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4128 I SÉRIE - NÚMERO 84

contrário, a desintonia da maioria parlamentar em relação ao país - coisa que, no seu entusiasmo abstracto, os Srs. Deputados do PSD, neste momento, terão apenas relativamente conscientizado (e ainda bem!)
9 - Por outro lado, o referendo não substitui o papel dos partidos nas campanhas referendarias como se sublinha no artigo 118.° ao fazer aplicar à sua realização as normas do artigo 116.° Cria-se aos partidos, pelo contrário um novo campo de protagonização, limitado, todavia, pelas normas maioritárias necessárias para accionar referendos e pelo papel decisivo do Presidente da República.
10 - Num quadro maioritário este mecanismo novo não surge apto a funcionar senão limitadamente como uma tribuna propagandística ou como um «contrapoder» de cidadãos organizados, embora possa permitir, propiciar e impulsionar novos terrenos de afrontamento Governo/Oposição e novas formas de relacionamento conflitual entre os titulares de órgãos de soberania. O que será, nesta óptica, o referendo? Talvez a possibilidade conferida ao Presidente da República de «dissolver» uma política sem dissolver um Parlamento, o poder de fazer inflectir uma maioria e um governo sem pôr como exigência a sua substituição no imediato. Nesse sentido, em certas condições de fechamento, o referendo pode contribuir para abrir o sistema ou pressionar a sua abertura.
11 - A experiência do Direito Comparado e a sociologia eleitoral não têm revelado que o referendo seja uma panaceia para resolver crises políticas nem um instrumento mágico capaz de mudar, do dia para a noite, o juízo social sobre questões-chave, como descobriu, por exemplo, o bloco católico conservador, ao ser derrotado em Itália nos referendos sobre o divórcio e o aborto. Por outro lado, não garante, só por si, como a experiência também prova, mobilizações de massas. Alerta para este facto o aumento das abstenções em diversos países, à medida que se vão multiplicando e banalizando as experiências referendarias.
12 - Que consequências poderá ter a introdução deste mecanismo num sistema político como o nosso, fundado na representação proporcional? O referendo é um mecanismo que dá vitórias absolutas e absolutas derrotas. É, tipicamente, segundo os mecanismos decisionais estudados pela teoria dos jogos, um mecanismo de tipo «soma-zero», sem matrizes, puramente bipolarizador, reorganizador de sentidos de voto sem estrita dependência de opções partidárias e coligando, conjunturalmente, oponentes divididos por outras questões...
Há uma substancial diferença entre a máquina plebiscitaria proposta pelo PSD, preparada para dar ao
Governo o poder de impor jogo e ganhá-lo sempre, e este sistema, cheio de freios e contrapesos, em que se alguém vê acrescida a margem de intervenção política é o Presidente da República, que pode buscar no contacto directo com o povo respostas decisivas em matérias litigiosas, se para tal obtiver proposta de uma maioria ou do Governo. Como é óbvio, o sistema funcionará diferentemente consoante a situação do sistema político e partidário e a força política e social dos que pretendam accionar o novo mecanismo...
13 - É, pois, impossível prever como funcionará o novo instituto. E de recordar que em Itália o referendo foi consagrado no pós-guerra, na altura da aprovação da Constituição, só foi regulamentado em 1970 e aplicado, pela primeira vez, em 1974. Em Portugal será necessário esperar 22 anos pela regulamentação? Em todo o caso, a experiência de regulamentação das consultas populares locais constitucionalmente instituídas em 1982, que ainda agora está por fazer, ecoa no nosso espírito quando analisamos o regime agora traçado.

Desta regulamentação dependerá a resposta para muitas e complexas perguntas que o texto constitucional revisto deixou em suspenso...

14 - Alguém dizia que «o referendo é um instrumento imprevisível». Os efeitos que produz num certo quadro não se produzem noutro. Por outro lado, os efeitos produzidos num país não são transponíveis. Aquilo que vai ser concebido e concretizado agora em Portugal é, sem dúvida, uma incógnita.

15 - Pela nossa parte, não vimos razão fundamental para alterar o juízo que tinha conduzido a que, em 1976 e 1982, pelo PCP, juntamente com outros partidos, não fosse aprovada a introdução do instituto. A leitura das actas revela, porém, a activa contribuição que demos para que a sua consagração se fizesse neste e não noutros termos. Pelas razões expostas, o PCP votou, uma a uma, todas as cautelas introduzidas tendentes a evitar perversões plebiscitarias. Resta fazer o voto de que sejam suficientes e vigiar pelo seu estrito cumprimento. Nisso se empenharão, à luz dos mesmos princípios, e com a mesma coerência, os deputados do PCP.

O deputado do PCP, José Magalhães.

Os REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - Afaria Amélia Martins - José Diogo - Ana Marques da Cruz.