27 DE JANEIRO DE 1995 1333
Com esta atitude, o Governo PSD demonstrou mais uma vez que não quer ou não é capaz de assumir perante o povo português as suas responsabilidades por erros ou omissões de elevado significado político, mesmo quando está em causa a imagem de Portugal e a credibilidade do Estado português, no seu esforço e responsabilidade histórica de sensibilizar a comunidade internacional para forçar a Indonésia a desocupar o território de Timor Leste e a restituir o direito à autodeterminação ao seu povo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes consideram que a gravidade e o alcance político deste acontecimento justificavam e justificam, sem qualquer dúvida, em nome do interesse nacional e da dignidade do povo que somos, a auto-demissão deste Governo.
Como o Governo não soube e não quis assumir essa responsabilidade política, exigia-se que fosse censurado, também aqui, no plano institucional.
O outro acontecimento recente de grande significado político é a decisão prepotente e autoritária do Primeiro-Ministro de, por razões pessoais e também no que considerou ser o interesse do PSD, o seu partido, querer impor aos portugueses um Governo a prazo certo, comandado por si próprio, recusando-se a ser avaliado pela política desastrosa que tem prosseguido e pela crise política em que envolveu o País. Com esta situação será também beneficiado o PSD, já que se poderia aprestar às eleições com um novo líder e, assim, não assumir totalmente as responsabilidades que efectivamente tem pelos efeitos nefastos desta política e desta acção governativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes consideram que a situação que o Primeiro-Ministro Cavaco Silva quer impor aos portugueses é uma farsa que, à luz da tradição e das normas eleitorais que a Constituição estabelece, carece, além do mais, de legitimidade política. Basta dizer que as eleições são para os Deputados e não para os primeiros-ministros e que o papel dos líderes dos partidos não é desprezível nas disputas eleitorais.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, esta farsa que nos pretende ser imposta deve ser também avaliada nas suas consequências económicas, sociais e ambientais e, bem assim, nas condicionantes que impõe ao desenvolvimento do País.
Uma situação de Governo a prazo certo é caracterizada pela falta de clarificação política, a qual gera, expectativa, incerteza e desconfiança, factores, estes, que, por sua vez, geram instabilidade social e política e, naturalmente, retraem opções de investimento.
Neste quadro, que só poderá vir a ser ultrapassado com novas eleições, com a aprovação de um novo programa de governo e com um novo Orçamento do Estado, Portugal e a sociedade portuguesa perderiam pelo menos um ano no seu esforço necessário e fundamental de desenvolvimento do País e de criação de melhor bem-estar e qualidade de vida para os portugueses.
Não é possível, pois, permitir que por interesses pessoais ou partidários seja adiado e posto em causa o interesse nacional. Sobretudo Portugal e os portugueses não se poderá dar ao luxo de desperdiçar oportunidades ímpares, como é o caso do aproveitamento dos fundos comunitários disponíveis e a disponibilizar e do processo de revisão do Tratado de Maastricht.
Por todas estas razões, o Partido Ecologista Os Verdes pede a demissão deste Governo, bem como a dissolução da Assembleia da República, e defende a realização de eleições antecipadas no mais curto espaço de tempo.
Mas esta posição de Os Verdes baseia-se também na avaliação que fazemos da política que o PSD e o seu Governo impuseram ao nosso país nos últimos anos e que se traduz na realidade social, económica, cultural e ambiental que, hoje, vivemos, apesar dos largos milhares de milhões de contos que entraram no País e que poderiam ter sido utilizados na promoção de um verdadeiro desenvolvimento sustentável e harmonioso do todo nacional.
Ao invés, verificamos que a estrutura industrial portuguesa não se modernizou, com graves problemas para a economia nacional, a garantia e estabilidade no emprego e a redução dos níveis de poluição industrial.
No mundo rural, a submissão a interesses exteriores, o não reconhecimento da especificidade da agricultura portuguesa e o quanto ela pode contribuir para uma estratégia de desenvolvimento autónomo do nosso país, conduziu a uma situação de profunda crise que tende a agravar-se e cujos sintomas mais degradantes e visíveis são a desertificação biofísica, o despovoamento e o desemprego, a erosão dos solos, a descaracterização da paisagem e o esvair das raízes culturais das regiões, que, pela sua diversidade, constituíam uma grande riqueza da nossa identidade cultural como povo.
Das opções de desenvolvimento que nunca se verificou, avançando-se sempre por acções avulsas e desgarradas de crescimento a qualquer preço, de acordo e em função dos interesses instalados, ressalta a situação de agravamento crescente das assimetrias regionais, de que são indicadores mais visíveis a desertificação e o despovoamento das regiões do interior, bem como o congestionamento insustentável no litoral, provocado pela concentração urbana e industrial de que resultam graves problemas sociais e ambientais, cada vez mais difíceis de gerir e ultrapassar.
A este propósito, não podemos deixar de referir a concepção e a prática centralista e centralizadora no exercício do poder deste Governo e, em particular, do Primeiro-Ministro, ao recusar-se a fazer a regionalização do País, impedindo o desenvolvimento regional através do incentivo à mobilização e ao aproveitamento de recursos e potencialidades endógenos e favorecendo a aproximação dos cidadãos ao poder de decisão.
A educação, no período de governação do PSD, apesar de sempre dita como a prioridade das prioridades, talvez tenha tido o maior revés de sempre, manifestado, sobretudo, tanto na falta da concretização de objectivos sucessivamente reformulados e adiados como na instabilidade gerada em todos os agentes e níveis de educação e ensino.
Na saúde, a política seguida, em vez de criar condições para um serviço tendencialmente gratuito, impôs a penosa obrigação de "quem quer saúde paga-a".
Em outros domínios mais específicos, mas nem por isso menos importantes e significativos para ilustrar a política do Governo PSD, refira-se o caso dos recursos hídricos, factor estratégico e fundamental em qualquer política de desenvolvimento sustentável. Além da escandalosa situação em que os rios internacionais perderam volumes de caudal significativos nos últimos anos, por evidente desleixo e desinteresse do Governo pelo que se estava a passar em Espanha, não se pode esquecer o facto de, numa manifestação de mera perspectiva liberal e economicista, o Governo ter criado, primeiro, os instrumentos legais para instalar um mercado da água em Portugal e só depois, por força de múltiplas pressões, se resolveu a avançar, a prazo, para a elaboração de estudos sobre a situação dos recursos hídricos em Portugal, elaborando posteriormente planos regionais, depois o plano nacional e, finalmente, se ainda houver recursos hídricos, talvez o Governo se decida a elaborar uma lei de bases dos recursos hídricos.