2 DE NOVEMBRO DE 2012
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Se os objetivos não forem cumpridos ou for expectável o seu não cumprimento, serão adotadas medidas
adicionais.»
Ou seja, a vinculação substantiva do Estado português é para, exercício a exercício, atingir determinadas
metas financeiras, de consolidação e equilíbrio orçamentais, e não unicamente, nem sequer principalmente,
implementar um dado elenco de medidas. O regime do Memorando é claro: «Se os objetivos não forem
cumpridos ou for expectável o seu não cumprimento, serão adotadas medidas adicionais.» Este OE 2013
inscreve-se exatamente aqui e é o resultado da quinta avaliação trimestral do diálogo com a troica.
A segunda questão principal a ter presente é a de que o Memorando, com aquela exata redação e
orientação, foi negociado diretamente pelo governo PS, partido que não pode deixar de lembrar-se não só da
situação gravíssima a que conduziu o País mas também das obrigações internacionais que, na iminência da
explosão da bancarrota, fez Portugal contrair — e se mantêm. Este Memorando foi também endossado por
PSD e CDS-PP, partidos que, tendo assumido em coligação o Governo do País após as últimas eleições,
assumiram correlativamente a responsabilidade de darem execução e cumprirem o Memorando e suas
obrigações. E ainda que PCP e BE possam, porventura, não dar-se conta disso, a verdade é que o
Memorando também os limita e condiciona, porquanto contém obrigações externas do Estado português a que
ninguém pode eximir-se, integrando claras limitações da liberdade de disposição soberana.
Dito isto: pode falhar-se? Pode. Pode querer fugir-se? Pode. Pode querer violar-se e incumprir? Pode. Mas
tudo teria as suas consequências; e pesadas. A obrigação de cumprir existe e é para todos: primeiro, para
quem o negociou; depois, para quem o aceita e endossou; e, enfim, também para quem não o endossou.
Pode existir sempre — e manifestar-se — a tentação de fugir, não dar a cara, buscar popularidade fácil,
mesmo quando à custa da miséria alheia. Mas as obrigações contraídas são obrigações contratadas por todo
o País em contrapartida de um financiamento extraordinário de 78 000 milhões de euros que nos poupou — a
todos! — ao precipício imediato da bancarrota logo em junho de 2011.
A terceira questão principal a ter presente tem a ver com a música de fundo, em sinfonia de muitos violinos
e cornetas, e com a realidade simples e objetiva de um qualquer orçamento do Estado em qualquer ocasião e
conjuntura. Explico-me. Há a Sr.ª Lagarde e o sábio Blanchard, há o FMI, o BCE e a Comissão, há o PIB e
suas variadas percentagens para este ou aquele efeito analítico, há as grandes variáveis macroeconómicas
XPTO, há as recomendações, conselhos ou meros palpites de inúmeros comentadores e vários doutores
encartados ou de ocasião, há a intrincada crise do euro e todas as fragilidades e incertezas internacionais, há
mais isto e também aqueloutro, há tudo isso, sobre que apreciamos meditar, discutir e filosofar. Mas,
descendo à terra e à realidade do que temos de votar, este OE não deixa de ser o que é, a final de contas, um
qualquer orçamento do Estado: uma autorização de despesa e uma autorização de receita, ponto final.
Ora, das duas, uma: ou há propostas e condições para, nos seus fundamentais, se autorizar uma despesa
e uma receita muito diferentes das que constam da proposta do Governo, ou toda a contradita é retórica
inconsequente, demagogia barata e enganosa.
Como vimos no debate, é assim que efetivamente acontece: nos seus fundamentais, a proposta de OE
2013 não conheceu qualquer alternativa, nem tem sensível margem de manobra, de tão estreito ser o
desfiladeiro em que o País foi — e está — entalado.
E a quarta questão principal a ter presente tem a ver com a focagem naquilo que efetivamente limita, senão
destrói, a nossa liberdade de decidir.
A este respeito, tem-se falado demasiado da troica. Mas não é a troica que limita a nossa liberdade. O que
nos limita a liberdade e a capacidade de decisão soberana é a terrível dívida colossal que fomos acumulando,
atingindo já quase 120% do PIB, bem como ipso facto a incapacidade de nos financiarmos livre e
suficientemente nos mercados.
A dívida pública era já de 86 000 milhões de euros em 2004, o que, atentos os critérios de Maastricht, em
cima dos 60% do PIB, impunha imediatamente «travões às quatro rodas e inversão de marcha». Mas os
governos PS não curaram do problema e, em seis anos apenas, a mesma dívida pública disparou para o
dobro, atingindo os 185 000 milhões de euros em 2011 e ultrapassando, largo, os 100% do PIB.
Quando em abril/maio de 2011 tivemos de chamar a troica para nos socorrer da bancarrota, confessámos a
falta de liberdade e fizemos Portugal reconhecer aquela incapacidade de se prover a si próprio que é inerente
a todos os insolventes, sejam indivíduos ou Estados. O que essa situação afixou, no culminar de uma penosa
degradação – primeiro, de fuga em frente em fuga em frente; depois, de PEC em PEC, numa contínua