6 DE FEVEREIRO DE 1991 1295
contos a desenvolver - e o projecto de lei não faz qualquer distinção entre as duas hipóteses, como resulta, salvo melhor opinião, da aplicação do artigo 18.º
Em qualquer caso, e pelas razões atrás expostas, o CDS votará favoravelmente, na generalidade, este projecto de lei com a clara menção de que na especialidade teremos de adequar melhor os delitos à moldura das contra-orde-nações, ao que o PSD já se mostrou aberto.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: A Assembleia da República tem vindo a discutir na especialidade um, e aprecia hoje na generalidade outro, de dois potenciais diplomas especialmente actuais e importantes. São eles referentes à protecção de dados pessoais face à informática e à criminalidade informática
Adequado parece, desde logo, ser o animo de consensualização que se pretende assumir perante estes dois temas.
Serão, um e outro, por certo, diplomas que podem acrescentar certeza e segurança, que estabelecem a clarificação normativa e que elaboram uma nova linha material de defesa do cidadão.
Poder-se-á especular sobre a demore no aparecimento ou na produção dos dois textos. Têm surgido mesmo algumas críticas nesse sentido, a meu ver infundadamente. Se áreas existem no âmbito das quais se não deve legislar apressadamente, esta é delas um bom exemplo. Se há iniciativas legislativas que só ganham com um suficientemente longo período de maturação, estas são certamente, também, algumas delas.
E são-no fundamentalmente por três razões: pela fluidez dos conceitos e pela especial dificuldade em plasmá-los no universo normativo; pela novidade das matérias e pela já longa controvérsia sobre as soluções e a sua arrumação sistemática; pelas implicações decorrentes na esfera dos direitos fundamentais em geral e no comércio jurídico em particular.
A primeira questão que de imediato se levantava era a de saber se o local de inserção das normas sobre criminalidade informática se devia situar no conjunto do Código Penal ou em legislação avulsa.
No fundo, adoptar uma das duas linhas possíveis de raciocínio: determinar se os tipos de Código Penal suportavam - através de uma extensão do respectivo objecto - a previsão da denominada criminalidade informática, ou apenas se a mutação tecnológica, com o seu evoluir constante, não implicaria como sua consequência a vantagem de incorporar a matéria em legislação autonomizada de modo a facilitar qualquer tipo de revisão legislativa sem desfigurar necessariamente o Código Penal.
A razão da adopção do segundo dos caminhos possíveis ancora-se em sólidos argumentos: desde logo, pela incapacidade técnica de fazer incorporar nos dois tipos consagrados no Código Penal todas as incriminações indispensáveis nesta matéria; depois, pelo caracter altamente especializado e inovador que torna qualquer iniciativa legislativa necessariamente experimental e sujeita a melhor juízo face aos resultados da sua aplicação.
Neste contexto, particularmente feliz foi o momento escolhido para a elaboração destes documentos. Decorrendo a reforma do Código Penal, veio-se ao encontro da ocasião certa para ouvir os seus interventores com o objectivo de. do ponto de vista científico, se optar pela solução mais correcta. Deixou-se ao Código Penal a consabida vocação de perenidade legislativa e propôs-se a inovação em lei avulsa na base conhecida da sua mais fácil alterabilidade.
Desde o primeiro momento, ainda na pendência de anteriores legislaturas, em que este tema foi tocado, logo foi também dado como adquirido que um seu elemento essencial residiria no grau de consensualização das soluções.
Aliás, logo também foi reconhecido como aconselhável o aperfeiçoamento do normativo constitucional aplicável à utilização da informática, sendo este objectivo cumprido na recente revisto da Lei Fundamental.
E não pode negligenciar-se o contributo que outras iniciativas legislativas de países europeus, aprovadas entretanto ou em discussão, ou que a reflexão sobre a matéria no âmbito da OCDE, do Conselho da Europa ou da Comissão das Comunidades Europeias vieram trazer.
Foram, pois, criadas as condições para a particularmente oportuna e feliz conjugação de esforços entre o Governo (com a proposta sobre a protecção de dados pessoais) e o Grupo Parlamentar do PSD (com este projecto sobre a criminalidade informática), e mais ainda para o excelente trabalho que tem vindo a ser levado a termo na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O produto final, equilibrado e consciente, vai conseguir, em relação às duas vertentes, enriquecer o universo legislativo do País e colocá-lo em posição de primeira linha no conjunto dos países europeus dotados de provisões legislativas neste domínio. Preenche-se um vazio legal, amplia-se a protecção jurídica.
Não se pense, contudo, que o trabalho acabou aqui. Ao colocar-se este marco na evolução do direito penal da informática, pretende-se que as normas jurídicas cumpram a sua missão mais nobre, que reside na sua configuração como técnica de motivação social. Contudo, a experiência vem revelando que não são suficientes a edição de normativos ou a mediação concretizadora dos tribunais. Indispensável será a realização de substanciais investimentos na área da prevenção e da segurança dos sistemas como meio dissuasivo dos comportamentos que se visam punir com a futura lei.
Do mesmo modo que no plano legislativo não são suficientes leis penais, importa desenvolver o processo de interconexão jurídica com as áreas do direito civil e administrativo. Igualmente aconselhável será o incentivo à elaboração de códigos de conduta voluntariamente elaborados e implantados desde togo petos profissionais da informática. Por fim, deverá ser previsto um especial apelo à cooperação internacional, não só pela dinâmica uniformizadora ou integrativa que as ordens jurídicas hoje conhecem, mas também porque o fluxo transfronteiras de dados e os sistemas remotos propiciam uma verdadeira internacionalização da criminalidade informática.
Uma palavra final sobre a questão da protecção de dados pessoais face à informática. Se num Estado moderno a preocupação com a segurança das pessoas e dos bens se deve traduzir numa motivação fundamental, não é menos relevante, por certo, esta outra dimensão da esfera da intimidade dos cidadãos e a preservação eficaz dos seus direitos fundamentais. Por isso mesmo, e segundo a nossa própria apreciação, os temas se interpenetram e cruzam. E, por isso mesmo, seria inadequado proceder a uma abordagem isolada dos dois fenómenos.