5 DE MARÇO DE 2015
21
que, do nosso ponto de vista, deveria merecer uma discussão aprofundada, pelo menos quanto à sua
densificação.
Relativamente à lei de estrangeiros, também temos um problema que, diria, é relativamente próximo deste,
na medida em que, atualmente, se recusa o visto a alguém que seja uma ameaça grave para a ordem pública,
segurança pública ou saúde pública, e o que se propõe, agora, é que possa ser negado o visto a quem
constitua não apenas uma ameaça mas, sim, um perigo ou ameaça. Teremos de procurar saber exatamente o
que é que isto significa: a ameaça não é um perigo? O perigo não é uma ameaça? Qual é o sentido da
utilização dos dois termos?
E é um perigo ou ameaça já não apenas para a ordem pública, segurança pública ou saúde pública mas
também para a defesa nacional. Ou seja, está a introduzir-se aqui não apenas critérios de segurança pública,
de ordem pública, mas também de defesa nacional.
Diria que estamos um pouco a querer americanizar a nossa legislação. É que, no quadro constitucional
português, há uma diferença entre as funções de defesa nacional, que são realizadas fundamentalmente pelas
Forças Armadas, e as funções de segurança interna, que estão a cargo das forças de segurança. E há aqui
um problema, que é o de saber qual é o papel que as autoridades judiciárias têm de ter, ou não, nesta matéria,
porque as chefias militares não estão subordinadas, nem orgânica nem funcionalmente, às autoridades
judiciárias.
Portanto, há que ter cuidado na forma como se faz a fusão entre a segurança e a defesa nacional. E isto,
aqui, do nosso ponto de vista, não está suficientemente acautelado, e deveria estar, porque estamos aqui a
querer americanizar a legislação portuguesa contra aquilo que é o nosso quadro constitucional.
Estas são algumas objeções sérias que temos a algumas das propostas que são feitas, mas, naturalmente,
teremos toda a disponibilidade e todo o empenho em discutir a matéria. Aliás, no âmbito deste processo
legislativo, há entidades que ainda não se pronunciaram, nomeadamente o Conselho Superior da
Magistratura. Já temos o parecer do Conselho Superior do Ministério Público, mas não temos ainda os
pareceres do Conselho Superior da Magistratura ou da Ordem dos Advogados. Ou seja, há entidades que
importa ouvir relativamente a esta matéria, e isso deve ser feito precisamente para evitar que, mais uma vez,
devido à comoção criada por um hediondo atentado terrorista que todos temos de condenar, haja derivas
securitárias e se ponham em causa princípios basilares do nosso ordenamento jurídico-constitucional.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por referir que
Os Verdes acompanham o Governo na necessidade de encontrar medidas de combate ao terrorismo. Temos,
portanto, uma concordância de princípio quanto aos objetivos, desde que esse combate seja feito sem colocar
em causa direitos, liberdades e garantais dos cidadãos. Este é o nosso limite.
Sobre as propostas do Governo, as mesmas assentam, por um lado, no ajustamento da ordem jurídica e
na compatibilização de leis já existentes e, por outro, em propostas igualmente sobre matérias sensíveis mas
com alterações mais profundas e mais substantivas, que devem ser abordadas com mais cautela e com mais
reflexão, porque podem chocar com outros princípios, como é o caso das alterações propostas à lei da
nacionalidade ou à lei da imigração, com novas restrições, tanto num caso como no outro.
Na lei da imigração, prevê-se, por exemplo, limitar as autorizações de residência ou alargar a pena
acessória de expulsão, o que representa obviamente um retrocesso, do ponto de vista da nossa civilização, e
cuja eficácia é, a todos os títulos, duvidosa.
Já quanto às alterações à lei da nacionalidade, temos fundadas dúvidas sobre a constitucionalidade desta
proposta. De facto, a criação de requisitos negativos de aquisição da nacionalidade, cujos fundamentos
assentam em conceitos abertos e abstratos, como aqueles que constam da proposta de lei, ainda por cima
para serem apreciados por uma entidade de natureza administrativa e sem qualquer intervenção judicial como
garantia de defesa de direitos fundamentais, parece-nos de duvidosa constitucionalidade.
É que, quando falamos de perigo ou ameaça para a segurança ou a defesa nacional, estamos a reportar-
nos a conceitos não diria indeterminados mas abertos e abstratos.