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30 DE ABRIL DE 1993 2039

No fundo, o que o institucional não consente que se improvise ou compre é a cultura cívica de referência e a biografia. E daí a insuperável debilidade institucional e democrática deste governo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Passou-se, em Portugal, nos últimos dias, uma grave demonstração de falta de seriedade e de consistência institucional e democrática.
Há quarenta dias, o Primeiro-Ministro, nesta Assembleia, proclamava, não só com alteração de voz que o País escutou, que Portugal não é um país de corruptos, mas também e mesmo assim que o animava, cito, «a profunda vontade política de encontrar, com todos os representantes legítimos dos Portugueses, as memores formas, os meios mais eficazes e os instrumentos mais adequados» para intensificar o combate à corrupção. Confrontado com a realidade do seu terceiro Ministro da Justiça não ter encontrado justificação para, de Dezembro para cá, abordar tal matéria com a comissão parlamentar competente, o Primeiro-Ministro limitou-se a exarar para a acta que a acusação era injusta. Não discuto o sentido do justo com um homem como Cavaco Silva, mas a acusação é verdadeira e o tempo trouxe-lhe um agravamento intolerável.
É que não obstante as promessas que constam do Diário, não houve até agora qualquer novo passo de cooperação institucional com os representantes legítimos dos Portugueses. E a proposta de autorização legislativa, em matéria tão nevrálgica como o combate à corrupção, apesar das insistências do PS, jaz inerte, votada na generalidade, à espera que o Governo apronte o diploma que em Setembro já dizia estar a preparar. É tempo demais em matéria como esta para quem se reclame de capacidade de decisão!
E, Srs. Deputados, foi neste contexto de inércia, de indecisão e de morosidade que se enxertou, ontem, um acontecimento inaceitável. Ao fim desta «quaresma política», em vez de optar pela via do arrependimento e vir ter com os representantes legítimos do povo, como prometera, o Primeiro-Ministro recorre ao que há de menos sério no arsenal da imaginação institucional. Convoca o Procurador-Geral da República e o Ministro da Justiça, manda chamar os directores-gerais e, Srs. Deputados, faz uma encenação: que o Governo vai combater a corrupção, que vai haver um departamento policial reforçado, que hoje o Conselho de Ministros vai aprovar legislação, que afinal para combater a corrupção é preciso não esquecer aquilo em que há anos vínhamos insistindo: controlo das contas dos partidos, registo dos interesses e acesso às declarações do património, dos rendimentos e interesses dos políticos, regime de incompatibilidades, etc., etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria ingénua, aqui, uma postura bíblica que nos levasse apenas a saudar os operários da undécima hora, relapsos até há pouco na resistência às reformas indispensáveis e à própria temática. A verdade é que também na Bíblia se aprende que há um tempo próprio para cada coisa. O tempo de que este Governo dispunha para ser credível, o tempo em que este Governo podia usar um crédito de confiança para avançar no combate à corrupção está esgotado.

Aplausos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro ajudou a pôr-lhe termo quando, aqui, veio pontificar sobre a corrupção em Portugal, num dos últimos dias de actividade parlamentar de que o País teve notícia. O País já não acreditou. Os agentes económicos e sociais, personalidades políticas sérias, do passado e do presente, do PSD sabem que a corrupção está aí, preocupante, e não acreditam, não confiam nem no que o Primeiro-Ministro veio aqui dizer, nem nas suas encenações de última hora.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O País perdeu a confiança em quem governa. Quando o Governo comanda ou assiste, impávido, ao bombeamento sigiloso de uma indemnização de 10 milhões de contos, não fixada por qualquer tribunal, para a bolsa de um cidadão, e recusa as indemnizações aos contaminados pelo vírus da SIDA, por sangue fornecido pelo Serviço Nacional de Saúde, salvo decisão judicial, está intoleravelmente posto em causa o princípio da igual consideração e respeito devido a cada cidadão.
A primeira condição de um combate empenhado à corrupção, drama maior que mina a confiança dos cidadãos, é a seriedade política. A primeira condição da seriedade política, em democracia, é a seriedade institucional, é o sentido da cooperação institucional, é, em última análise, o recurso em que este governo é mais deploravelmente pobre: o sentido institucional.
Medindo as palavras, é preciso dizer que à dimensão da tensão e do conflito institucional contra as chamadas «forças de bloqueio», que a direcção do PSD vinha erigindo em rotina e a que já nos habituara, se acrescenta agora uma nova vertente, a que resulta da demonstração de falta de requisitos fundamentais de seriedade e de confiança institucionais para conduzir um combate de fundo contra a degenerescência das instituições, pela vitalidade da democracia e pela credibilidade da acção política.
A hora exige o restabelecimento de confiança. São precisos novos homens que sejam pelo acesso do público às declarações do património de rendimentos e interesses dos políticos e não contra esse acesso. Homens que não tenham a tentação de conceber o diálogo institucional como conversa fiada. Homens que tenham mais tempo para dialogar e procurar as melhores soluções no combate contra a corrupção. Homens que, quando há amnistias para decretar, ou para não decretar, manifestem claramente a sua opinião sobre a matéria. Homens que não tenham da política criminal a postura cultural de quem mandou construir o Centro Cultural de Belém: a de que, sendo obra vistosa a revisão de um código penal, é bom que primeiro se faça e vejamos depois para que vai realmente servir!
Homens que dos trabalhos da reforma eleitoral não tenham um entendimento tão estreito que a reduza a uma peregrinação que começa e acaba à volta do voto dos não residentes. Homens que, ao lidar ou ao deixar lidar com os dinheiros públicos dêem à sociedade motivo sério para pensar que o que tem a haver, ou não, 10 milhões de contos não receberá da parte do Estado tratamento, respeito e consideração diferentes daquele que tem a haver 10 mil contos ou 10 mil escudos.
O País já não tem confiança moral e institucional nos que governam. Por isso, há que proclamar, aqui, que este Governo, quaisquer que sejam as encenações de que lance