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1246 I SÉRIE - NÚMERO 36

há pouco já referi, um novo conselho. Por obra e graça deste ímpeto, proliferam os conselhos e agigantam-se as «freguesias».

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador:-Quanto às associações de defesa dos contribuintes, ninguém questionará que poderão ser um excelente meio de participação, um meio privilegiado de participação das pessoas na defesa dos seus interesses, se eles brotarem espontaneamente na sociedade e não forem preparadas pelo Estado.
Disse François Bloch-Lainé, num estudo sobre o associativismo, publicado no n.º 7 da revista Pouvoirs, que o associativismo só ganhará virtudes, face às instituições convencionais, se as associações forem mais espontâneas do que instituições, e mais flexíveis; de algum modo, mais representativas do pulsar da sociedade. Suplemento do Estado - diria eu -, pois não poderá ser o Estado a fomentá-las. O que terá é que, depois de criadas, de baixo para cima, e não de cima para baixo, as aceitar, respeitar, ouvir e apoiar, quando essas associações sejam dotadas de representatividade e de prestígio anterior. O associativismo não se encomenda, as DECOs não se inventam ao sabor da pena fácil do legislador.
Finalmente, a aposta numa justiça de conciliação, entendida quase que no sentido de uma área de «laicização» da administração da justiça, pelos tais meios informais de administração da justiça - em que eu, aliás, estive sempre em consonância com o Partido Comunista Português-, é uma aposta que vale a pena. Estou à vontade para o dizer, exactamente, porque o disse nesta circunstância e disse-o também aquando da primeira revisão constitucional. Mas só na segunda revisão constitucional, alguns anos depois da primeira, é que veio a prevalecer este ponto de vista, embora ainda um pouco timidamente. Em meu entender, só tem razão de ser uma justiça de conciliação quando as pessoas possam ter um meio ao seu alcance, a par da justiça convencional, para protagonizar a sua própria justiça. Mas - Santo Deus! - a Comissão de Conciliação Fiscal, figurada neste projecto lei, é um paradigma acabado do que não deve ser uma justiça de conciliação, até porque se prefigura composta por juízes de carreira, cuja função e vocação serão as de julgarem litígios por meios não informais.
Aliás, devo dizer, relativamente ao que aqui afirmou o Sr. Deputado Manuel dos Santos, quando referiu -e muito justificadamente - os problemas da justiça, ou seja, a lentidão da administração da justiça, não apenas fiscal - que, curiosamente, é um mal comum a todos os países -, que esta Comissão de Conciliação Fiscal seria a maneira mais fácil e operativa para tornar menos expeditos e mais fáceis os atrasos e a lentidão dos processos. Efectivamente, em relação ao contribuinte, eventualmente mau pagador e relapso, face a uma administração que não quisesse fazer avançar os processos, iria abrir um parêntese de 180 dias, em que o processo, já entregue, seria remetido a esta Comissão de Conciliação Fiscal; depois não se chegaria, tendencialmente, a acordo algum e tudo voltaria à primitiva forma. Evidentemente, aos 180 dias acrescentar-se-iam mais 40 de remessa, mais 40 de reenvio e ainda mais 30, embora não houvesse custas a contar, mas haveria, provavelmente, diligências a fazer, e teríamos assim a administração fiscal, no seu aspecto litigioso, ainda mais descoordenada do que, porventura, já está e, naturalmente, tenderá sempre a estar.
Tudo isto dito - e devo dizer, dito sumariamente, sem conhecer a proposta do Governo e tendo apenas lido o projecto apresentado pelo Partido Socialista-, a conclusão de remate salta à vista: o Partido Socialista, que conta com juristas e economistas - é o caso concreto do Sr. Deputado Manuel dos Santos - altamente qualificados, experientes e dotados de inquestionável souplesse criativa, deu, desta vez, um passo em falso.
Caiu na ratoeira de se arvorar em defensor dos administrados e de atacar a reforma fiscal. Viu-a como ponto de ataque, como alvo, e colocou os contribuintes a «contribuírem» para esse ataque. Isto é, em vez de defender os contribuintes, transformou os contribuintes num municiamento ou numa arma de ataque da reforma fiscal, o que levou a uma certa perversão de posições.
Na verdade, a reforma fiscal terá aspectos bons e outros menos bons. Por exemplo, colide com a minha sensibilidade a anfibologia que há em alguns conceitos nela contidos, mas que serão de tratar em outra sede, certamente, nas reformas que poderão vir a ocorrer em relação aos grandes códigos. Vejo também demasiadas cláusulas vagas, em branco, como é o caso da correcta tributação e da correcta determinação da matéria colectável, que geram alguma infixidez e que devem ser, tanto quanto possível, superadas.
É evidente que isto é natural que aconteça, já que nenhum sistema é perfeito, mas não justificará, por certo, que se construam leis avulsas que em nada ajudarão quem, na realidade, precise de ajuda. Não é por estar outorgada a garantia disto ou daquilo que a pessoa tem, efectivamente, essa garantia. O que é necessário é que se fomentem meios para que a garantia funcione, porque ela já está inscrita na Constituição.
No que pese aos ilustres proponentes desta iniciativa legislativa, a lei agora constituindo seria um peso morto, um nado-morto muito pesado.
Defender os contribuintes, muito bem; protelar melhor os seus direitos, ideia excelente. Mas por outros meios e com outra imaginação - e tenho a certeza de que os Srs. Deputados do Partido Socialista a têm -, desde logo, pelos da Constituição e pelos das leis existentes, que já bastantemente viabilizam essa defesa, sem mais conselhos, comissões, mecanismos, palavras e complicações.
Não duvido dos rectos e bons propósitos que animaram o projecto de lei, embora alguns, como já referi, talvez subliminares, relevem de objectivos de alguma dose de política de circunstância, aliás perfeitamente natural e respeitável. Não duvido, pois, das boas intenções parlamentares do Partido Socialista, só que de boas intenções está o inferno cheio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Deputado Mário Raposo, infelizmente não tenho tempo adequado para, digamos, dialogar com V. Ex.ª como merece e a qualidade das suas intervenções sempre exige.
Portanto, apenas lhe coloco uma questão e faço uma referência.
Começando pela referência, sobre a qual existe consenso, devo dizer que também tenho a sua concepção sobre a forma como devem ser tratadas e regulamentadas, ou definidas, se quiser, as associações de defesa dos