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0285 | I Série - Número 09 | 06 de Outubro de 2001

 

Francisco Louçã, se estivéssemos do lado de fora de uma janela a testemunhar um homicídio durante o dia e tivéssemos feito uma leitura demasiado apressada do artigo 34.º da Constituição, descobriríamos que não tínhamos credencial constitucional para podermos fazer uma busca domiciliária naquela situação de flagrante delito! Obviamente, as coisas não são assim e é preciso ter em linha de conta que a Constituição é um dispositivo…

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

Sr.ª Deputada Odete Santos, tenha dó de mim!
Como dizia, é preciso ter em consideração que a Constituição não é um texto de dispositivo único mas, sim, um texto complexo, um conjunto de normas jurídicas que têm de ser interpretadas e articuladas entre si, e que há, em matéria de princípios fundamentais, o artigo 21.º da CRP, que trata do direito de resistência, habilitando qualquer pessoa, designadamente as próprias forças de segurança, a repelir pela força qualquer agressão iminente.
É por isso que o fundamento para as buscas domiciliárias em flagrante delito tem credencial constitucional e, se o não tivesse, eu muito estranharia que estes Srs. Deputados, tão vigilantes do princípio das garantias, até hoje não se tivessem lembrado de impugnar a norma do nosso processo penal que expressamente prevê a possibilidade de as forças policiais poderem fazer buscas domiciliárias aquando de detenção em flagrante delito por crime a que corresponda pena de prisão!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mas não é de noite!

O Orador: - Ora, isto significa que o flagrante delito já tem cobertura em termos de credencial constitucional, que já está incorporada no normativo do nosso Código do Processo Penal.
A única dúvida que agora se nos colocava era a de saber se, tendo nós trabalhado exclusivamente no âmbito do n.º 3 do artigo 34.º e passando de uma norma de proibição absoluta para uma norma que remodela em termos novos, ao nada dizermos sobre a questão do flagrante delito para as buscas domiciliárias nocturnas, não subsistiria aí a interpretação reportada à versão antiga da norma.
Por isso, houve que clarificar, e clarificar no sentido óbvio: quando se trata de flagrante delito é indiferente que seja antes ou depois das 9 horas da noite, antes ou depois das 7 horas da manhã. Talvez isto seja uma caricatura, mas seria inteiramente absurdo que, por causa de uma distinção destas, uma força policial, em caso de flagrante delito, pudesse entrar às 9 horas menos 1 minuto na casa de alguém e às 9 horas mais um minuto deixasse de o poder fazer, mesmo que a natureza do crime, pela sua gravidade, exigisse a necessidade de uma intervenção imediata.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mas a regra não é a da hora, é a do nascer do sol!

O Orador: - Portanto, Srs. Deputados, metam os vossos fantasmas na gaveta, porque esta questão já está resolvida há muito tempo, no que respeita às buscas domiciliárias, na sua filosofia geral, em termos adequados, com a credencial constitucional que vos referi e com a sua consagração no processo penal.
Srs. Deputados, a questão que agora se nos coloca é a de saber em que condições garantísticas é que poderíamos permitir buscas domiciliárias para a perseguição de certo tipo de criminalidade grave. Neste aspecto, os Srs. Deputados têm de fazer justiça à norma que vos é proposta, dado que essas garantias são totalmente expressas, ou seja, é expressa a exigência da intervenção judicial como forma de autorização prévia para que esta busca domiciliária possa ocorrer e a regulação desta matéria é feita nos termos da lei.
Isto significa que tanto as buscas domiciliárias com autorização judicial como a própria regularização do flagrante delito vão ter de se subordinar não só ao princípio da constitucionalidade em geral como também ao princípio da legalidade, o qual implica, naturalmente, a necessária regulação, de competência exclusiva do Parlamento, para determinar as condições processuais em que esse tipo de acção possa ocorrer.
Srs. Deputados, estamos a tratar de matérias policiais e judiciais no âmbito do Estado de direito, não estamos a tratá-las no âmbito dos Estados pré-constitucionais de direito que a Sr.ª Deputada Odete Santos invocou e não estamos, portanto, a tratar destas matérias em lógicas totalitárias. Estamos aqui para combater todos os totalitarismos, mas o binómio liberdade/segurança tem de ter uma resposta responsável por parte dos Deputados no tempo em que vivemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria só dizer, em cinco segundos, que julguei que a proposta estava mal redigida e que o caso do flagrante delito também era só para a criminalidade organizada. Da intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão concluí que não é assim e que é para toda a gente. Portanto, todos os cidadãos ficam sujeitos a isto!
Em segundo lugar, quero dizer, em abono da verdade, porque há coisas que se devem dizer com exactidão, que não é verdade que o Código do Processo Penal autorize buscas domiciliárias nocturnas. O n.º 1 do artigo 177.º do Código do Processo Penal, que não aparece alterado em nenhum outro número, diz que a busca em casa habitada só pode ser ordenada ou autorizada por juiz e efectuada entre as 7 e as 21 horas, sob pena de nulidade. O que o Sr. Deputado esteve a dizer não é verdade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Deputada Odete Santos, não foi nada disso que eu lhe disse! Evidentemente que, se já fossem admitidas as buscas domiciliárias nocturnas, estávamos aqui a perder tempo!
Ora, quanto a nós e salvo erro, de esquizofrenia ninguém aqui padece!

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.