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I SÉRIE-NÚMERO 39 1294

questão aqui não é de somenos - tal facto pode acontecer por pressão de uma tecla, por engano ou por negligência. Vem a propósito recordar o facto de haver programas que se podem accionar pela simples pressão de uma tecla.
Questão importante, ainda que diferente, diz respeito ao artigo 15.º, onde os autores do projecto parecem pretender restringir ao máximo -e talvez correctamente, numa lógica de prudência- a punição do acesso ilegítimo, exigindo para tal um dolo específico.
Esta disposição parece ir ao encontro da intenção, expressa na exposição de motivos, de «deixar de fora do âmbito punitivo aquelas condutas que brotam muitas vezes da experimentação profissional anódina ou da criatividade e engenho juvenis que não revistam carácter marcadamente ilícito».
Compreende-se a preocupação e a prudência. Resta saber, no entanto, se nesta matéria não se deveria começar por prevenir a inocência e a inexperiência.
A análise do documento poderia levar-nos ainda mais longe. Só que isto compete à discussão na especialidade. Por isso, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, iremos ficar por aqui.
O importante é que hoje, aqui, estão a ser dados os primeiros passos para prevenir e reprimir uma nova forma de criminalidade, que entre nós se passeia, ainda, impune.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente:-Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate sobre os direitos do homem face à informática já se realizou nesta Câmara e hoje trata-se de debater unicamente os problemas de criminalidade relativa à informática. Por isso mesmo, e desde que disponho só de cinco minutos, apenas alinharei algumas notas, que serão mais bem desenvolvidas no debate na especialidade.
É hoje inegável a necessidade de tutelar interesses economicamente relevantes relacionados com a protecção de bens informáticos. Não é, porém, pacífica a questão de saber, no plano jurídico concreto, qual a melhor forma, atentos os interesses em causa e os princípios de ordem jurídica que regem o nosso Estado de direito, de proteger esses bens e interesses. E, consequentemente, a apreciação concreta desta matéria não pode deixar de ter em conta a realidade e as circunstâncias envolventes a que o labor normativo se dirige.
Ora, apesar de estar hoje em apreciação, como resulta do já exposto e da leitura da exposição de motivos do projecto de lei n.º 632/V, matéria relativa a delitos que afectam interesses exclusivamente de ordem económica, verificamos que o mesmo projecto de lei extravasa em grande parte este mesmo sector económico para entrar claramente na matéria de penalidades próprias dos crimes, embora estes delitos se encontrem num âmbito em constante mutação.
Como aqui já foi dito, há muita hesitação em saber onde acaba o domínio do lícito e começa o do ilícito; onde começa a culpa e onde acaba a negligência ou é caso de dolo. E a este propósito cito uma curta passagem da exposição de motivos já referida: «deve, contudo, ter-se presente a precariedade desta e de outras leis face à evolução da tecnologia».
Ora, se o próprio autor do projecto tem esta humildade de dizer que se está perante uma legislação precária, entendemos que nas matérias de criminalidade e penalização não se devia ir tão longe como se foi neste projecto.
Devem, assim, e atentas estas primeiras considerações, merecer protecção de ordem e dignidade penal os interesses aqui protegidos? A nosso ver, e salvo douta e melhor opinião, julgamos que devemos ser muito cautelosos. O direito penal - económico ou não - é, recordemo-lo, a última ratio do Estado perante os comportamentos que este considera ilícitos. O direito penal protege bens e interesses de ordem pública e só reflexamente e por consequência bens e interesses privados. O direito penal económico, segundo a melhor doutrina, deve ser limitado a um núcleo de bens jurídicos de clara relevância ético-social, cuja perenidade e não sujeição a interesses conjunturais do Estado justifique tutela penal e não meramente contra-ordenacional.
Citarei, com a devida vénia, a este propósito, dois dos mais respeitados penalistas portugueses. Desde logo, o Prof. Dr. Eduardo Correia, que, na sua obra Notas Críticas à Penalização de Actividades Económicas, afirma que «a ideia da adequação envolve em si o pensamento da subsidiariedade do direito penal no domínio económico». Nesta linha, certas sanções penais só deverão ser utilizadas quando outro tipo de sanções for insuficiente ou inexequível. E, mais à frente, este distinto docente da Universidade de Coimbra aponta claramente o caminho que entende ser de perfilhar pelo legislador no domínio económico, quando diz: «também já referimos o caminho aberto para as sanções de mera ordenação social, pelo que a utilização do controlo criminal só será possível, a esta luz, como última ratio e quando proporcionado ao ilícito económico».
Também a este respeito se pronunciou o ilustre Prof. Dr. Oliveira Ascensão, em artigo publicado na Revista da Ordem dos Advogados sobre esta matéria de criminalização informática, quando diz no seu artigo intitulado «A protecção jurídica dos programas de computadores»: «a lei portuguesa tende para a tutela penal dos bens incorpóreos. É uma tendência que contraria as tentativas actuais de limitação do direito penal a um conteúdo ético, podendo perguntar-se se a figura da contra-ordenação não seria mais adequada para este domínio».
Tendo em atenção as doutas opiniões expostas e a própria consideração do que deve ser reservado ao direito penal, é convicção da bancada parlamentar do CDS que neste projecto de lei há uma clara desproporção entre a gravidade dos delitos previstos e a dignidade das sanções que lhes são aplicáveis. Pensamos que, se é inegável a necessidade de protecção legal dos bens e interesses, mesmo privados, que o projecto de lei em debate pretende acautelar, é também claro que é possível, com vantagem, a sua protecção através do ilícito de mera ordenação social.
Por essa razão entendemos ser este projecto de lei desproporcionado e irrazoável, na globalidade, quanto à construção jurídica do Estado de direito em que vivemos e em que nos prezamos de ter uma das Constituições mais avançadas.
Aliás, levantam-se ainda questões de especialidade que, em devido tempo, e na sua sede própria, colocaremos, mas não podemos, no entanto, deixar passar em claro aqui no Plenário a enormidade que consiste na equiparação de um jovem que copia um jogo para o seu microcomputador a um espião industrial que copia a topografia de um produto semicondutor, que levou talvez anos e muitos milhares de