I SÉRIE — NÚMERO 107
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encontram hoje a ser explorados por rendeiros, foram expropriados, tendo o Estado pago indemnizações, o
que os tornou propriedade do Estado português. Agora, esquecendo isto, o Governo, depois de tentar expulsar
rendeiros, a quem o Estado entregou aquelas terras para combater a reforma agrária, quer entregar património
público a quem já recebeu pela venda do mesmo ao património.
Com todo este enquadramento, o Grupo Parlamentar do PCP não poderia apoiar esta legislação e é essa a
razão que justifica o voto contra os diversos projetos.
O Deputado do PCP, João Ramos.
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Relativa ao texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias, sobre a proposta de lei n.º 305/XII (4.ª):
A proposta de lei em apreço (que os signatários reputam de necessária quanto os bens jurídicos supremos
a defender, inovadora, louvável nos seus desígnios, complexa, ainda, no ponto em que se intersectam e
convergem distintas ordens jurídicas e a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos), inscreve-
se numa área de ação política particularmente exigente, maxime, na compatibilização da garantias e dos
direitos fundamentais e a sua harmónica conformação com o Direito Europeu prevalente.
Se, por um lado, o valor irrecusável e infrangível da proteção e promoção dos direitos da criança,
considerada como referencial supremo e bem estelante da comunidade e da humanidade, reclama a defesa
do seu «superior interesse», por outro lado, não pode, desde logo, ser desconsiderado o quadro normativo
plasmado nos n.os
4 e 5 do artigo 30.º da nossa Lei Fundamental.
Primafacie, é, pois, na compatibilização entre o preceituado no artigo 69.º da Constituição da República
Portuguesa — onde se garante às crianças o direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu
desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de
opressão, contra o exercício abusivo da autoridade e ainda na assunção do dever estadual de assegurar uma
especial proteção às crianças vítimas de abusos sexuais — e as garantias constitucionais, insertas nas
normas constitucionais supracitadas, de que nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de
quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos, e bem assim a garantia de que os condenados a quem
sejam aplicadas ou não penas ou medidas de segurança privativas da liberdade mantêm a titularidade dos
direitos fundamentais, salvas as limitações inerentes ao sentido da condenação e às exigências próprias da
respetiva execução, que a questão parece dever ser equacionada. E, decerto, ponderada ainda à luz do
disposto nos n.os
2 e 3 do artigo 18.º da Lei Fundamental, onde se dispõe que a lei só pode restringir os
direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições
limitar-se ao necessário para salvaguardar os outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos,
tendo-se sempre presente que as leis restritivas de direitos liberdades e garantias não podem diminuir a
extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
Este quadro normativo referencial não poderá ser considerado nem no puro plano da sua estanquicidade,
nem ausente da perspetiva dinâmica, nem ainda da imbricação de ordens jurídicas (e do fenómeno da sua
prevalência) em que a portuguesa se integra e que a complementam.
Para além das penas privativas da liberdade, a Constituição da República Portuguesa não define quais
poderão ser as outras penas, ou seja, quais os direitos, bens ou valores cuja perda ou restrição poderão
constituir uma pena. Afora o limite negativo constante do n.º 4 inserto no artigo 30.º da CRP, não se antolham
outros limites quanto ao objeto das penas e medidas de segurança.
Existe, assim, no campo legislativo — e também no domínio do exercício da competência política do
Governo, quanto à adoção de iniciativas de natureza legislativa — vasta área de discricionariedade legislativa
no domínio de definição de penas, a título principal ou acessório. A sua definição e caracterização constam
primacialmente do Código Penal.
A questão merecedora de ponderação é, pois, a de saber se as limitações inerentes à própria pena, nos
casos compreendidos no âmbito da proposta de lei, e as exigências dos princípios da necessidade e da
adequação, refletidas no sistema de registo de identificação criminal de condenados pela prática de crimes
contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual de menor, se mostram justificadas pela própria