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30 DE JUNHO DE 1993 2855

questão essencial, tão grave quanto o próprio sub-financiamento do sistema de saúde, que é a partidarização progressiva do aparelho de Estado e dos serviços públicos.
Isto demonstra-se no dia a dia. Por exemplo, todos tomámos conhecimento, recentemente, de que a Administração Regional de Saúde de Lisboa está a substituir, nos últimos dias e por razões inexplicáveis, directores de centros de saúde que, de uma forma ou de outra, vêm discordando do modo como são geridos os seus serviços.
Mas como se isto não bastasse, há outros exemplos. Há o exemplo remoto do Hospital de Braga, onde o director convocou funcionários para uma reunião partidária na sede do PSD e, mais recentemente, na semana passada - o que considero escandaloso-, houve, a participação, a título oficial, do vogal médico da ARS de Santarém numa conferência de imprensa, promovida pelo PSD, com a presença de candidatos a uma câmara e a uma junta de freguesia, em que este membro directivo da ARS prestou declarações, tendo ilucidado a forma como seria gerida a ARS.
Portanto, esta promiscuidade política vem, quanto a nós, dar capa àquilo que se passa no sistema de saúde, que é a ruptura por sub-financiamento.
O que lhe quero perguntar, Sr. Deputado, é se também concorda que esta partidarização tem o objectivo de dar cobertura à ruptura que existe no Serviço Nacional de Saúde e, desta forma, escondê-la.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eurico Figueiredo, permita-me, antes de mais, que comece por cumprimentá-lo como, inquestionavelmente, uma das pessoas do PS que se pronuncia com mais autoridade sobre as matérias de saúde, para além da autoridade que lhe assiste como - professor eminente que é.
Quero, pois, começar por reconhecer que, contrariamente ao discurso que, ao longo de muitos anos, foi feito no seu partido sobre política de saúde, o Sr. Deputado é talvez das pessoas mais abertas, com mais autoridade e competência que se tem pronunciado publicamente sobre esta matéria. Digo-o como um cumprimento sincero para balizar a perguntar que lhe vou fazer.
Ouvi a sua intervenção mas há um ponto fundamental em que estou em desacordo com o Sr. Deputado, que é o enfoque em que colocamos o problema que se vive em Portugal no sistema de saúde.
Como sabe, tivemos durante 40 anos um sistema de saúde que não teve praticamente alterações, não só de funcionamento como de tipo de cuidados que prestava e, sobretudo, de unidades físicas que estavam à disposição dos cidadãos, com excepção de dois grandes hospitais centrais, em Lisboa e no Porto, respectivamente Santa Maria e S. João, onde praticamente não se mexeu em nada.
Portugal sofreu, ao longo dos últimos anos, uma alteração estrutural no sistema de saúde. E de que resulta essa alteração estrutural? Resulta essencialmente de um aumento muito substancial do parque hospitalar, ao nível dos centros de saúde e das grandes unidades hospitalares - as que estão feitas, as que estão em curso e as que estão a ser feitas já ao abrigo do próximo PDR (Plano de Desenvolvimento Regional), praticamente até ao final deste século. O problema fundamental que o sistema de saúde tem, em Portugal - e aqui se situa a diferença de enfoque entre o vosso partido e o nosso-, é o encontrar um consenso, como referiu, quanto ao Serviço Nacional de Saúde.
Os senhores colocam o enfoque na questão das nomeações, dizendo que são feitas na base da confiança político-partidária, e eu digo que não é rigorosamente assim, que são nomeações de confiança governamental, o que é ligeiramente diferente, e faz sentido que sejam.
Sr. Deputado, temos um Orçamento do Estado em que 80 % é gasto com a defesa, a educação, a saúde e a segurança social, sendo o resto absorvido pelos outros ministérios. Em gastos desta natureza, não é possível que o Governo não tenha - e não é o partido, Sr. Deputado! - o comando sobre as cúpulas e as administrações dos hospitais. Confundir isto com controlo político-partidário é um exagero, digamos que é uma concessão que se faz à demagogia, não podendo ser considerado um argumento sério.

Protestos do Deputado do PCP, Luís Peixoto.

Vamos discutir as questões com seriedade, Sr. Deputado.
Portugal melhorou profundamente a prestação dos seus cuidados de saúde mas ainda está longe daquilo que é desejável. Nas visitas que fizémos aos hospitais encontramos deficiências, aliás, fomos acusados de não percebermos nada de saúde. Creio que há pessoas no seu partido, e até fora dele, que confundem perceber de medicina com perceber de saúde, o que é uma coisa diferente. Não é rigorosamente mesma coisa!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O problema que se põe nos sistemas mais avançados do mundo- e vejamos o sistema americano, o dinamarquês, o sueco, o inglês, o francês- é o mesmo que põe em Portugal, a uma escala diferente e salvaguardado das distâncias, que é o problema do financiamento. Não é por causa das administrações hospitalares nem é pelo facto de haver nomeações da confiança do Governo que as coisas não funcionam de uma forma melhor na saúde em Portugal. O problema principal é o do financiamento e, aliás, nós concedemos e dizemos que alguma tem de ser feita nesse sentido.
Portugal tem, em todo o sistema de saúde, um défice não de 80 ou 90 milhões de contos mas de 60 ou 70 milhões de contos, se se fizer uma contabilização rigorosa, cruzando as dívidas dos hospitais para as administrações regionais de saúde. Mas este problema não se resolve, como tem sido a principal pedra de toque das vossas soluções, dizendo: «façamos aqui, directamente, mais um aumento do Orçamento do Estado». Deste modo, resolve-o a curto prazo, Sr. Deputado, mas não no médio ou no longo prazo.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado resolve o problema imediatamente tapando esse buraco orçamental, mas tem-no repetido daqui por dois ou três anos.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É este o drama dos países ricos, que têm de reconverter o modo de funcionamento do seu sistema de saúde.