1 DE OUTUBRO DE 2016
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O clima está a mudar e mudará ainda mais nos próximos anos em resultado dos erros do nosso modelo de
desenvolvimento assente na economia do fogo.
Não tenhamos dúvidas, um dia seremos julgados pelas próximas gerações e teremos de responder à questão
fulcral da ética do futuro: com a informação de que dispúnhamos fizemos o que era necessário para impedir o
desastre ou, por comodismo, adiámos, transigimos e hesitámos?
Este é o tempo da liderança e esta geração tem de estar à altura das suas responsabilidades.
Nos mais de 20 anos que venho dedicando à área das alterações climáticas e do desenvolvimento
sustentável, deparei-me, por esse mundo fora, com ignorância, cinismo e egoísmo na forma de lidar com o tema
das alterações climáticas. Muitos, ignorando a ciência, apesar das evidências; outros, confiando que a tecnologia
a seu tempo tudo resolveria; muitos pensando mais na próxima eleição do que na próxima geração; outros
sofrendo, aqui e noutros países, ainda de uma maleita maior — a hipocrisia climática. Fazem juras de fé na
defesa do ambiente e no combate às alterações climáticas, mas, na prática, não querem energias renováveis,
porque são caras, não querem a fiscalidade verde, porque é impopular, não querem promover a mobilidade
elétrica, porque é burguesa, não aceitam o sistema europeu de comércio de emissões, um poderoso mecanismo
de cobertura de 50% das emissões europeias, porque assenta no modelo social de mercado.
Nestes 20 anos, vimos de tudo, mas, hoje, tudo terá de mudar. É da mudança de mentalidades, e não apenas
de tecnologia, que depende a nossa capacidade para vencer este desafio.
Hoje, as responsabilidades são ainda maiores e nenhum pretexto ou preconceito é justificável. Já não há
disputa sobre a base científica das alterações climáticas, já não há disputa quanto às consequências e custos
da inação, já não há dúvidas quanto aos benefícios económicos e de geração de emprego associados à
descarbonização, ao crescimento verde e à verdadeira revolução energética em curso, hoje, todos dispomos de
toda a informação de que necessitamos para agir.
O combate às alterações climáticas é urgente, mas esse combate está totalmente ao nosso alcance e será
economicamente vantajoso.
Vinte anos depois de Quioto, tenho uma enorme esperança, os tempos da ignorância e do ceticismo já lá
vão. Estamos unidos!
É neste contexto que vale a pena sublinhar a importância histórica do Acordo de Paris, que, hoje,
ratificaremos.
Este é um acordo abrangente, inclusivo e ambicioso, sendo verdade que não é tão detalhado quanto
gostaríamos e tão ambicioso como necessitaríamos, dado que as metas fixadas são insuficientes para atingir o
objetivo de 1,5º, face ao período pré-industrial. O Acordo de Paris é, ainda assim, suficientemente abrangente,
robusto e estratégico para que lhe possa ser conferida maior ambição nas próximas rondas negociais e nas
avaliações periódicas previstas de cinco em cinco anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agora é tempo de levar o Acordo de Paris à prática e de fazer opções.
Construir em cima do que já fizemos e não cair na ratoeira de, por mero revanchismo e ressentimento, reverter
ou destruir.
O legado do anterior Governo é conhecido, conhecido por nós e por aqueles que nos observam do exterior
e que são nossos parceiros.
Os resultados são eloquentes e só a cegueira ideológica o não vislumbra: no reforço das energias renováveis,
que passaram de 45% para 62% em apenas quatro anos; no corte de 4000 milhões de euros nas rendas
excessivas; na dinamização do autoconsumo de energia; na redução da dependência energética para o valor
mais baixo dos últimos 20 anos; nos incentivos à mobilidade elétrica e na tributação de carbono; no acordo
histórico para o reforço das interligações; no reforço do investimento verde, atingindo 5000 milhões de euros até
2020. Deixámos aprovadas metas ambiciosas para 2030 nas energias renováveis, no CO2 e na eficiência
energética.
Logo, vale a pena perguntar: o que têm feito o atual Governo e a coligação das esquerdas para colocar em
prática o acordo que já foi aprovado há um ano? Nada! Pior ainda: fizeram-nos retroceder. Já não bastavam as
reversões na área do arrendamento urbano e das águas e também na área de clima e energia, onde se tem
assistido a um surpreendente retrocesso. Isso está patente na deliberada inação no processo de implementação
das interligações energéticas entre Portugal, Espanha e França, que nos permitiriam exportar eletricidade
renovável para a Europa.