I SÉRIE — NÚMERO 26
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Penso que estes cenários não são exatamente os pretendidos pelo legislador, mas gostava de deixar estas
questões para que pudéssemos, em sede de especialidade, aperfeiçoar a lei, pois queremos ultrapassar
rapidamente o impasse que, infelizmente, foi criado com este Acórdão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.
O Sr. MoisésFerreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas Ângela Guerra e Maria Antónia Almeida
Santos, agradeço as questões colocadas e responderei em conjunto a algumas delas, até porque convergiam
do ponto de vista do conteúdo.
Sr.ª Deputada Ângela Guerra, sobre o anonimato dos dadores, estamos mais de acordo do que em
desacordo. Aliás, creio que a generalidade das iniciativas que são aqui discutidas hoje apontam exatamente no
mesmo sentido, ou seja, apontam para a alteração do regime de confidencialidade daqui para a frente, assim
como disse o Tribunal Constitucional, mas salvaguardando a confidencialidade de quem doou sob esse
pressuposto.
Creio que, na especialidade, conseguiremos chegar a uma redação comum para garantir que as técnicas de
PMA fiquem, novamente, acessíveis a todas as mulheres.
No que diz respeito à gestação de substituição, não consideramos que trazer dois projetos de lei sobre os
dois temas seja confundir os assuntos, porque eles, aliás, foram sempre discutidos em conjunto e a gestação
de substituição, tal como a propomos, é um prolongamento das técnicas de PMA, uma vez que é a aplicação
dessas técnicas a uma pessoa terceira, em situações muito concretas, como a das mulheres que não têm útero
ou que têm uma lesão ou uma doença irreversível e grave que impede a gravidez de forma definitiva.
Portanto, na gestação de substituição também se garante o acesso a técnicas de PMA nestes casos muito
concretos e, por isso, faz sentido que sejam discutidos em conjunto, mesmo com diplomas legais separados.
Não nos parece que isso confunda minimamente a discussão, pelo contrário, traz mais conteúdo à discussão.
Há questões que foram aqui colocadas que são da maior importância e que levantam várias dúvidas,
nomeadamente a da revogabilidade do consentimento da gestante.
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, a primeira proposta do Bloco de Esquerda, que, aliás, foi a que deu origem
à primeira Lei sobre gestação de substituição em Portugal, previa a revogação do consentimento até ao início
dos procedimentos de procriação medicamente assistida, e nós consideramos que esta era a melhor solução.
O problema é que há um Acórdão do Tribunal Constitucional que diz que não pode ser apenas até ao início dos
procedimentos de PMA, que deve ser, pelo menos, até ao momento do nascimento do filho.
Entre termos uma lei que permite efetivamente o acesso à gestação de substituição — apesar de ter alguns
pressupostos com os quais, por princípio, não concordamos — e termos uma letra-morta, ou seja, uma gestação
de substituição a que ninguém pode aceder, preferimos ter uma lei que dá respostas a casos concretos. Mas
não ignoramos que há problemas que se levantam e, por isso, estamos, obviamente, disponíveis para, em sede
de especialidade, dirimir todos esses problemas e chegar a consensos, às melhores práticas legislativas e às
melhores soluções.
O que não queremos é ter aberto uma janela de esperança para algumas mulheres, para alguns casais, que
agora tenha de ser fechada com estrondo, com o argumento de que o acesso à gestação de substituição até
está previsto na lei, mas, afinal, ninguém pode aceder.
Sobre a questão dos 20 dias, e para terminar, Sr. Presidente, queremos dizer que pode haver revogação do
consentimento até ao momento do registo da criança. Ora, segundo o Código do Registo Civil, e nas instituições
de saúde onde já se pode fazer o registo, tal pode ser feito até ao momento da alta clínica, que ocorre, portanto,
em dois ou três dias. Os 20 dias estão previstos para os casos em que não se pode fazer o registo. Esta é uma
variação do que tem sido referido, mas é o que está na nossa proposta.
Não ignoramos dificuldades, mas dificuldades maiores são aquelas por que passam atualmente as pessoas
que necessitam de recorrer à gestação de substituição e não podem, porque, apesar de haver uma lei que diz
que este regime jurídico é legal e constitucional, há determinadas normas que estão suspensas e que impedem
o acesso à gestação de substituição.