29 DE SETEMBRO DE 2018
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, ainda, a palavra, o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado, Srs.
Deputados: Gostaria de fazer algumas observações acerca desta proposta de lei.
A primeira observação é relativa à primeira das normas que estamos a apreciar, a da criminalização do treino
para o exercício de atividades terroristas. Não temos nada contra, obviamente, embora nos pareça que se está
a criar, no âmbito da União Europeia, uma espécie de ordem jurídica paralela, ou seja, cria-se uma ordem jurídica
para penalizar vários crimes, os mais diversos, contra as pessoas, etc., e depois cria-se uma ordem jurídica à
parte, com uma certa marca do terrorismo. Eu pergunto se o que está aqui previsto, relativamente ao terrorismo,
não é aplicável a outras formas de criminalidade. Certamente que é!
A legislação penaliza o treino, instrução ou conhecimentos sobre o fabrico ou a utilização de explosivos,
armas de fogo ou outras armas e substâncias nocivas ou perigosas. Ora bem, eu pergunto: se estas atividades
forem desenvolvidas não para as chamadas «atividades terroristas» mas, por exemplo, para rebentar com
caixas Multibanco, não são penalizadas? Certamente que são!
Portanto, creio que se começa a criar uma espécie de marca especificamente relacionada com o terrorismo
quando, em relação a este tipo de atividades, obviamente tem de haver punição no que se refere ao terrorismo,
mas também a atividades criminosas, que também são socialmente nocivas. Mas, como é óbvio, não objetamos
a que quem ministra treino para a prática de atividades terroristas seja penalizado.
A outra questão remete-nos para um outro problema, o do financiamento. Temos apoiado as iniciativas
legislativas que visam combater o financiamento do terrorismo e de outras atividades ilícitas. O combate ao
branqueamento de capitais não tem que ver apenas com a possibilidade de financiamento de organizações
terroristas, mas também com o financiamento de outras atividades criminais, como é evidente. E aquilo que eu
disse antes também se aplica neste caso.
Por outro lado, a parte final, a última disposição que é proposta — e o Sr. Deputado José Manuel Pureza há
pouco chamou a atenção para este ponto — remete-nos para um outro problema, o dos rótulos, ou seja, quem
é que a União Europeia considera que tem o rótulo de organização terrorista. E nós sabemos que os rótulos
variam com o tempo.
Mais: também sabemos que há uma imensa dualidade de critérios ao nível da União Europeia sobre quem é
terrorista e quem não é. Basta que a União Europeia atribua o rótulo «moderados» a organizações terroristas
que cometem as maiores atrocidades — e a Síria dá-nos exemplos flagrantes disto mesmo — e então, aí, já
não são organizações terroristas, são organizações moderadas, que a União Europeia apoia, financeira e
mediaticamente, nas suas campanhas e que também treinam para cometer atentados terroristas na Europa.
Pergunto se organizações como a chamada Frente Al-Nusra, que teve, e tem, o apoio da União Europeia
para combater na Síria, para combater o povo sírio, são também consideradas organizações terroristas.
Certamente que para a União Europeia não o são, porque até a apoia por todos os meios ao seu alcance.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.
O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo que, como é óbvio, era importante uma
armadura legislativa de combate ao terrorismo, mas também era importante que não houvesse uma escandalosa
dualidade de critérios por parte da União Europeia e dos seus Estados quanto àqueles que são terroristas e
quanto àqueles que para a União Europeia não o são, porque são — passe a expressão — os «nossos»
terroristas.
Era importante que acabasse essa dualidade de critérios.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia, do
CDS-PP.