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0282 | I Série - Número 09 | 06 de Outubro de 2001

 

O Orador: - Aqui, estamos a responder ao momento histórico actual, não podendo descorar a luta contra a criminalidade, oferecendo e reiterando, em simultâneo, os princípios caracterizadores do Estado de direito.
A primeira circunstância que nos motiva e envolve resulta de uma constatação de facto: a atenuação do princípio da territorialidade; isto é, a constatação de que os sistemas jurídicos nacionais têm cada vez mais um menor vínculo, uma menor ligação a este mesmo princípio. É que, como se viu bem recentemente, citando o Presidente da Assembleia da República, «a hora é não só de um assolador mimetismo universal mas é também a recordação de Hegel e da sua fria expressão: só as pedras são inocentes».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A segunda constatação resulta da necessária ponderação de um dos princípios estruturantes decorrentes do conjunto da reforma do processo penal português e daquele princípio que tem subjacente a construção de um sistema com base num eixo de distinção entre a pequena e a média criminalidade, por um lado, e a criminalidade grave e organizada, por outro, com as necessárias diferenças de tratamento processual.
Estas duas circunstâncias determinam esta alteração constitucional ao n.º 3 do artigo 34.º. Mas aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, urge reiterar que o princípio constitucional básico é e continuará a ser o princípio da inviolabilidade do domicílio. Importa que não se inverta a realidade e muitos daqueles que desconfiam da alteração ora em apreciação mais não fazem do que deitar mais uma acha para uma desconfiança crescente em relação ao Estado de direito democrático, às suas instituições e ao seu funcionamento interdependente e partilhado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Aqui, nesta alteração proposta, à qual o PSD se associa, quando falamos de flagrante delito estamos a pôr em primeiro lugar a protecção de bens públicos relevantes, que importa, de imediato, onde quer que seja e a que momento for, proteger e salvaguardar. No outro caso, estamos perante uma necessária autorização judicial e aqui não podemos nem devemos pôr em causa os tribunais e a sua independência como órgãos de soberania.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por estas razões e com estes pressupostos, o PSD associa-se a esta alteração constitucional, mas tendo como bússola constante o conjunto dos princípios constitucionais caracterizadores do processo penal português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda votará contra esta proposta, como foi indicado na intervenção inicial do Deputado Fernando Rosas, por razões substanciais de defesa da coerência da Constituição e dos direitos que ela consagra.
No entanto, quero interpelar os proponentes em função da argumentação que o Professor Jorge Miranda e o Professor Gomes Canotilho desenvolveram.
A proposta que nos é apresentada prevê uma liberdade de actuação das forças policiais no domicílio durante a noite e que não é prevista durante o dia. Segundo o n.º 2 do artigo 34.º, «A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial (…)», no entanto a proposta que nos é apresentam permite que à noite tal aconteça por autorização judicial, em casos determinados de crimes particularmente graves, e por flagrante delito, sem autorização judicial.
Ora, o flagrante delito ocorrido dentro de casa durante a noite não está definido juridicamente, a não ser num caso muito preciso - e bem! -, que é a violência doméstica.
Imaginemos, por absurdo, que o Sr. Deputado Fernando Seara se encontrava a telefonar, por exemplo, ao Dr. Jonas Savimbi, um terrorista internacional. Está em flagrante delito e deve, nesse caso, haver uma intervenção policial sem mandato judicial? A nossa resposta é «não», pela muito simples razão de que só depois da acção judicial é que se vai saber se o telefonema é para Savimbi ou para um familiar.
A nossa resposta é que esta proposta está escrita de uma forma tão desastrada, tão errada e tão violadora dos princípios constitutivos da nossa Constituição, como alertou o Professor Jorge Miranda, que se torna fácil levantar os direitos essenciais dos cidadãos da parte da noite, no seu próprio domicílio, ao contrário das regras que são impostas correctamente, do ponto de vista do Direito, quanto à violabilidade do domicílio durante o dia. É o absurdo máximo a que poderíamos chegar, e, por isso, não poderemos deixar de protestar e rejeitar esta proposta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que esta proposta é, para nós, uma matéria fundamental e que é original e originária do CDS-PP.
Propusemos esta matéria a primeira vez, formalmente perante esta Câmara, num debate sobre segurança interna por nós pedido, em, se não estou em erro, Fevereiro de 2000. E, desde então, temos sustentado esta necessidade de fundamental alteração constitucional.
O que está em causa? O que está em causa é que estamos presos a alguns conceitos, enquanto que determinados tipos de criminalidade, designadamente aquele que nos levou a apresentar esta proposta, que é o tráfico de droga, estão muito à frente de alguns dos nossos pressupostos e princípios em relação a esta matéria. E não será preciso documentar demasiado perante a Câmara uma realidade que todos conhecemos: todos assistimos, nas televisões, à prática do crime de tráfico de droga durante a noite, «negócio» que se fazia através de pequenos postigos, numa perfeita impunidade, e conhecemos as queixas sucessivas dos nossos agentes de segurança pela sua incapacidade de actuação.