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218 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, as instituições democráticas reforçam-se e prestigiam-se com transparência e responsabilidade. Transparência, na medida em que os cidadãos tenham o direito de conhecer quem os representa, o modo como o faz e as condições em que exerce o seu mandato; responsabilidade, uma vez que a defesa e a salvaguarda do interesse público obrigam a que os titulares de cargos políticos possam assumir inteiramente as consequências dos seus actos, com independência e dignidade, de acordo com a função que exercem e o serviço que praticam.
Vai fazendo, porém, o seu caminho um discurso fácil e demagógico sobre a política e os políticos - a começar na crítica infundada aos órgãos representativos. Subrepticiamente lançam-se suspeitas sobre os titulares de cargos políticos, de forma indiscriminada, generalizando estereótipos negativos. E o certo é que é a República que se está a atingir em nome de efeitos fáceis e de jogos de palavras e ideias. Em todos os tempos houve Calistos Elóis da camiliana Queda de um Anjo, condes de Abranhos ou émulos de Artur Corvelo. E sabemos como a sua veia moralista coexistiu com a mais evidente das incapacidades para servirem, como se lhes exigiria, a Pátria e as instituições.
É tempo de dar uma resposta positiva às generalizações fáceis e às tentativas de capitalização política à custa das naturais imperfeições de uma sociedade aberta e pluralista e das suas instituições. Não há melhor resposta senão a da transparência e da responsabilidade. É tempo de levantar a voz contra campanhas que mais não visam do que obter efeitos fáceis e imediatos, ainda que com sacrifício e desgaste das instituições da democracia.
É a democracia que está em causa quando, levianamente, para atrair atenções, se elege como bodes expiatórios em relação a males múltiplos e inominados os representantes legitimamente eleitos e os seus supostos privilégios. Num gesto de aparente popularidade, o que se pode estar a atingir é, porém, o cerne da cidadania.
E se é certo que não podemos esquecer que as sociedades contemporâneas necessitam, cada vez mais, de aperfeiçoar os seus mecanismos de democracia representativa, completando-os com mais participação, abrindo-os aos cidadãos sem uma lógica partidária estreita, ligando mais representantes e representados, a verdade é que só será possível enveredarmos sinceramente por essa via se recusarmos as propostas de efeito vistoso, os passes de prestidigitação e se tivermos a coragem de procurar encontrar soluções de facto responsabilizadoras.
Não é aceitável o método das duas faces, dos dois discursos, das duas atitudes - uma aqui no Parlamento e outra lá fora, na rua.

Aplausos do PS.

Lançar suspeitas sobre os titulares de cargos políticos, querer ver a vida das instituições democráticas pelo lado das suas naturais imperfeições, procurar pregar moralismo, que se toma hipócrita rapidamente, sobre o dia-a-dia das instituições, tudo isso sabe-se onde começa mas não se sabe onde pode acabar, na ânsia cega da arenga às massas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que a coragem está não só em reconhecer os nossos erros, mas, também, em recusar a tentação das generalizações primárias, generalizações tanto mais nefastas e incompreensíveis quanto é certo que são feitas por quem usa novas máscaras que procuram fazer esquecer práticas próprias anteriores.
O Estado de direito não é compatível com o vago lançamento de suspeitas ou com a tentativa de impor modelos rígidos de conduta à vida democrática. A sociedade aberta é incompatível com o paradigma de uma virtude imposta unilateralmente. A dignidade das pessoas obriga a que a ética em política se baseie na responsabilidade e no compromisso e não em qualquer lógica transpersonalista nem em novos determinismos.
Um dos temas que tem merecido atenções nos últimos tempos é o das declarações de rendimentos e património dos titulares de cargos políticos, o da publicidade das declarações de impostos sobre o rendimento e, conexamente, a informação sobre interesses e benefícios que possam influenciar o exercício de mandatos políticos.
O Partido Socialista apresentou oportunamente iniciativas legislativas em todos esses domínios, quer permitindo o livre acesso às declarações apresentadas pelos titulares de cargos políticos no Tribunal Constitucional, nos termos da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, quer propondo a criação de um registo de interesses dos Deputados, quer ainda regulando a publicidade das declarações do IRS respeitantes aos mesmos titulares de cargos políticos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Partimos da constatação de que a Lei n.º 4/83 revelou, ao longo da sua vigência, inúmeros defeitos, quer substantivos quer processuais, que todos reconhecem e que importa ultrapassar, levando em consideração, naturalmente, a experiência obtida. Foi tal verificação que nos levou a apresentar as alterações ou complementos referidos. Por sua vez, na Comissão Eventual de Reforma do Parlamento, propusemos a constituição de um grupo de trabalho para elaboração de um novo texto sobre o tema.
Nessa linha de pensamento, procedemos à nossa própria reflexão e elaborámos um contributo próprio que pretendemos possa servir de base ao trabalho da Comissão quanto a este tema, da maior importância e actualidade. Trata-se de procurar aperfeiçoar o sistema no sentido da transparência e da responsabilidade - com a determinação própria de quem defende que só o jogo da verdade é que deve ser praticado. Procuramos ir ao encontro de críticas que têm sido formuladas, de falhas detectadas, com a ideia de tornar claro e transparente o que não pode deixar de o ser - a situação económica do titular de cargo político e os interesses a que está ligado. Não reduzimos, porém, o âmbito da iniciativa aos Deputados no que toca à informação sobre interesses, uma vez que, a nosso ver, se exige um tratamento coerente e de conjunto sobre não só os rendimentos e o património mas também sobre a revelação dos interesses a que os políticos estão ligados.
Pretendemos, assim, que se dê sentido útil às declarações sobre o património e os rendimentos e às declarações de interesses, devendo estas últimas estar sujeitas a actualização periódica, clarificando ainda as condições de livre acesso dos cidadãos aos elementos constantes das referidas declarações. Não se trata de estabelecer ou de manter um mero formalismo nem de montar uma devassa à vida privada dos titulares de cargos políticos e seus familiares mas, sim, de procurar salvaguardar a indepen-