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10 DE FEVEREIRO DE 1993 1357

Sr. Deputado Nogueira de Brito, para responder a sua pergunta, temos de abordar a questão de fundo. O que o PCP pretende, efectivamente, é que o prazo seja prorrogado, de modo que mais cidadãos imigrantes possam regularizar a sua situação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E parece-nos que, neste momento, a melhor forma de o conseguir é através de uma intervenção legislativa célere, como a que propomos.
Agora, o Sr. Deputado poderá dizer que isso não resolve tudo, com o que concordamos. Com efeito, se não for alterada a postura da administração neste processo, correr-se-á o risco de a prorrogação não ser os resultados que pretendíamos. Mas lemos esperança de que, se a prorrogação for concretizada, o Governo alteie a postura que tem assumido até aqui e evidencie um comportamento sério e correcto em relação aos imigrantes que permita, alterando a situação, a regularização de muitos deles.
O Sr. Deputado João Matos colocou um problema de limites ao crédito, dizendo que não conhece limitações no acesso ao crédito à habitação por parte dos imigrantes. É natural que V. Ex.ª não conheça, porque não é imigrante em Portugal, não tendo nunca passado por essa situação. Mas nós sabemos de casos de discriminação no acesso ao crédito que importava, do ponto de vista legislativo, clarificar. Se o Sr. Deputado não quer efectivamente que sejam praticadas discriminações no acesso ao crédito à habitação para os cidadãos imigrantes, só tem uma coisa a fazer aprovar o aditamento que o PCP faz ao projecto de lei do PS, resolvendo esse problema de uma vez por todas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: São mais de 100 000. Ao certo, desconhece-se o seu número. Vieram de longe, de muito longe. De Cabo Verde, de Angola, da Guiné-Bissau, de Moçambique, de São Tomé e Príncipe. Mais recentemente, do Brasil. Começaram a chegar, na década de 70, das então ainda colónias portugueses. Traziam as mãos vazias. Fugiam da fome, da seca, da guerra. No olhar o sofrimento, mas também a esperança de um futuro melhor.
Eles são os imigrantes clandestinos.
Durante anos ergueram as pontes que outros cruzaram. Durante anos construíram as casas que outros habitam. Durante anos fizeram as estradas, que outros em carros velozes percorrem. Durante anos edificaram as escolas que outros frequentam.
Eles são os imigrantes clandestinos.
Vieram de outras latitudes, em busca de apoio. Laços históricos e culturais uniam-nos. A língua era o património comum.
Eles são os imigrantes clandestinos.
A maioria não tem instrução formal nem formação profissional. Contratados por autênticos negreiros, eles trabalham nas mais duras condições. Pagos ao dia, muitos deles tem horários violentos, são sujeitos a salários miseráveis, sem condições de segurança, sem qualquer tipo de protecção legal ou social Sem ferias, sem subsídios de Natal...
Eles são os imigrantes clandestinos. Os que trabalham sem direitos, os que vivem nos estaleiros das obras ou segregados em ghettos nas periferias. Marginalizados, em bairros de barcaças.
As suas mulheres e os seus filhos, embora mais vulneráveis pelas precárias condições em que vivem e pelo clima que lhes é hostil, não têm qualquer tipo de assistência médica nem são abrangidos pelos cuidados básicos de saúde. Estão totalmente abandonados.
Na escola, as suas crianças, mal dominando a língua portuguesa, têm dificuldades de integração e estão condenadas ao insucesso escolar.
Eles são os imigrantes clandestinos e este é o universo em que se movem.
Em Outubro de 1992 um processo extraordinário de legalização da sua condição de clandestinos foi decretado. Reconhecia-se no diploma que a manutenção de situações de ilegalidade dos imigrantes era ofensiva para Portugal.
Afirmava-se ter consequências fragilizadoras perante o desenvolvimento das relações de trabalho. Dizia-se ainda que, pela magnitude do problema, este devia ter uma resposta excepcional.
Eram pois, a necessidade de prevenir a marginalidade e a preocupação eminentemente social de integração na sociedade portuguesa dos imigrantes que pareciam nortear esta decisão. Reconhecendo-se também explicitamente que, por razoes históricas, o tratamento aos cidadãos originários de países de língua oficial portuguesa era admissível.
O processo iniciou-se e, à partida, muitas foram as reservas colocadas- O prazo era exíguo; múltiplas situações escapavam ao previsto na lei (nomeadamente as uniões de facto e a questão dos órfãos); dificuldades na obtenção de documentos por pane dos trabalhadores eram previsíveis; a questão da escassez de postos de recepção era colocada; os horários eram insuficientes; barreiras burocráticas adivinhavam-se e a ausência de uma grande campanha de informação, geradora de esclarecimento e confiança, era apontada como preocupação. A própria intervenção dos agentes interessados nas várias etapas, em particular das associações, era omitida.
Quatro meses passaram. O prazo vai terminar. E o balanço unanimemente feito pelas igrejas, autarquias, associações e sindicatos é de que ele carece de ser prolongado.
A falta de informação e o peso burocrático estão longe de ter assegurado o mínimo sucesso deste processo.
Mau grado a necessidade de ter assegurado um bom clima de confiança entre as comunidades a abranger, o medo e a desconfiança instalaram-se.
Na origem, a falta de informação, as rusgas dirigidas, as notificações e o diploma, em 22 de Outubro aprovado em Conselho de Ministros, que altera o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional, diploma que, a pretexto dos compromissos europeus, é já o desvendar dos Acordos de Schengen, com o odioso que lhe está associado.
A violação da privacidade dos cidadãos, o poder discricionário das polícias, a criação escandalosa de autênticos "campos de concentração", que os centros de acolhimento temporário previstos na lei escondem.
Sem duvida, um diploma que veio, pela coincidência no tempo, dificultar o processo em curso, ao deixar antever expulsões em massa de estrangeiros de Portugal.
A intolerância e a exclusão feitas regra, como os inqualificáveis incidentes com cidadãos brasileiros, nas últimas semanas, no Aeroporto de Lisboa, têm escandalosamente testemunhado.

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