12 DE SETEMBRO DE 2014
25
Afirmou aqui a Sr.ª Ministra da Justiça que os juízes nem queriam ouvir falar em adiar a entrada em vigor
da reforma. Afinal, estava a mentir. Sabemos agora que a Associação Sindical dos Juízes propôs uma entrada
em vigor faseada a que a Sr.ª Ministra não deu ouvidos.
O que se está a passar nos tribunais neste mês de setembro de 2014 é uma vergonha nacional. O Governo
encerra 20 tribunais e transforma outros 24 em meras extensões, mas, ao mesmo tempo, põe tribunais a
funcionar em contentores sem um mínimo de condições de dignidade para o exercício da função judicial. Para
o Governo, a reforma era inadiável, mas não houve o cuidado de garantir as instalações necessárias para que
os tribunais pudessem funcionar.
O triste espetáculo a que o País tem assistido incrédulo desde o início deste mês de setembro é o de ver
milhares de processos judiciais a serem transportados de um lado para o outro em camionetas de caixa
aberta, carregados às costas por militares, por funcionários autárquicos ou por trabalhadores de empresas
privadas.
O Governo reconhece que faltam nos tribunais mais de 900 funcionários para que o sistema possa
funcionar em termos minimamente adequados e afirma o compromisso de resolver o problema, mas não
resolve. A Ministra da Justiça culpa a Ministra das Finanças, a Ministra das Finanças não faz caso e os
tribunais continuam sem funcionários.
O que se está a passar com o sistema informático dos tribunais assume foros de escândalo. Quando se
verificou, logo no primeiro dia, que o sistema Citius não estava a funcionar, a Sr.ª Ministra veio minimizar o
problema, dizendo que a situação era normalíssima, que as grandes mudanças trazem sempre pequenos
problemas e que em algumas horas tudo estaria resolvido e em boa ordem.
Porém, alguns dias passados, foi o próprio Ministério que veio declarar o Citius em estado de sítio e pedir
aos operadores judiciários que, pela sua rica saúde, não usassem o sistema. Só o DIAP de Lisboa parece ter
escapado ao descalabro pela simples razão de que nunca confiou no Citius e se manteve fiel aos velhos
métodos do século XX.
Ontem mesmo, ficámos a saber pela comunicação social que a Ministra da Justiça sabia há mais de dois
anos, desde junho de 2012, que o sistema Citius entraria em colapso com a reorganização do mapa judiciário.
E ficámos também a saber que a Sr.ª Ministra ignorou todos os avisos e nem sequer deu resposta à carta que
recebeu da equipa que criou o sistema, que alertava para os problemas que poderiam surgir e que continha
sugestões para a sua resolução.
O que diz agora a isto a Sr.ª Ministra de Justiça? Rigorosamente nada! O sistema colapsou e a Ministra
parece ter colapsado com ele. Os tribunais estão parados, os funcionários e os magistrados não podem
trabalhar, os processos atrasam-se, surgem problemas gravíssimos relacionados com o decurso de prazos
judiciais e não sabemos se a Ministra da Justiça meteu férias ou se está barricada no Terreiro do Paço.
A situação caótica em que os tribunais se encontram por responsabilidade do Governo não prejudica os
magistrados e os funcionários judiciais, prejudica os cidadãos, prejudica o acesso à justiça, prejudica o normal
funcionamento do Estado e da sociedade.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O mapa judiciário suscita questões de fundo, independentemente das
tristes circunstâncias da sua entrada em vigor. As razões de discordância do PCP, dos advogados, dos
autarcas e das populações com o mapa judiciário estão para além dessas circunstâncias. Este mapa judiciário
prejudica gravemente o direito de acesso à justiça por parte das populações. A justiça fica mais longe e mais
cara.
Por isso, o PCP não desiste das suas propostas de alteração a este mapa e, com esse propósito,
apresentou já um projeto de lei cuja apreciação ocorrerá aqui no próximo dia 25.
Sucede, porém, que o estado em que os tribunais se encontram, por via da insensata imposição da entrada
em vigor do mapa judiciário em 1 de setembro de 2014, exige um sério apuramento de responsabilidades a
que a Sr.ª Ministra da Justiça não se pode eximir. Neste sentido, o Grupo Parlamentar do PCP acabou de
requerer a realização urgente de uma reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades
e Garantias, com a presença da Ministra da Justiça, para apuramento das responsabilidades pelo descalabro