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1258 I SÉRIE - NÚMERO 36

Era, aliás, fatal que tudo isto acontecesse. Logo que houve conhecimento, em 1986, do que o Governo pretendia, os avisos e as críticas de vários quadrantes faziam adivinhar que a teimosia iria redundar em fracasso, fracasso que agora se reconhece pela segunda vez.
E não se venha dizer que tudo isto é natural e normal, que tudo isto resulta - como se diz no preâmbulo da proposta de lei - da rodagem da legislação processual penal e que é normal fazerem-se correcções após a rodagem. E que os vícios da legislação já tinham sido detectados na «linha de montagem» e houve tempo e lugar para proceder aos acertos.
Porém, a teimosia era tanta, contra todos os alertas vindos de vários quadrantes, que até se chegou a acusar de conservadores aqueles que apontavam os malefícios resultantes da entrada em vigor das várias e sucessivas reformas que foram batendo à porta, em jeito de toada agoirenta, de todos os intervenientes na máquina judiciária. Afinal, o preâmbulo desta proposta de lei é a confissão expressa, embora com alguns tons de disfarce, de que não se tratava de conservadorismo mas da voz avisada de quem conhecia bem toda a máquina judiciária e que, por isso, podia antever a dimensão do desastre.
Os bloqueios mantêm-se a todos os níveis, tanto quanto à aplicação do Código de Processo Penal, no qual, por exemplo, se deveria ter clarificado de uma vez por todas a questão da duração máxima da prisão preventiva, como em relação a outras áreas objecto de recentes reformas.
O acesso ao direito foi, de facto, aqui aprovado por unanimidade, mas a sua regulamentação não o foi, pois é da competência do Governo, e na prática não existe um sistema de acesso ao direito.
Na organização judiciária, a vida provou que a reforma foi causa do agravamento da morosidade processual. Os tribunais de círculo instalados demonstraram os vícios do sistema. Vimo-nos confrontados com recursos e conflitos de competência, que atrasaram ainda mais os processos, e cedo se teve de pôr um travão na instalação de novos tribunais.
Foi aqui dito pelo Sr. Secretário de Estado Borges Soeiro, num dos debates, que os tribunais de círculo estariam todos instalados até Setembro do ano passado, mas a verdade é que não se avançou - e bem, porque os tribunais de círculo têm provado mal!...
As custas judiciais continuam a onerar brutalmente os utentes da justiça.
O Código de Processo Penal é fruto das mais diversas interpretações relativamente a algumas das suas disposições.
Há dispositivos do mesmo que nunca funcionaram.
A anunciada aceleração da tramitação processual não se verificou.
O preâmbulo desta proposta de lei fala já na revisão do Código de Processo Penal. E congratulamo-nos com as palavras que o Sr. Ministro aqui proferiu, ao dizer que estaria disposto a vir à comissão parlamentar para debater estas questões de processo penal. Aliás, o PCP tinha proposto à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias isso mesmo.
Isto entronca, também, nesta questão: é que estamos perante um pedido de autorização legislativa, que foi para a Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, em Setembro de 1989. Estamos, agora, a discuti-lo, passados largos meses, por isso, parece-me que não há qualquer razão para que isto não tivesse sido feito através de uma proposta de lei material. Não houve qualquer necessidade desta autorização legislativa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Penso que o diploma futuro tudo teria a ganhar.
Dos princípios enunciados no pedido de autorização, resulta que haverá um retrocesso no processamento das transgressões e contravenções. Regressa-se ao princípio de que um auto de notícia faz fé em juízo, não precisando a acusação de fazer qualquer prova e isto foge ao tão apregoado princípio, que se diz estar no Código de Processo Penal, de reforçar as garantias de defesa.
Tendo havido, recentemente, um agravamento brutal das multas de trânsito, até podemos ser levados a pensar que se procura garantir, por via da diminuição das garantias de defesa em direito adjectivo, o arrecadar de volumosas receitas provenientes das multas, sem cuidar de que se faça, realmente, justiça.
A proposta é ainda omissa quanto ao total processamento das transgressões e contravenções. Sabemos que num dos casos seguirá, em princípio, forma sumária. E nos restantes? Caberá perguntar - como já o fiz e, salvo alguma distracção da minha parte, não houve resposta se irá prever ou não o registo da prova produzida em audiência.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não respondeu! Nós também perguntámos isso ao Governo mas não obtivemos qualquer resposta.

A Oradora: - O registo da prova, produzida em audiência, é a única forma de garantir que o recurso atinja os verdadeiros objectivos.
Enfim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, cumpre concluir que não será, seguramente, esta a melhor forma, nem formal nem substancial, de regular, adequadamente, o processo de transgressões e contravenções, que, de tanto retalhado, deixa entrever em constante e continuada transgressão.
Que multa lhe aplicaremos, Srs. Deputados?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Muito brevemente, porque já aqui foi dito que, neste pedido de autorização, é enumerada uma série de princípios que, em si, não são pecaminosos, nem têm excessiva bondade, mas que são discutíveis, como as regras tendenciais em direito. Só é pena que não tenha vindo o articulado ou será que estará para sair um extenso Código de Contravenções e Transgressões? Sc não, por que não ter feito acompanhar, nem que fosse a posteriori, o pedido de autorização com um anteprojecto, ainda que não oficial, digamos, do articulado?
Daí que a minha bancada vá votar a favor da concessão da autorização, mas fique de reserva para ver o que vem regulamentado no articulado, que vier a ser publicado, porque, também já foi dito, o Governo revela alguma indecisão e alguma instabilidade nas soluções, avança prematuramente com determinadas soluções, depois recua, recupera soluções já ultrapassadas noutros países e isso cria alguma reserva, quanto ao que possa sair em termos de desenvolvimento destes princípios.