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4524 I SÉRIE - NÚMERO 91

Até aqui fiz questão de identificar o mérito desta revisão com um trabalho de grupo. Mas não se me levará a mal se deixar aqui unia partícula de realce sobre o papel especialmente criador e especialmente mediador desempenhado pelo Partido Socialista.
Coube-lhe uma síntese de equilíbrio e sensatez. Por isso não surpreenderá que lhe tenha pertencido a iniciativa ou a formulação da esmagadora maioria das propostas que fizeram vencimento, e não menos que tenha podido desagradar indiscriminadamente à sua esquerda e à sua direita, qual bombo de festa martelado dos dois lados da pele. Mas se esta revisão é de todos, seja-me permitido dizer que ela é fundamentalmente nossa.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Como se viu, como se está a ver!

O Orador: - Tudo estoicamente suportámos por amor à República.
Maior rigidez de posições seria bloqueadora. Menor, um livre-trânsito. No primeiro caso cantariam vitória os imobilistas, no segundo os camartelistas. E vitorioso tinha de ser o País.
Algumas das apreciações mais negativas do resultado conseguido baseiam-se em bem ministrado equívocos. Um deles é o lançamento a débito de uma pretensa redução dos poderes do Presidente da República.
Nada menos exacto. Nem um só dos actuais poderes do Presidente da República lhe é retirado ou restringido. E embora as propostas do seu reforço não tenham em regra feito vencimento, porque a isso opôs o partido maioritário, ainda assim foram reforçados em alguns aspectos significativos.
Passa a competir-lhe a última decisão sobre o referendo.
É maior o número e o peso dos decretos para cuja confirmação, em caso de veto presidencial, se exige votação por maioria qualificada de dois terços. Foi ampliado o prazo de que o Presidente dispõe para a sujeição de um decreto a apreciação preventiva da constitucionalidade.
É constitucionalizada a competência do Presidente para marcar a data das eleições para deputados ao Parlamento Europeu.
E o debate clarificou que a soberania que lhe inerme, e a separação dos poderes de que dispõe, tem implícita a prorrogação da autonomia administrativa e financeira, a regular, como espero vamos regular, em lei ordinária.
Outra falsa ideia reside no facto de se ter reduzido o peso semântico da Constituição, a benefício da clarificação do seu sentido material.
Proclamações de denso conteúdo ideológico, quais «actos de fé» jurados nas exaltações de Abril, têm alimentado uma querela constitucional duplamente inconsequente. Nem os governos de esquerda as interpretaram à letra como regras de direito positivo ou como directivas de acção política, nem os executivos de direita se sentiram por elas embaraçados para a consumação dos seus propósitos reposicionistas.
Não obstante, vêm constituindo um permanente factor de animosidade dialética que não desposa o real.
É o caso da definição de Portugal como República «empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes», ou da República como Estado que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo».
Debalde se negará que esta visão classista e transitória teve justificação histórica, ao ponto de ter sido sufragada pela maioria dos que hoje a renegam. Mas deixou entretanto de ser consensual.
Daí a sua eliminação, que não deve ser entendida como acto de banimento do seu sentido fundamental, mas apenas do seu significado semântico. Para o PS, «assegurar a transição para o socialismo mediante a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa» é enunciar um fim mediante um meio que na Constituição agora permanece como objectivo directo.
Este não é senão aquela mesma democracia, ou seja o socialismo democrático centrado na justiça distributiva que o PS tem por ideário, por objectivo e por programa.
Outro tanto quanto à reforma agrária. Desaparece a imagem de marca, porquanto se deixa de falar nela.
Mas permanecem, no essencial, os instrumentos em que se desdobra. Se é a simbologia que está mitificada para o aplauso ou para a execração, no mais continuando a ter utilidade a sua caracterização instrumental, conserve-se o que faz jeito e elimine-se o que faz barulho.
Assim é que, em termos de política agrícola, e agora para todo o espaço nacional, se mantêm:
A eliminação dos latifúndios, agora como incumbência prioritária do Estado.
A especial protecção de tudo quanto é pequeno e médio.
O especial empenhamento na aproximação efectiva e afectiva entre a terra e quem a trabalha, aqui ganhando relevo a previsão da entrega das terras expropriadas em propriedade e não apenas em posse.
A previsão de que a lei fixará os limites máximos e mínimos das unidades de exploração agrícola.
A garantia do apoio do Estado aos agricultores e trabalhadores agrícolas.
A garantia da participação de uns e outros definição política agrícola.
As pretensas «malfeitorias» introduzidas na Constituição económica animaram também os torneios críticos e desafiaram não menos o fervor dos prosélitos.
No centro do «tornado» estiveram «o princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção e a irreversibilidade das nacionalizações».
Quanto àquele princípio, houve que reconhecer uma de duas coisas: ou bem que se traduz no imperativo de nacionalizar tudo quanto seja principal meio de produção, e nesse caso há que reconhecer que esse dever político se manteve até hoje em sucessivo pecado de inconstitucionalidade por omissão; ou bem que deve ser entendido, não como um poder-dever, mas como uma faculdade de exercício conjugável com o interesse nacional, e veio a ser precisamente esse o sentido consagrado na nova formulação.
Uma operação de pequena cirurgia tornou possível essa recondução da Constituição à realidade.
Consistiu ela numa pequena incisão e esta na eliminação do qualificativo de «principais». Agora, o princípio não é, se alguma vez o foi, o da apropriação impositiva dos principais meios de produção, mas facultativa de todos eles.
Seria tentado a dizer que, com esta modificação, pusemos a Constituição de acordo consigo própria.

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