O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1876 I SÉRIE-NÚMERO 55

concretizar-se. Falo da provável construção de um depósito de material de alta radioactividade, em território espanhol, junto da fronteira portuguesa (conhecido por cemitério nuclear de Aldeadavilla de la Ribera).
Não é um assunto novo, pois em 1987 e na sequência de vários estudos levados a cabo pela empresa Enresa, a população, previsivelmente mais afectada, manifestou a sua total discordância na concretização do referido cemitério nuclear, o que levou o governo espanhol a indiciar o abandono do projecto, colocando a sua atenção em estudos geológicos perto de Toledo.
Tudo levava a crer que a argumentação e os receios apresentados na altura tinham surtido efeito, mas fora abandonado, apesar do projecto IPES (assim denominado) ter sido apresentado à Comissão das Comunidades Europeias, em 29 de Setembro de 1986, e de lhe ter sido concedido apoio financeiro.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, puro engano!
À comunicação social em Espanha recomeça, no final do passado ano, a divulgar a continuação dos estudos abandonados na zona da fronteira. A população fronteiriça a Portugal, das províncias de Zamora e Salamanca, consideradas das mais empobrecidas de Espanha - e esta é uma população habituada a um provérbio popular que diz «a cão magro tudo é pulgas» -, voltou ao estado de alerta para saber do que se tratava. O alcaide de Fermoselle pede explicações, e a resposta, oriunda do Ministério da Indústria, Comércio e Turismo de Espanha, foi clara e não se fez esperar «Em relação aos trabalhos de investigação geológica que está realizando a empresa nacional Adaro nas províncias de Salamanca e Zamora, manifesto-lhe que a estratégia e principais actuações a realizar para o armazenamento definitivo dos resíduos de alta actividade e larga vida, tal como está especificado no III Plano Geral de Resíduos, se mantém na linha do indicado nos anteriores Planos Gerais de Resíduos Radioactivos; quer dizer, depois do período de armazenamento intermédio do combustível ou dos resíduos de alta e prévio transporte, bem como o encapsulamento dos mesmos, proceder-se-á à sua evacuação ou armazenamento definitivo numa formação geológica profunda.»
Finalmente «o coelho saía da cartola», o que equivale a dizer que voltámos à estaca zero, ou seja, a possibilidade de armazenar os resíduos nucleares, provenientes de Espanha e possivelmente do resto da Europa, a 7 km de Portugal voltou a ser uma realidade.
É o compartilhar da preocupação desta realidade que hoje transmito a VV. Ex.ªs
Portugal optou, no seu Plano Energético Nacional, pela não utilização de energia proveniente da indústria nuclear. Sabendo, como se sabe, que a produção de energia oriunda de material radioactivo é bastante mais económica, o nosso país, mesmo assim, não optou por esta decisão, pois está ciente de que o benefício da economia não se pode, de forma alguma, sobrepor à qualidade de vida. Os eventuais riscos de uma tragédia nuclear são de tal forma elevados que sustentam, de sobremaneira, esta atitude do Governo Português.
Mas, ironia do destino, poderemos estar sujeitos, ao não usufruir dos benefícios puramente económicos desta solução, a ter de assumir todas as suas consequências. Ou seja, estamos em presença de uma segunda «Talidomida»; a mãe
quando a tomava era aliviada do seu sofrimento; ao filho, eram destinadas todas as contra-indicações, como as malformações por nós conhecidas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto IPES (instalação Piloto Experimental Subterrânea), como o próprio nome indica, é um risco incomensurável, pois, sendo uma instalação piloto experimental, tudo fica em aberto em termos comprovativos futuros. E estamos a falar de elementos cuja vida radioactiva média se prolonga por dezenas e mesmo centenas de milhares de anos, ultrapassando qualquer medida do tempo histórico humano. A título exemplificativo calcula-se que a radioactividade do plutónio 239 seja aproximadamente de 24 000 anos e não nos podemos esquecer de que a sua libertação para o meio ambiente tem efeitos cumulativos.
Quem, em boa verdade, nos pode garantir que um cemitério experimental deste tipo vai manter todas as suas condições técnicas e estanquicidade durante dezenas de milhares de anos?
Uma das razões apresentadas pela empresa Enresa na sua candidatura, que justificariam a implementação do projecto junto à fronteira portuguesa, para além da formação geológica ser de natureza granítica (o que acontece em bastantes locais da denominada «meseta ibérica»), apontava que na zona existe muito baixo nível de actividade tectónica e sísmica e com características geotécnicas muito boas. Chamo a vossa atenção para o facto de, nos últimos anos, a região ter sido afectada com dois sismos de considerável intensidade. E no caso de existência de alguma fuga de radioactividade, o seu resultado negativo revelar-se-á quando as águas subterrâneas e mais tarde as ressurgências superficiais vierem a manifestar teores anormais de radioactividade. É certo que para a Espanha as consequências seriam mínimas, pois quando essas águas radioactivas chegassem à superfície iriam ser colectadas pela bacia do Douro e evacuadas para o mar, através de Portugal.
Sabendo que é delicado e falível avaliar intenções, pode dizer-se que poucos locais, como Aldeadavilla, reúnem condições tão favoráveis para a Espanha tentar a instalação piloto. Se resultar, a Espanha terá resolvido o seu, até agora insolúvel, problema de depósito definitivo dos resíduos das centrais nucleares, mas, se não resultar, os prejuízos, que serão gravíssimos, seriam apenas para Portugal.
Uma das consequências poderá ser um envenenamento nuclear, fortíssimo, do percurso português do rio Douro, durante tempo indefinido. Não se vê como actuar em caso de acidente, senão evacuando populações e paralisando os abastecimentos de água influenciados pelo Douro. As dimensões da catástrofe possível desafiam a imaginação mais pessimista. É esta a opinião do Prof. Domingos Moura do Instituto Superior Técnico. Recorde-se, por exemplo, que o rio Douro serve, só em termos de abastecimento de água, mais de 1 milhão de pessoas na região do norte e que muitos outros distritos, como o de Vila Real, da Guarda, de Viseu e de Aveiro, para além dos municípios de Mogadouro, Miranda do Douro, Freixo de Espada à Cinta, Torre de Moncorvo e Carrazeda de Ansiães, no distrito de Bragança, o fazem e que o Grande Porto abastece a quase totalidade dos seus munícipes do referenciado rio.
Outra das consequências negativas, partindo da hipótese de que nunca se verificariam acidentes, seria o do agrava-