I SÉRIE — NÚMERO 58
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Aqui, passa-se de uma regulação em que há uma decisão que, no caso da interdição, é tendencialmente
definitiva ou que, no caso da inabilitação, por vezes até é limitativa de direitos da própria pessoa e é imposta
pela situação concreta em que ela se colocou, designadamente de prodigalidade, como refere ainda o Código
Civil, isto é, passa-se de situações em que há uma decisão judicial, a decisão está tomada, tem consequências
e, depois, o tribunal desliga-se dessa realidade — não tem de ligar, não tem de acompanhar — para uma
regulação em que aquilo que se pretende é diferente.
Prevê-se, agora, que haja decisões que têm de ter um seguimento, têm de ter um acompanhamento, para
se verificar se elas têm ou não de ser alteradas. Isso exige, de facto, que haja toda uma estrutura de
acompanhamento que neste momento não existe e a questão que colocaria é se esta matéria está a ser
equacionada e como é que o Governo prevê que uma decisão jurídica, uma decisão legislativa tão importante
como esta, tenha a retaguarda necessária para poder ser, efetivamente, eficaz e conduzir aos efeitos desejados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito obrigada pelas questões que me
colocaram e que são indiscutivelmente da maior relevância. Não podemos criar institutos e depois não ter formas
de os operacionalizar.
É importante ressaltar aqui duas coisas. Em primeiro lugar, a inabilitação era muito pouco usada. Nos últimos
anos, por referência a dois anos, praticamente temos 100 casos. Na sociedade portuguesa, 100 casos é
absolutamente insignificante e não faz nenhum sentido. Em segundo lugar, na interdição também tínhamos
problemas porque não conseguíamos constituir o conselho de família.
Com esta medida damos um passo, e acho que damos um passo de gigante, relativamente às necessidades
de muitos cidadãos portugueses.
As questões relacionadas com os mecanismos de acompanhamento não foram por nós descuradas. Em
outubro, o Governo aprovou um mecanismo de apoio à vida independente, que é um primeiro mecanismo que
visa justamente criar estruturas ao nível da segurança social que permitam complementar a dimensão do apoio
que aqui se vai tornar necessário.
É indiscutível que, no que diz respeito à decisão judicial, confiamos inteiramente na prudência dos juízes e
na prudência do Ministério Público e, portanto, o convencimento que temos é que o mecanismo vai permitir
alargar isto ao maior número possível de pessoas e identificar, ao nível da sociedade civil, também, as estruturas
que possam fazer este acompanhamento, mas o Governo não só criou já este mecanismo de apoio à vida
independente como está disponível para aprofundar os mecanismos no sentido de que esta reforma venha a
ser uma reforma exitosa.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, a proposta que apresentamos hoje, aqui, interfere, como
sabem, com uma realidade que afeta milhares de cidadãos portugueses, milhares de cidadãos que não têm
formas institucionais de expressar a sua vontade e que, em muitos casos, não conseguem fazer com que ela
seja respeitada no momento futuro, no momento em que têm a capacidade diminuída. É que isto, hoje, permite-
nos também um mandato com vista à incapacidade, permite a uma pessoa sã, no pressuposto de que pode
perder capacidades, instituir um mandato e esse mandato ser conhecido pelo tribunal e respeitado pelo tribunal,
se assim for entendido, em situação de incapacidade.
Aquilo que lhes peço, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, é que sejam intérpretes da vontade desses cidadãos
que não têm voz, confiando eu que encontrarão a melhor resposta, uma vez que têm aqui uma base que é, do
ponto de vista do Governo, a melhor base possível para iniciarem este trabalho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.