I SÉRIE — NÚMERO 19
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derrapagem decadente pontuada pelas agências de rating — é o mesmo, afinal, que encontramos, por aí,
afixado nos estabelecimentos populares do País: «Queres fiado? Toma!»
Importa tê-lo bem presente, para não nos enganarmos na realidade à boleia dos discursos anti-troica e na
irresponsabilidade que sobrevive e resiste.
A troica podia ir-se embora que o nosso problema permaneceria, inescapável — e ficaria pior. O nosso
problema efetivo é a dívida. Se rompêssemos com a assistência da troica, ficaríamos com o problema real da
dívida em carne viva, tendo não só que fazer a consolidação orçamental a frio (como nos aconteceu), mas que
agir completamente às cegas e à bruta no estoiro da falência e sob a penúria total da bancarrota. A nossa ira
— e, mais do que a ira, a nossa memória futura — deve ser dirigida contra a dívida, pois é esta que nos
afundou e estrangula. A troica é o que ainda nos permite navegar, embora com rota balizada.
Os «bons» e os «maus» orçamentos.
Comecei por dizer que este é um «mau orçamento». E, na verdade, é assim. Um Orçamento do Estado
que agrava a carga fiscal como este faz é um mau orçamento. Um Orçamento do Estado que, como com
verdade e coragem afirmou o Ministro das Finanças, contém um «enorme aumento de impostos», é um mau
orçamento. Um Orçamento de Estado em que a nossa margem de decisão fundamental é já nula não pode
deixar de considerar-se um mau orçamento. É um Orçamento do Estado a que fomos condenados.
Assim, as questões que importa examinar quanto a aprovar um mau orçamento como este são as
seguintes: É este OE um mal menor? Isto é, as eventuais alternativas a este OE são todas piores? É este OE
um OE necessário? Inscreve-se este OE na rota de saída de Portugal do buraco em que foi metido e ainda
está?
Percorrendo com seriedade e em consciência estas questões, as respostas são todas afirmativas. Sim, o
OE 2013 é um mal menor. Sim, as alternativas a este OE 2013 são todas piores. Sim, este OE 2013 é um OE
necessário. Sim, este OE 2013 inscreve-se na rota de saída de Portugal do buraco em que foi metido e ainda
está.
O que é um «bom orçamento», nos usos nacionais? Um «bom orçamento» é um Orçamento do Estado
com muita despesa pública, um fartote de despesa, uma festa de despesa. É um OE com muitas
transferências e benefícios, com aumentos salariais a rodos, com novas regalias e apoios sociais, com muita
«obra». É um OE com muitas estradas e novas pontes, com TGV dê por onde der, com aeroportos mesmo
que sem aviões, com novas autoestradas mesmo que sem carros, com muitos edifícios novos não curando
sequer dos custos de manutenção. Ah, e é um OE também com transferências à discrição para a Região
Autónoma da Madeira.
Na vertigem febril do dito «investimento público» dos governos socialistas de José Sócrates — TGV, novo
aeroporto de Lisboa, terceira autoestrada Lisboa-Porto — cheguei a esperar que, em razão das alterações
climáticas, do aquecimento global e da esperada subida do nível dos oceanos, viesse a ser anunciada a
construção do porto de águas profundas de Portalegre, pronto para quando o Atlântico, galgando a lezíria, as
planícies e as terras baixas, só parasse na Serra de S. Mamede. Os orçamentos que pagassem mais essa
visão de rasgo e génio seriam «muito bons orçamentos», ao serviço da crendice arreigada do socialismo
circunstante: «bom para a economia é o Estado gastar, gastar, gastar, gastar sempre mais».
Ao fim de anos a fio assim, décadas de orçamentos desses, depois de orçamentos em que acumulámos
défice atrás de défice, empacotámos tudo numa dívida gigantesca e chegámos ao ponto em que... «era bom,
mas acabou-se». Alienámos por inteiro a liberdade de decidir mais despesa, porque comprometemos
totalmente a nossa capacidade de a financiar. E a única liberdade que realmente mantemos quanto à despesa
pública é para a cortar ainda mais do que, no maior esforço de sempre, os 11 000 milhões de euros já
cortados nestes dois anos — tarefa e imperativo, porém, que, em termos relevantes, não é para já possível
antes de significativas reformas na estrutura e funções do Estado.
Olhando agora ao lado da receita, o que é um «bom orçamento»? Um bom orçamento é um OE com baixa
carga tributária, um OE que não penalize a economia, que nos deixe crescer e alivie o fardo desta economia
«pés-de-chumbo», que não castigue as famílias e as empresas, que não puna a poupança e não desincentive
o investimento.
Há já alguns anos que não temos orçamentos assim. E, infelizmente, não estamos, para já, em situação de
os podermos ter. A febre da despesa pública e o aumento sucessivo dos encargos do Estado levaram a
carregar crescentemente as receitas fiscais e parafiscais. O próprio combate à fraude e evasão fiscal, apesar