6 | I Série - Número: 080 | 8 de Maio de 2008
O horror destes factos impõe uma sentida e empenhada manifestação de pesar por estas vidas violadas, por esta dignidade humana recusada, por esta humanidade que se reduz em cada acto de violência praticado.
O horror destes factos impõe a veemente denúncia dos direitos humanos negados.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, o horror destes factos não pode ser simplesmente um pretexto para uma intervenção política que marque a agenda. Bem pelo contrário, tem que ser determinante de uma reflexão que permita compreender as razões da nossa incapacidade e, por isso, indutora de uma persistente procura de respostas enérgicas.
Nos últimos anos, registou-se em Portugal um esforço sistemático de definir políticas que enquadrem e definam o crime, que protejam a vítima, que adeqúem a intervenção e, sobre elas, produzir a consequente legislação.
De facto, a par do trabalho pioneiro das ONG, o Parlamento e o Governo acompanham o esforço colectivo europeu de combater o flagelo da violência doméstica de forma organizada, sistemática, institucional.
Revisões dos códigos, formação das polícias, construção progressiva de uma rede abrangente de casasabrigo e sua regulamentação, planos nacionais de luta contra a violência doméstica, planos nacionais de igualdade, são algumas das medidas adoptadas.
A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): — A Assembleia da República, em 2007, associou-se à campanha pan-europeia deliberada pelo Conselho da Europa de luta contra a violência sobre as mulheres, incluindo a violência doméstica, e à iniciativa da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, Parlamentos Unidos no Combate à Violência Doméstica. Através do Grupo de Trabalho sobre a Campanha contra a Violência Doméstica tem-se percorrido o País procurando boas práticas assim, como a identificação de estrangulamentos e limitações na concretização das alterações legislativas.
Contudo, Sr.as e Srs. Deputados, somos confrontados com números terríveis, que nos apresentam uma realidade de violência doméstica que persiste em aumentar apesar do que se tem caminhado e investido no seu combate. Aumenta em número de casos, aumenta em intensidade e aumenta, ainda, no seu alargamento a grupos cada vez mais jovens.
Sabe-se que uma parte do aumento das queixas registadas se deve ao trabalho desenvolvido junto dos mais variados grupos a quem se tem dado informação sobre a natureza do crime e as medidas de protecção.
Sabe-se que parte do aumento das situações conhecidas se deve a um maior esclarecimento das vítimas, a uma melhor preparação das polícias. Mas sabe-se também que há um aumento real da violência exercida, contrariando as expectativas dos impactos do aumento dos níveis educacionais, da crescente autonomia das mulheres face a uma generalizada participação no mercado de trabalho, das campanhas de informação, do gradual alargamento das redes de apoio.
De facto e apesar de uma progressiva e significativa melhoria das condições gerais de vida, não podemos deixar de registar que vulnerabilidades, assimetrias, exclusões persistentes, são responsáveis por uma violência que não cede, antes se acentua.
De facto e apesar de uma significativa e compreensiva evolução na feitura de leis que definem o crime, que prevêem a protecção da vítima, que punem o agressor, não podemos deixar de registar que a identificação das situações que configuram crime, a análise da vítima, continuam condicionados a preconceitos e estereotipias.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, tendo presente o primado dos direitos humanos dramaticamente posto em causa pelo número de vítimas de violência doméstica registado em 2008, propõe-se uma rigorosa avaliação da aplicação das leis, sobretudo das suas alterações mais recentes e dos seus resultados.
Neste sentido propomos que o Governo dê prioridade na próxima avaliação semestral a realizar pelo Observatório Permanente de Justiça Portuguesa, dirigido pelo Prof. Boaventura Sousa Santos, ao impacto da aplicação neste âmbito dos Códigos Penal e de Processo Penal, para dela poder retirar em tempo oportuno as devidas consequências.
Vozes do PS: — Muito bem!