1142 I SÉRIE - NÚMERO 34
É com esta humildade, e dizendo que não intervenho neste debate para criticar nem para diminuir o valor que para nós representam estes projectos, que felicito os grupos proponentes pela iniciativa que tomaram e chamo à atenção do Governo de que - como disse o Sr. Deputado Herculano Pombo - se vai fazendo tarde para estarmos a fazer fogos de vista e de oratória no Inverno e lermos verdadeiros e reais fogos que fazem arder as nossas florestas no Verão.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado, muito rapidamente, devido ao tempo que temos disponível, só duas notas às reflexões que fez e às interrogações que colocou.
Existe, efectivamente, variada legislação em relação ao combate dos fogos florestais, alguma dela de inegáveis virtual idades.
A questão que se coloca é que basta aferir os números, ano após ano, dos incêndios e dos prejuízos por que tem passado a floresta portuguesa para verificar que essa legislação não tem tido correspondência na prática, ou seja, numa diminuição das áreas ardidas.
A questão pode colocar-se em dois planos: ou porque o Governo não é capaz, não quer, ou não tem vontade política de pôr em prática a legislação e dólar os vários organismos dos meios técnicos, financeiros e orçamentais indispensáveis a que essa legislação vigore - é um caminho - ou porque essa legislação - para além daquilo que acabei de referir- não tem sido posta em prática e não tem conseguido ler repercussão eficaz nu defesa da Heresia porque não tem por detrás qualquer plano de ordenamento e de prevenção em relação aos fogos florestais. Isto 6, a legislação que tem sido emitida destina-se quase basicamente a combater as consequências e não as causas, a combater os fogos e a reforçar os meios de combate aos incêndios através das CEFFs, mas mesmo essas com meios orçamentais extremamente débeis e limitados, a criar legislação que depois não é suportada por qualquer apoio concreto aos pequenos proprietários que delem a maior parle da floresta portuguesa e que não têm meios para proceder à sua reflorestação. Ou seja, esta legislação dispersa, avulsa, não tem para trás qualquer enquadramento, seja no plano de ordenamento da floresta portuguesa, como existe em todos os países da Europa comunitária, seja no apoio efectivo aos pequenos proprietários.
Um pequeno proprietário que vê a sua pequena floresta ardida não tem sequer meios de acesso ao PAF (Programa de Acção Florestal) devido às restrições e à regulamentação que impede que qualquer proprietário com menos de cinco hectares possa ter acesso ao PAF. Assim, não tendo meios, a única coisa que tem para fazer é entregar a floresta aos primeiros que aparecerem e, normalmente, os primeiros que aparecem ou são celuloses ou são intermediários, que, entretanto, transmutam a floresta para outros interesses que não interessam ao ordenamento, bem como ao futuro e à defesa da floresta portuguesa de uso múltiplo.
Não somos contra a expansão do eucalipto, não somos contra a expansão das diversas espécies florestais, mas pensamos que ela deve ser feita no quadro de um ordenamento florestal que não existe. Quando avançamos aqui com este projecto de divisão do País em termos médios, naquilo a que chamamos os polígnos da defesa florestal - aliás, estamos disponíveis até para a discussão do nome e de algumas formulações -, o que queremos é aproximar a legislação da realidade, isto é, envolver os diversos intervenientes das comunidades, com orçamentos próprios, no processo de ordenamento e prevenção da floresta que não tem sido feito. E não tem sido feito, efectivamente, porque o Governo produziu legislação, mas não dotou o País dos meios intermédios de acção que permitam que ela possa tornar-se eficaz. É este o sentido do nosso projecto.
O que lamentamos é que a proposta de legislação que avançamos da nossa autoria não tenha sido avançada pelo Governo, como é da sua competência. De facto, deveria ser o Governo a trazê-la aqui! Não podemos passar o tempo como temos passado, lamentando-nos no Verão dos fogos florestais, correndo de norte a sul, designadamente, os membros do Governo, a fazer promessas - e temos aqui exemplos dessas promessas, exemplos que recolhemos de recortes dos jornais para um ano depois, quando se aproxima um novo Verão, vermos que o mesmo Governo, ao contrário do que prometera, não fez quaisquer medidas de fundo que permitissem evitar no próximo Verão o novo flagelo dos fogos florestais.
O nosso projecto tem esta virtualidade, aberta a sua discussão, de criar o ordenamento e as medidas de fundo que, efectivamente, levem a que na prática esse combate aos fogos florestais se faça não só ao nível das suas consequências, pelos milhões de contos que ano após ano se gastam no seu combate, mas nas suas causas, evitando que todos os anos se repita aquilo que temos vindo a expor.
É este, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o sentido dos nossos projectos de lei.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Srs. Deputados, serei breve porque não pretendo fazer qualquer pedido de esclarecimento, mas utilizar esta figura para dizer qualquer coisa ao Sr. Deputado Narana Coissoró e saudar a iniciativa do CDS, que, assumindo o desconhecimento desta matéria por parle do Sr. Deputado, traz-nos aqui, pelo menos, uma luz ao fundo do túnel, que é o assumir que esta matéria tem de ser urgentemente debatida e que diplomas como estes dois do Partido Comunista e o nosso passe a imodéstia deverão ser hoje insistentemente debatidos e deverão ser em sede de Comissão «aproveitados» para que esta matéria definitivamente se comece a processar.
Volto a apelar aos Srs. Deputados do Partido Social-Democrata que tenham em consideração aquilo que foi dito agora pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho. De facto, é uma matéria que não pode, pura e simplesmente, ser permanentemente metida na gaveta. Não poderemos continuar como até aqui, desde há 10 anos, a chamar à atenção para as coisas que necessariamente têm de ser feitas, isto é, para o combate aos incêndios para os quais iodos os anos são promovidas novas medidas e nada, absolutamente nada, seja feito!
Ora, estes diplomas poderiam vir a colmatar essa grave lacuna. Poderíamos dar aqui aquilo a que vulgarmente e na gíria se chama o pontapé de saída. Aliás, espero que definitivamente, em sede de Comissão especializada, comecemos todos, mas todos juntos, aqueles que percebemos e os que não percebemos disto, aqueles que temos preocupações nesta matéria e que entendemos que ela é, acima de tudo, um sentimento nacional de uma calamidade que há 10 anos assola o nosso país.