I SÉRIE — NÚMERO 58
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por não ser feita a partilha da herança ou por excederem a parte de que o autor da herança podia dispor, e, por
outro lado, consagrando a regra de que aqueles podem exigir alimentos da herança. Está sobretudo aqui em
causa a proteção da pessoa com deficiência que não possa prover sozinha ao seu sustento e que, por isso
mesmo, fica tantas e tantas vezes dependente de pessoas que estão pouco preocupadas com a sua sorte ou
com o seu destino.
Agora, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, já não colhe o argumento da revisão do Código Civil, ainda que
muito parcial é verdade. Por isso, deixo aqui uma pergunta: que desculpa arranjarão agora as Sr.as Deputadas
e os Srs. Deputados para chumbar estas propostas do CDS? Espero que, desta vez, não se deixem toldar pelo
preconceito em função do proponente.
Se o fizerem, ficará esse ónus com os senhores. Ao CDS não restará outra alternativa senão não desistir e
insistir. É para isso, de resto, que cá estamos. Habituem-se, como diria alguém por quem sei nutrirem respeito
e afeição.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Falcato.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Sr. Presidente Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: A igualdade perante
a lei é um princípio básico da proteção dos direitos humanos.
O reconhecimento legal das decisões tomadas pelo indivíduo está no cerne de uma abordagem à deficiência
ou incapacidade baseada nos direitos humanos e sustenta o exercício de inúmeros outros direitos.
O direito ao igual reconhecimento como pessoa perante a lei implica que a capacidade jurídica é um atributo
universal inerente a todas as pessoas, decorrente da sua condição humana e deve ser mantida para as pessoas
com deficiência em igualdade de condições com as demais.
O artigo 12.º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência afirma que todas as pessoas
com deficiência têm plena capacidade jurídica.
Esta capacidade tem sido negada pelo regime de interdição e inabilitação existente até agora em Portugal,
afetando de forma direta e indireta a capacidade de gozo e de exercício de direitos fundamentais por algumas
pessoas com deficiência ou incapacidade.
Por isso saudamos a iniciativa do Governo de apresentar uma proposta de lei que irá acabar com este
sistema iníquo.
Já em 11 de abril de 2016, o Comité dos Direitos das Pessoas com Deficiência, das Nações Unidas, tinha
solicitado ao Estado português a adoção das «medidas apropriadas para que todas as pessoas com deficiência
que tenham sido privadas da sua capacidade jurídica possam exercer todos os direitos consagrados na
Convenção, incluindo o direito ao voto, ao matrimónio, a constituir família e a gerir bens e propriedades» O
Comité recomendou ainda «a revogação dos regimes existentes de tutela total e parcial, os quais eliminam ou
limitam a capacidade jurídica da pessoa, e a criação de sistemas de apoio à tomada de decisão, que permitam
e promovam o exercício efetivo dos direitos das pessoas com deficiência», conforme o artigo 12.º da Convenção.
É, de facto, fundamental garantir que as condições de deficiência, a existência de uma incapacidade ou a
necessidade de apoio não constituam motivos para a retirada da capacidade jurídica ou do exercício de qualquer
dos direitos mencionados no artigo 12.º.
É necessário que seja clara a distinção dos conceitos de capacidade jurídica e capacidade mental. A
capacidade jurídica é inalienável, já a capacidade de tomar decisões é variável de indivíduo para indivíduo e
está dependente de inúmeros fatores, incluindo fatores ambientais e/ou sociais, podendo ser necessário apoio
para esta tomada de decisão.
Não será agora o momento para discutir as falhas que consideramos ter a proposta de lei apresentada.
Estamos convictos que será possível corrigi-las no processo de discussão na especialidade. Mas é altura para
destacar um especto que consideramos fundamental para o sucesso desta lei: o apoio à decisão. A proposta de
resolução que apresentamos é um passo no sentido de garantir que, na aplicação da futura legislação, existirão
as condições e os recursos necessários ao funcionamento de um verdadeiro sistema de apoio à decisão, sistema
que consideramos não só imprescindível, porque há que garantir a vontade e os direitos das pessoas com