22 DE SETEMBRO DE 1994 3081
tucional dos diferentes partidos aqui representados, porque eles definem bem a natureza e o programa de cada partido político, pois os programas eleitorais trazem muito «bacalhau a pataco», muito «frigorífico» e muitas outras coisas pelas quais se conquista o voto fácil do eleitorado.
Efectivamente, os projectos de revisão constitucional conformam a essência própria da política dos diferentes partidos e daí a utilidade e a validade deste debate. Só desejamos que ele seja propiciador de um eco público e de uma adequada diferenciação dos programas dos diferentes partidos.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.
O Sr. Presidente: - Para apresentar o seu projecto de revisão constitucional, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste curto espaço de tempo de que disponho, proponho-me sumariar as razões por que apresentei este projecto de revisão constitucional.
Em primeiro lugar, entendo participar neste trabalho em que o legislador se move num paradigma temporal diverso do habitual, não estando limitado por horizontes temporais de legislatura ou por programas de maiorias concretas.
Devemos ter, sobretudo, neste momento presentes os valores e as realidades permanentes que são expressão da individualidade do nosso povo. Devemos, por isso, proceder a esta reflexão periódica sobre esses valores para assegurar a sua consagração e protecção. É que uma Constituição só pode ser boa para um povo quando procura identificar os seus valores e a sua individualidade própria.
Mas, uma vez que a cultura não é, nem pode ser, algo de estático, mas sim dinâmico, é evidente a necessidade de os países evoluírem também pela gradual e sucessiva integração dos novos valores autênticos que enriqueçam os anteriormente adquiridos.
A política é também antecipação, Francisco Sá Carneiro soube ver a longo prazo e o seu legado aí está no património que o PSD desenvolveu ao longo dos anos.
O projecto de revisão do PSD reflecte esse património e por isso o apoio, sem prejuízo de lhe acrescentar muitas propostas ou pelo menos bastantes propostas, que são a minha interpretação pessoal e a inovação que sobre esse património quero efectuar. Como Sá Carneiro, proponho, por exemplo, a definição do povo português no artigo 4.º, a consagração da liberdade de aprender e de ensinar com grande amplidão e com total alteração do n.º 1 do artigo 75.º, o alargamento da matéria do referendo, incluindo o referendo constitucional, pela. qual ele sempre se bateu.
Mas, do seu legado, retiro também dois aspectos essenciais: a atenção à pessoa humana como destinatária de toda a política e a capacidade de inovar.
Assim, por um lado, limito-me a constitucionalizar avanços já acolhidos na lei ordinária, como é o caso do direito das vítimas de crimes a obterem indemnização; a gratuitidade da escolaridade obrigatória para todos, seja ela prosseguida no ensino público, particular ou cooperativo, oferecendo a todos a possibilidade de opção; o direito à diferença, já consagrado na Lei de Bases do Sistema Educativo; o apoio às organizações e instituições que se dedicam a tarefas de desenvolvimento dentro e fora do País.
Mas, por outro lado, no campo dos novos direitos, proponho a consagração de alguns, como o direito ao acompanhamento da solidão e no momento da morte, os bio-direitos, o direito ao ambiente urbano, direitos que dão resposta a algumas das grandes preocupações do nosso tempo.
Com o meu projecto, quero aproximar também eleitos de eleitores, o chamado país político do país real, perante sintomas de distanciamento que se vão verificando.
Em primeiro lugar, para além do alargamento das matérias do referendo já referido, proponho a consagração de um sistema eleitoral misto, que sempre defendi, de duplo voto inspirado no que se pratica na República Federal da Alemanha criando círculos uninominais juntamente com um círculo nacional, que permitam essa aproximação.
Mas há depois que reafirmar os limites da acção do Estado que não pode invadir o domínio do não deliberável, na feliz expressão de Helmut Schmidt. Acentuo a função de estímulo e de apoio a todas as acções nos domínios económicos, sociais, educativos e culturais que os cidadãos desencadeiam.
Contém o meu projecto outras propostas naquele sentido, das quais destaco o poder excepcional de obter, por período máximo de 30 dias, a suspensão e a reapreciação imediata de actos administrativos quando constituam ameaça grave e iminente para os direitos fundamentais da pessoa humana, para o património cultural, a saúde pública ou o ambiente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A democracia, já Tocqueville o afirmava há mais de século e meio, é indeterminação, é o regime aberto que permite às pessoas construírem livremente a história e não serem forçadas a caminhar para soluções fixistas e pré-determinadas. É por isso que estou convicto de que o artigo 288.º acabará por conter só aquilo que é o inultrapassável, permanente, inquestionável, ou seja, os direitos fundamentais da pessoa humana, a independência nacional e os princípios essenciais da democracia a que Edgar Morin chamava o conjunto do sagrado.
Ensaio uma solução de longo prazo que, nesta perspectiva aberta, dê resposta a esta indeterminação, mau grado os juristas que querem amarrar tudo à certeza.
O Sr. Presidente: - Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: - Na questão das regiões, por exemplo, penso que elas não podem ser impostas de cima para baixo, por uma deliberação central, como alguns partidos da oposição querem, mas não há motivo para não devolver a questão, no prazo de cinco ou seis anos, à iniciativa dos municípios para que, federados para esse efeito, possam propor à Assembleia da República a reapreciação da questão.
Gostaria de referir ainda o reforço do apoio à família, a responsabilização maior do Estado e de todos os adultos perante as crianças abandonadas e em perigo grave e a consagração das artes e ofícios tradicionais como forma de transmissão cultural e de desenvolvimento harmonioso.
Não ignoro, finalmente, duas questões primordiais: as questões prementes que a investigação científica e a inovação tecnológica nos colocam hoje.
Neste sentido, proponho que a nossa Assembleia, através da avaliação dos riscos das opções científicas e tecnológicas e em cooperação com o Governo, não se alheie dessa questão fundamental.
Finalmente, sublinho a consagração do direito ao desenvolvimento sustentável, no artigo 7.º e noutros, considerado hoje o direito dos povos e das pessoas como é definido na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, aprovado pelas Nações Unidas em 1986.
Em vários preceitos, tento reflectir o universalismo dos portugueses, o estímulo a que se empenhem, sobretudo nos países de língua portuguesa, sem esquecer, claro, a proposta da Sr.ª Deputada Manuela Aguiar, que responde ao