43 | I Série - Número: 051 | 22 de Fevereiro de 2007
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O paradigma da responsabilidade penal tem vindo a modificar-se e a evoluir no sentido da responsabilização penal das pessoas colectivas.
Apesar do apego do legislador penal ao princípio societas delinquere non potest, expresso no artigo 11.º do Código Penal, a verdade é que a doutrina foi já respondendo às objecções mais comuns no que concerne à responsabilidade penal das pessoas colectivas, refutando as críticas de que estas não têm capacidade de suportar um juízo de censura ética (ou juízo de culpa) ou até de serem até incapazes de uma verdadeira capacidade de agir.
Actualmente, a doutrina maioritária defende que a pessoa colectiva é perfeitamente capaz de vontade — que não é psicológica, por falta de estrutura biopsíquica, mas normativa — e que esta vontade colectiva é capaz de cometer crimes tanto quanto a vontade individual.
Acresce que diversos instrumentos de direito convencional comunitário, assim como várias decisõesquadro do Conselho da União Europeia, versando sobre diferentes áreas, que vão desde os crimes sexuais aos crimes ambientais, passando pelo tráfico de pessoas, impõem aos Estados-membros o dever de responsabilizar penalmente as pessoas colectivas.
Urge, por isso, responder à evolução do direito penal, aproveitando para acolher as orientações comunitárias a que o Estado Português se obrigou. Nesse sentido, o PSD apresenta o projecto de lei n.º 239/X, que aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas.
Consequentemente, determina-se que as pessoas colectivas são responsáveis criminalmente quando, por ocasião da sua actividade, ocorram factos que consubstanciem certos ilícitos penais, como, por exemplo, o tráfico de pessoas para exploração do trabalho, tráfico de influência, branqueamento ou violação do segredo de justiça.
E entende-se que ocorrem por ocasião da actividade da pessoa colectiva, ou entidade equiparada, os crimes cometidos em seu benefício quando praticados ou pelos titulares dos seus órgãos, no exercício das suas funções, ou pelos seus representantes, em seu nome e no interesse colectivo, ou os resultantes da violação de deveres de cuidado a observar pela pessoa colectiva, ou entidade equiparada, destinados a evitar ou diminuir os riscos típicos da sua actividade.
Como penas principais optou-se pelas penas de multa e de dissolução.
No que se refere à pena de multa, adoptou-se o sistema de dias de multa. Propõe-se que a determinação da moldura abstracta da pena de multa aplicável às pessoas colectivas se faça por referência à moldura abstracta da pena prevista para as pessoas singulares. Deste modo, determina-se, como regra, que um mês de pena de prisão corresponde, para as pessoas colectivas, a 10 dias de multa, sendo que cada dia de multa corresponde a uma soma entre 1 e 50 unidades de conta.
A pena de dissolução será decretada apenas como última ratio.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em matéria de responsabilidade penal das pessoas colectivas, o projecto de lei do PSD não diverge, do ponto de vista dos propósitos, da proposta de lei do Governo.
Há, contudo, duas diferenças que gostaria de sublinhar, sendo a primeira apenas de forma. O PSD optou por autonomizar o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas em diploma próprio, enquanto o Governo preferiu incorporar essa matéria no Código Penal.
Esta diferença de forma não constitui, de todo, nenhum entrave à regulação desta matéria. Relevante é assinalar que o Acordo Político-Parlamentar para a reforma da Justiça, assinado entre o Partido Socialista e o Partido Social Democrata, impõe a consagração da responsabilidade penal das pessoas colectivas no âmbito da reforma do Código Penal.
Obviamente que o PSD honrará o compromisso que assumiu, independentemente da forma, mas não abdicando da essência do conteúdo.
Uma segunda diferença, bem mais substantiva, tem que ver com o âmbito de aplicação da lei. É que a opção do Governo de excepcionar da responsabilidade criminal as pessoas colectivas públicas, incluindo as concessionárias de serviço público e independentemente da sua titularidade, oferece-nos sérias reservas e constitui uma diferença substancial que teremos de dirimir na especialidade. De resto, nesse sentido também já se pronunciaram negativamente, nas audições realizadas na 1.ª Comissão, o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público e a Ordem dos Advogados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Haverá, naturalmente, arestas a limar em sede de especialidade, quer na questão que acabo de referir, quer na sugestão pertinente que nos foi formulada de integração do crime de burla no elenco dos crimes alvo da responsabilidade penal das pessoas colectivas, quer numa outra questão a ponderar também, que diz respeito à definição da extinção da responsabilidade penal das pessoas colectivas.