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16 DE ABRIL DE 1994 1957

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o que V. Ex.ª referiu inicialmente corresponde à verdade, pois, juridicamente, esta lei já entrou em vigor. Porém, não existindo a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, por ainda não ter sido feita a regulamentação necessária, em termos práticos, o acesso dos cidadãos a estes mecanismos está bloqueado, porque este órgão tem funções muito importantes na economia do diploma e, como o Sr. Secretário de Estado acabou de dizer, para que se proceda à regulamentação de outros aspectos desta legislação, essa comissão deverá estar constituída. Ora, enquanto não o estiver, praticamente todos os mecanismos previstos nesta lei sobre acesso aos documentos administrativos estão bloqueados.
Já calculava que o Sr. Secretário de Estado viesse aqui anunciar que o Governo ainda não resolveu este problema mas que está em vias de fazê-lo. Porém, é um facto - e, por essa razão, deve ser dito - que o Governo tem acompanhado desde há vários anos o processo legislativo nesta Assembleia, tendo conhecimento do momento em que esta lei ia ser publicada, a qual, aliás, foi referendada pelo Ministro da Presidência em representação do Primeiro-Ministro cerca de um mês antes da sua publicação no Diário da República.
0 Governo sabia que estava fixado um prazo de 90 dias para a sua regulamentação. Considerando a importância desta matéria (os prazos para a regulamentação e constituição da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos foi uma matéria cuidada no debate, na especialidade), não o ignorava, pelo que não é admissível que se passem os 90 dias previstos para a regulamentação, que passem mais 162 dias para além desse prazo e que o Sr. Secretário de Estado venha agora dizer que, finalmente, o Conselho de Ministros aprovou uma regulamentação que vem permitir que a comissão venha a ser efectivamente constituída.
Creio que esta atitude revela que o Executivo tem dois pesos e duas medidas relativamente aos direitos dos cidadãos face à Administração Pública, ou seja, o Governo foi muito lesto em querer fazer aprovar a lei do segredo de Estado...

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Concluo de seguida, Sr. Presidente.
O Governo foi igualmente lesto, depois de declarada a inconstitucionalidade da lei do segredo de Estado, em vir a esta Assembleia para expurgar algumas inconstitucionalidades de forma a essa lei poder entrar em vigor e tem bloqueado a entrada em vigor da lei de acesso aos documentos administrativos enquanto não tiver uma lei do segredo de Estado que lhe permita salvaguardar o secretismo da Administração Pública.
É significativo que, inclusivamente, na própria documentação elaborada a nível do Governo sobre a Administração Pública - e estou a referir-me ao recente relatório da Comissão para a Qualidade e Racionalização na Administração Pública - não haja uma única palavra sobre o acesso dos cidadãos aos documentos administrativos e aos deveres que decorrem da Administração Pública no cumprimento desses direitos. Estamos perante um Governo que nega - e pretende negar -, na prática, o direito constitucional dos cidadãos a terem acesso aos documentos administrativos.

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos adicionais, por tempo não superior a um minuto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, é óbvio que a lei entrou em vigor e que o prazo que o Governo tinha para regulamentá-la não foi cumprido. Ficamos, naturalmente, satisfeitos pelo facto de o Sr. Secretário de Estado informar a Câmara de que o Conselho de Ministros já terá aprovado esse diploma, mas não basta dizê-lo. É necessário sabermos exactamente como entende o Governo assumir a noção de administração aberta, tendo em conta que tal noção envolve o acesso aos documentos administrativos, tal como está consagrado no artigo 268.º da Constituição, bem como a definição de condições e, sobretudo, a preservação desses mesmos documentos.
É que, como o Sr. Secretário de Estado tem conhecimento, há grandes dúvidas por parte dos serviços da Administração Pública sobre critérios a utilizar relativamente à preservação da documentação. Neste momento, a Administração Pública debate-se com uma praga - a das fotocópias, como bem sabemos - e é preciso saber de que forma vão preservar-se os arquivos da Administração, em termos de transparência, de modo a que os cidadãos conheçam exactamente aquilo que lhes diz respeito no Estado e na Administração Pública.

0 Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos adicionais, por tempo não superior a um minuto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

0 Sr. Deputado José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, só há uma boa notícia em tudo aquilo que disse, ou seja, que o Governo interpreta a norma correctamente no sentido que é de aplicação directa e, em determinados aspectos, não carece de regulamentação.
Mas a verdade é que confessou o bloqueio e não explicou minimamente por que razão o Governo sustou, até agora, a emissão das doutas providências que V. Ex.ª enunciou e que não têm qualquer dificuldade, a não ser que se verifique um bloqueio político como aparentemente há. Por um lado, o Governo acciona os mecanismos de secretização prática, por outro, adopta junto dos funcionários públicos medidas restritivas de uma atitude aberta em relação aos cidadãos e a informações, as mais ridículas e correntias; em terceiro lugar, catrafia e secretiza informações estatísticas - o que é, em si mesmo, um escândalo - ou torna-as inacessíveis por razões económicas ou pelo meio utilizado; em quarto lugar, o Governo não cumpre a lei sobre os arquivos históricos e gostava que V. Ex.ª pudesse, já agora, alargar a sua resposta à explicação da razão pela qual o Decreto-Lei n.º 16/93, de 23 de Janeiro, que regula os arquivos, está também esplendorosamente por cumprir.
Em Portugal, arquivos tão essenciais para a nossa história e para o conhecimento da nossa realidade recente, como os arquivos da guerra colonial, estão fechados, selados e inacessíveis, o que exprime também uma concepção da Administração Pública como entidade fechada, até num sentido histórico, para já não falar do que se passa como o arquivo da Torre da Tombo.