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26 DE JANEIRO DE 1990

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Desde logo, refiro a acentuada demora de todo e qualquer processo nos tribunais fiscais. Essa demora, para lá de tirar, muitas vezes, significado à prestação financeira recebida (que não é em caso algum actualizada), dificulta a prova testemunhal e enfraquece, portanto, a posição do contribuinte.
Os tribunais fiscais não estão em condições quantitativas, materiais e orgânicas de funcionar correctamente. Os juizes são praticamente os mesmos de há muitos anos a esta parte: as instalações mantêm-se exíguas, sem funcionalidade e ultrapassadas tecnologicamente; mas, sobretudo, a Lei de Processo Fiscal mantém se inalterável. Só há relativamente pouco tempo, sendo certo que o poderia ter feito há seguramente pelo menos dois anos, é que o Governo tomou as primeiras e incipientes medidas para responder às alterações adequadas na lei processual fiscal vigente.
Este é um domínio onde se impõem soluções de fundo que se revelem expeditas, conquanto de racionalidade correcta e, sobretudo, susceptíveis de promover a justiça fiscal. De facto, 10 ou 12 anos depois de ser iniciado um conflito, não pode haver justiça integral. Como disse recentemente um membro do Governo que (aqui cito) "a justiça ou é rápida ou não é justiça"I
Não é só, no entanto, o problema da injustiça para com o cidadão que o sistemático atraso na resolução dos processos fiscais acarreta. Com efeito, esta situação é propiciadora de fonte objectiva de corrupção e acaba, também, por ser, perversamente, incómoda para a administração fiscal, uma vez que pode conduzir o cidadão mais esclarecido à utilização da reclamação como instrumento privilegiado de evasão.
Mais uma vez, são os contribuintes médios (ou seja, a classe média em geral) que têm de suportar o peso do sistema e as suas iniquidades.
Impõe-se, deste modo, uma outra orgânica judicial, a criação de juízos e processos simplificados para pequenas execuções, o julgamento em faltas automático, as tréguas fiscais renovadas, a informatização do sistema judicial, a remissão para a justiça comum de um grande número de processos que hoje se encontram nos tribunais fiscais, a reforma urgente do Código de Processo Fiscal e a criação de uma comissão fiscal que tenha por objecto a resolução dos litígios fiscais existentes à data de entrada em vigor da lei que proceda à sua criação.
A defesa individual do contribuinte impõe, contudo, outras soluções que visem a qualidade e a prevenção do acto tributário. Assim, tem de ser, desde logo, reforçado o direito à informação e consulta total do processo a fim de que o contribuinte possa obter toda a informação que julgue necessária para o esclarecimento da sua situação fiscal.
À administração fiscal deve ser cometido o dever de fundamentar os actos tributários com clareza, suficiência e congruência face à decisão adoptada; impõe-se a definição rigorosa da contagem de prazos relevantes para o processo a fim de eliminar fontes de controvérsia; deve ser assegurado o direito temporário de impugnar actos do passado, durante um período de tempo razoável, com o fundamento da alteração e reforço das garantias dos cidadãos; sobretudo, tem de consagrar-se o dever que ao Estado incumbe do pagamento de juros compensatórios se o imposto tiver sido indevidamente pago ou na parte em que o for.
Dir-se-á que muitos destes direitos estão constitucionalmente consagrados e que, devido ao seu regime espe

cial, são imediatamente aplicáveis. Sabe-se que isto não tem sido suficiente para que os procedimentos e a efectivação das garantias sejam conformes com o texto constitucional, pelo que se torna necessária a aprovação de um diploma legal que consagre, no concreto, esses procedimentos e essas garantias. Mas o quadro legal que assegura os direitos a garantias da defesa dos contribuintes impõe a defesa também institucional do cidadão perante a administração fiscal.
Deste modo, torna-se necessário criar, à semelhança do que sucede em países onde a política fiscal se encontra desenvolvida e articulada socialmente, um órgão de autoridade técnica comprovada face à sua composição que se dedique, de forma sistemática, ao estudo dos problemas fiscais e acompanhe não só a actividade legislativa neste domínio mas, sobretudo, a prática da sua execução por parte da Administração Pública.
Essa lacuna é preenchida no projecto do Partido Socialista com a criação do Conselho Nacional de Fiscalidade.
Mas porque aos cidadãos deve ser assegurado e viabilizado o direito de associação para defesa dos seus interesses enquanto contribuintes, impõe-se, de igual modo, a regulamentação urgente das respectivas associações de defesa, a fim de que as mesmas não sejam olhadas quase como "associações de malfeitores".
Esta matéria consta igualmente do projecto de deliberação apresentado pelo Partido Socialista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa do PS integra um conjunto de soluções e de mecanismos que constituem um todo coerente e harmónico visando o reforço da garantia da defesa individual e a consagração da defesa institucional do cidadão contribuinte, Essas medidas e esses mecanismos encontram-se, de uma maneira geral, testados em sistemas tributários mais evoluídos que o nosso e têm provado a sua eficácia no reforço da racionalidade da política fiscal e da correcção de assimetrias injustificadas de carga dos impostos. Não há razão alguma para que não sejam, de igual modo, consagradas na legislação portuguesa!
Como é do conhecimento da Câmara, o diploma que hoje está em discussão integra um conjunto de três projectos de lei, onde também se inclui um projecto de reforma do IRS e do IRC e um outro diploma de reforma da sisa e do imposto sucessório.
0 objectivo deste pacote fiscal traduz-se claramente nas intenções de desagravar fiscalmente as classes de mais baixos rendimentos, de reduzir a carga fiscal sobre as pequenas poupanças e de criar sistemas transparentes que impossibilitem e dificultem as falsas declarações.
Não compete ao Partido Socialista, nem isso tem sentido, apresentar uma nova reforma fiscal, 0 que tem sentido e fazemos é apresentar soluções visando corrigir insuficiências e preencher lacunas e centrar a nossa iniciativa no reforço e na plena garantia da cidadania fiscal.
São, aliás, vastas as contribuições que o PS já apresentou no domínio da fiscalidade. Cito apenas duas: a criação e a concepção do imposto do valor - acrescentado e, sobretudo, a consagração constitucional de um imposto sobre o rendimento pessoal que vise a diminuição das desigualdades o seja único e progressivo.
Espera-se que, tendo sempre o Partido Socialista assumido as suas responsabilidade, o Governo, por teimosia, arrogância ou incapacidade de diálogo democrático, não se furte a assumir as suas.