O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

18 | I Série - Número: 052 | 23 de Fevereiro de 2007

Só assim reforçaremos a credibilidade das instituições, impedindo que grasse impunemente a corrupção. E é isso que os portugueses esperam de nós e desta Câmara que os representa.
Só assim impediremos generalizações abusivas, que se transformam num anátema indiscriminado sobre os responsáveis políticos e titulares de cargos públicos. Não «distinguir o trigo do joio» ou «confundir a árvore com a floresta» é também, em si mesmo, uma forma de corrupção social que corrói, igualmente, a sociedade e as suas instituições.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não vos vou apresentar em pormenor as iniciativas do PSD em debate, tarefa que caberá ao meu companheiro de bancada, bem mais apto a fazê-lo, o Sr. Deputado Fernando Negrão.
Como não vou apreciar o conteúdo técnico, jurídico e normativo das demais iniciativas, tarefa que devemos fazer, com a maior atenção e cuidado, em Comissão, na especialidade.
Permitam-me, antes, que discorra um pouco mais sobre esta temática e que lembre aqui alguns dos antecedentes do percurso legislativo que vimos seguindo neste âmbito do combate à corrupção e à criminalidade económicas.
Vão longe os tempos em que, contrastando com a ausência de iniciativas do actual Governo, o primeiroministro, humilde, mas convictamente, veio a esta Câmara apresentar uma proposta de lei de autorização legislativa (depois transformada em proposta de lei material), que visava aprovar importantes medidas de combate à corrupção. Refiro-me à proposta de lei n.º 48/VI, que depois deu lugar à proposta de lei n.º 60/VI, aqui ineditamente apresentada, neste Plenário, em 14 de Março de 1993, pelo então primeiro-ministro e actual Presidente da República, Prof. Cavaco Silva, que tem, também, por isso, ética acrescida nas razões de empenhamento e nas preocupações que vem revelando por este combate.
É bom lembrar que foi dessa iniciativa que saiu um dos mais importantes reforços de meios de sempre no combate à corrupção.
Como é bom lembrar, também, que foi essa lei que criou, e esse seu governo que implementou, o Departamento de Perícia Financeira e Contabilística, essencial no apoio à investigação deste tipo de criminalidade, reforçando também as competências da Direcção Central para o Combate à Corrupção, Fraudes e Infracções Económicas e Financeiras.
E deve ser igualmente recordado que, apesar de ser assim, essa lei foi votada, nesta Assembleia, isoladamente, apenas e só pelo PSD. Não chegámos, pois, só agora, nem esperámos por ninguém, para nos empenharmos neste combate em que estamos desde sempre.
Sabemos das dificuldades da investigação e da detecção deste tipo de criminalidade, bem como da forma insidiosa como se desenvolve.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando nos batemos por valores e por princípios que temos de salvaguardar colectivamente — e espero que assim seja pela parte de todas as iniciativas que estamos a discutir —, não o devemos fazer atropelando ou preterindo outros valores e princípios essenciais da pessoa, que num Estado de direito devem ser igualmente prezados. Este é um dilema com que o legislador sempre se depara nestas matérias.
Trata-se muitas vezes de consagrar formas que, no plano ético, deixam alguma reserva. É o caso, por exemplo, da atenuação e dos benefícios com que se premeiam os arguidos colaborantes. Não será, porventura, essa a medida mais problemática.
Em todo o caso, também é bom lembrar o que refere o ilustre Magistrado, Dr. Manuel Lopes Rocha: «Pense-se o que se quiser deste expediente, dificilmente o legislador poderá sacrificar conveniências de política criminal a considerações de ordem moral.» Não tenhamos, porém, a ilusão de que o combate à corrupção se esgota nos instrumentos legislativos e jurídicos ou mesmo nos meios humanos e materiais afectos aos órgãos de investigação e de instrução criminal. Este problema hoje, mais do que nunca, assume natureza cultural e tem que ver com os valores que, em cada momento, enformam as comunidades.
Não queremos uma sociedade em que os valores do poder e do prestígio são ajuizados em termos meramente materiais, superando os valores da honestidade, da lisura, da lealdade e da competência. Essa, sim, é uma sociedade geradora de corrupção.
Significa isto que, também neste particular, continuam válidas e actuais as nossas preocupações em relação à escola e à família, depositárias desses valores.
Revemo-nos em William Shakespeare, quando refere, em O Mercador de Veneza, que «Ninguém deve enganar a fortuna ou recolher as honras, sem que tenha o cunho do mérito, ninguém sonhe com dignidades que não mereça. Quanto seria para desejar que riqueza, postos e empregos não fossem devidos à corrupção, que todas as obras fossem justificadas pelo merecimento daquele que as recebe.» Mas o respeito por princípios fundamentais do Estado de direito é exigível a todos.
Não pactuaremos com o desrespeito pelo princípio da presunção da inocência.
Não pactuaremos com as constantes violações do segredo de justiça, nem com os pré-julgamentos, cada vez mais frequentes, na comunicação social.