I SÉRIE — NÚMERO 61
30
Por outro lado, também, as multinacionais querem ganhar terreno também nos Estados-membros da União
Europeia para aumentarem o seu negócio, para fabricarem o seu lucro, e a União Europeia tem cedido aos
apetites dessas multinacionais. Veja-se, por exemplo, a questão da rotulagem que, para nós, é bem
demonstrativa desta cedência quando se determinou, por exemplo, que os produtos que contêm menos de
0,9% de transgénicos não tenham obrigatoriedade de informação por via da rotulagem ao consumidor. Isto é
absolutamente inadmissível.
Mas enquanto alguns Estados-membros da União Europeia proibiam o cultivo de transgénicos no seu
espaço geográfico, como, por exemplo, a Alemanha, a França, a Polónia e outros países, Portugal achava, por
via de diversas maiorias parlamentares do PSD, do CDS e do PS, que na União Europeia é que se decidia e
que nós, cá, acatávamos as decisões relativamente à matéria dos transgénicos.
Ocorre que, Sr.as
e Srs. Deputados, na União Europeia determinou-se agora que essa questão da decisão
sobre o cultivo de transgénicos passa para a «competência» (entre aspas) dos Estados-membros. Ou seja, a
partir de agora, são os Estados-membros que decidem se permitem ou não o cultivo no seu espaço
geográfico.
Portanto, há uma alteração, uma novidade que, de resto, vai contra um dos fortes argumentos que as
diversas maiorias parlamentares usavam nesta Câmara. Por isso, Os Verdes entendem que é tempo de
rediscutir a questão com esta nova realidade, apelando aos grupos parlamentares que aprovem o projeto que
Os Verdes apresentam para que o possamos discutir em sede de especialidade.
O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: Vou referir-me à intervenção
do Bloco de Esquerda, proferida na semana passada, relacionada com esta questão dos organismos
geneticamente modificados (OGM) e da nova realidade europeia, aqui já aludida.
No âmbito da União Europeia, pode haver aceitação por parte da agência e da autoridade ambiental, mas a
autorização para o cultivo ou para a comercialização de OGM compete a cada Estado-membro. Nesse aspeto,
a União Europeia acabou por lavar as mãos, até porque a esmagadora maioria dos Estados-membros da
União Europeia não queriam a comercialização e o cultivo de OGM, de transgénicos. Porquê? Porque as
pressões da opinião pública são muito fortes acerca de não estar garantido o princípio da precaução para a
manutenção da biodiversidade e para as consequências que isso possa ter na saúde pública. Portanto, só em
cinco Estados-membros é que há esta realidade dos OGM, de entre os quais Portugal.
Curiosamente, nesse debate a direita entendeu não falar, e é com espanto que no dia a seguir a essa
intervenção, reparo numa resolução do Conselho de Ministros que já definiu a legislação para os OGM em
Portugal, a qual, presumo, esteja neste momento em Belém para promulgação.
Portanto, tenho um pedido para fazer encarecidamente aos Srs. Deputados do PSD e do CDS: digam-nos
o que é que o Governo terá aprovado sobre OGM. Estão aqui hoje em discussão várias iniciativas de grupos
parlamentares da oposição, mas gostaríamos de saber qual é, afinal, a posição dos partidos que suportam o
Governo e quais as grandes linhas que o Governo terá aprovado em Conselho de Ministros, o que poderia
enriquecer o nosso debate.
A circunstância é a de apelar para que, em Portugal, se respeite o princípio da precaução. Será que os Srs.
Deputados da maioria, que dizem vir a autorizar a manutenção do milho transgénico em Portugal ou,
eventualmente, a abrir a porta a outro tipo de organismos geneticamente modificados, têm garantias, do ponto
de vista científico, de que está a ser preenchido o princípio da precaução? Têm garantias que, do ponto de
vista económico, há alguma mais-valia no plantio do milho transgénico? Têm uma opinião fundamentada —
que não seja a dos que trabalham com a Monsanto ou com outras multinacionais da indústria agroquímica —
de que pode e deve ser cultivada e comercializada em Portugal essa realidade dos transgénicos? Nós cremos
que não, mas o debate será este.
Na nossa opinião, o debate não deveria ser como tem sido até agora, mas sobre tentar observar o princípio
da precaução, uma moratória ou uma suspensão ou a proibição e, depois, tentar tirar algumas conclusões,
fazer uma avaliação… Mas não, cultiva-se porque sim, não há argumento, não há fundamento científico, não
há prova e, não havendo prova, deve agir-se a favor da saúde pública e do ecossistema e não ao contrário.
Portanto, este tem sido o debate.