um dos hospitais do grupo tem de fazer é no sentido da obtenção de mais dadores - e havia na altura cerca de 25 000 dadores no ficheiro habitual dos referidos Hospitais.
Ainda sobre as relações com entidades privadas há dois pontos que quero aproveitar para informar a Assembleia da República. Por um lado, emiti um despacho no sentido de que não haja coincidências pessoais entre os funcionários em serviços de sangue dos hospitais do Estado e a pertença dessas pessoas como empregados a entidades particulares que actuem no mesmo domínio.