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42 | I Série - Número: 051 | 22 de Fevereiro de 2007

Todas as questões relativas à exploração de pessoas na prostituição, tratando-se de vítimas maiores, adquirem uma nova acuidade com a nova arrumação proposta, quanto ao tráfico de seres humanos, com a nova definição deste crime, com a introdução de um novo crime relativo apenas ao cliente de prostituta/prostituto menor, que não maior, e com a manutenção da exigência, no que toca à exploração de maiores na prostituição, da prova do requisito profissionalmente ou com intenção lucrativa (vide artigo 169.º), requisito este que praticamente inviabiliza o combate ao proxenetismo.
Na verdade, todos estes elementos associados conduzem à conclusão de que, relativamente a maiores usados na prostituição, poderá haver aquilo que alguns dizem prostituição consentida e outros, mesmo, um trabalho, merecendo, assim, as vítimas uma menor protecção penal.
Esta, aliás, foi uma matéria de grandes debates nos trabalhos preparatórios do protocolo sobre o tráfico de seres humanos, anexo à convenção das Nações Unidas sobre o crime transnacional organizado, durante as reuniões em Viena.
É certo que o artigo 160.º proposto, ao referir o tráfico para exploração sexual, contém, entre os meios utilizados para traficar um ser humano, o aproveitamento de uma situação de vulnerabilidade — e isto, que consta do protocolo das Nações Unidas, deve salientar-se.
Contudo, tal artigo confronta-se depois com a prova dos requisitos para que se prove a exploração em relação a vítimas maiores — profissionalmente e com intenção lucrativa. E aí temos como a solução que se mantém, quanto à utilização de maiores na prostituição, permitiria, e permitirá, o tráfico de seres humanos.
É, de facto, na definição de prostituição que reside o sucesso do combate ao tráfico de seres humanos. As velhas teorias sobre a prostituição como uma profissão mais não fazem do que fomentar o tráfico e a exploração.
Ainda na parte relativa aos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, convirá reparar que o consta do artigo 168.º do Código Penal, que o Governo mantém, foi reformulado — e peço a vossa atenção para este aspecto — na lei sobre procriação medicamente assistida (PMA), que à feminização da lei penal nesse inciso preferiu, mantendo a moldura penal, punir a recolha não consentida de gâmetas masculinos ou femininos para serem utilizados na PMA.
Assim, parece-nos desajustada a manutenção da matéria nesta parte dos crimes sexuais. Já a comissão revisora do Código de 1982 teve dúvidas e hesitações quanto à sua inserção.
Deverá manter-se na lei da PMA a incriminação que atrás se referiu e excluir-se o artigo 168.º.
Os fenómenos de neocriminalização deverão sempre ser devidamente justificados. Ora, com o artigo 173.º, que será correspondente, em parte, ao actual artigo 174.º, passa-se uma história curiosíssima. A sua incriminação, inicialmente com a epígrafe «Estupro», correu seriamente o risco de desaparecer da lei penal em 1995. Foi mesmo proposta a sua revogação por um membro da comissão revisora, pela triste história, contra a dignidade das mulheres, de que nos fala a nossa história judiciária. Eis senão quando surge agora remoçado, com um agravamento da pena e com uma neocriminalização de actos sexuais de relevo não contemplados na redacção actual, quando as vítimas são do sexo feminino.
O que é que justifica esta regressão? Que estudos há? Sim, porque a resposta não pode ser apenas a teimosia de manter sob outra forma o que consta do artigo 175.º do Código Penal — e é isso que, de facto, acontece.
Não sendo possível a apreciação de todas as soluções constantes da parte especial do Código, permitamme que saliente os artigos relativos a ilícitos penais laborais.
O PCP apresentou, em 1997, um projecto de lei que continha um capítulo sobre esta matéria. Algumas das soluções já constam do Código, sendo algumas diferentes e coincidindo outras em parte. Considero, porém, que há um inciso relativo à questão da higiene, saúde e segurança no trabalho que contém, no final, uma redacção muito melhor do que a apresentada pelo PCP.
Parece-nos, no entanto, que se deveria ainda atender à questão da exploração do trabalho infantil, pois não penso que o crime de maus tratos, tal como está tipificado, abranja todas as situações.
Por último, permitam-me ainda referir que, apesar de tudo, a proposta de lei não foge à criminalização de protestos sociais, o que, nomeadamente, se prevê para os crimes de perigo relativos à liberdade de circulação. É já a segunda tentativa do PS — e, desta vez, levará na carteira esta aprovação — para criminalizar, vulgo, os cortes de estradas, que as pessoas usam em protesto social, mesmo quando destes cortes não resulte qualquer perigo nem para a circulação, nem para a vida, nem para ninguém. Hoje, só estão criminalizados se, de facto, daí resultar perigo e o que o PS pretende é criminalizar mesmo que não exista qualquer perigo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não pode ser!

A Oradora: — Esta criminalização do que já ficou conhecido pelo direito à indignação (vide, por exemplo, o artigo 288.º e outros do Código Penal) secunda o que na Europa se vem fazendo na pura imitação do que se passou nos Estados Unidos da América com os think tank neoconservadores que estiveram na base de políticas repressivas, que aumentaram a população prisional com as vítimas das crises.
As políticas subsecuritárias cavam, de facto, a crise da justiça.