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3736 I SÉRIE-NÚMER0 102

O Sr. Presidente: - Não interrompi o Sr. Deputado Moura e Silva, uma vez que tratou, conjuntamente, os dois inquéritos parlamentares. Portanto, houve economia de tempo.
O Sr. Deputado Manuel dos Santos pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, queria apenas informar que os relatórios não são votados, como V. Ex.ª bem sabe, ao contrário do que referiu o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Presidente: - É evidente, Sr. Deputado. Não há que votar nada nesta matéria, porque não foi apresentada qualquer projecto de resolução e só se votam os projectos de resolução, quando existem.
Quanto ao relatório da Comissão, naturalmente que será publicado.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do relatório da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar para Apreciação dos Actos do Governo do PS e do PPD/PSD envolvendo o Estado e Grupos Económicos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Comissão de Inquérito concluiu dois dos dossiers que lhe diziam respeito, o da privatização do BCP/BPA e o do Totta/Mundial-Confiança. Mas só um, verdadeiramente, tem história suficiente para o trazermos, neste dia, ao Plenário: o do processo Champalimaud. E tem uma história que se tornou mais actual com os acontecimentos posteriores relativos à venda da holding pessoal de António Champalimaud aos espanhóis do Banco Santander Central Hispano.
As irregularidades que rodearam a privatização do 13TA e da Mundial-Confiança estão bem .expressas no projecto de relatório final da Comissão, do Deputado Jorge Ferreira - não sei se precisa de tempo para intervir neste debate... -, rejeitado pela convergência dós votos do PSD, do PS e, também, do próprio PP, que votou contra o relatório de um Deputado da sua bancada. É uma das singularidades deste processo.
Nesse relatório, Sr. Presidente, está demonstrado, sem lugar a dúvidas, que os governos do PSD, «prejudicando os interesses patrimoniais do Estado e de terceiros, favoreceram António Champalimaud, colocando à sua disposição os meios necessários para adquirir empresas do Estado em processo de privatização».
Outra das singularidades deste processo está nos comportamentos dos Deputados do Partido Socialista - com a saudável excepção do Deputado Henrique Neto -, que juntaram os seus votos aos do PSD e do PP para «abafar» o apuramento da verdade, ainda por cima, depois de terem sido dos mais críticos ao longo do decurso do inquérito.
Sabe-se agora, por declarações dos próprios e do Secretário de Estado do Tesouro, o que se passou: o Partido Socialista tinha consciência dos favores do PSD que tinham conduzido à reconstituição do império Champalimaud, como, aliás, o Primeiro-Ministro aqui confirmou, no debate do Estado da Nação, para gáudio do Sr. Deputado Jorge Ferreira.
Mas a única coisa que o PS e o Governo se lembraram de fazer foi um acordo com António Champalimaud, em que, pelo seu lado, o PS impediria o apuramento da verdade e, em contrapartida, o Sr. António Champalimaud se comprometia a não vender aos espanhóis. Isto é, o Partido Socialista - que agora multiplica discursos e acusações hipócritas contra o negócio com os espanhóis - sabia desse negócio e a única coisa que decidiu fazer foi mentir na Comissão de Inquérito, arrastando os seus Deputados para posições indignas do ponto de vista político e do ponto de vista pessoal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No final da história, o Sr. Champalimaud riu-se (e, seguramente, continua a rir-se) dos contorcionismos do Partido Socialista e vendeu mesmo aos espanhóis. Há uma expressão muito popular para quem assim quis ser enganado mas que, por respeito para com a Assembleia da República, me abstenho de citar...
A verdade é que se o relatório da Comissão de Inquérito tivesse sido aprovado, seguramente que o Sr. Champalimaud teria mais dificuldades em levar a bom porto o processo de venda ao Banco Santander do controle de centros estratégicos da economia portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o Partido Socialista que não venha chorar, agora, lágrimas de crocodilo, porque ele é tão responsável quanto o PSD...

Protestos do PS.

Estão muito nervosos os Deputados do Partido Socialista, Sr. Presidente!
Ele é tão responsável quanto o PSD pelo escândalo que tem constituído a reconstituição do império Champalimaud, feito exclusivamente à custa dos dinheiros públicos.
O Sr. Champalimaud não despendeu um tostão de seu na compra da Mundial-Confiança, do Totta & Açores e do Crédito Predial Português e agora a sua conta pessoal vai «engordar» em 120 milhões de contos, com acções e dinheiro da venda daquilo que foi pago pelo erário público. Grandes negócios, com o apoio do PS, do PSD e do PP!
Para terminar, Sr. Presidente, ainda há uma outra singularidade neste processo: a não publicação das declarações de voto dos Deputados, naturalmente incómodas algumas -, a pretexto de que o relatório do dossier Totta foi rejeitado. O dossier foi rejeitado, mas as declarações de voto de Deputados que são da Comissão de Inquérito deveriam e deverão ser publicadas.
Esta é, Srs. Deputados, uma história exemplar do que não deveria nunca acontecer. Quando ainda ontem ouvimos aqui os verbalismos radicalistas do Partido Socialista contra o desprestígio das comissões de inquérito, é oportuno dizer que são comportamentos destes que, esses sim, desprestigiam as comissões de inquérito.
Fazemos votos para que o Partido Socialista tenha aprendido a lição e, sobretudo, fazemos votos para que este processo seja um motivo de reflexão para o Governo