30 DE MAIO DE 2019
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Há duas coisas que entendo devemos reter, em política e na nossa vida: aceitar é sempre apesar de. Aceitar
o que é igual é fácil, o que é distinto, o que é diferente, o que nos interpela é que é difícil, porque temos medo
de enfrentar o que não entendemos. Mas é a nossa capacidade de ultrapassar o desconhecido e de nele
mergulhar que nos faz crescer, e isto em política é fundamental.
Optar implica sempre uma perda e nós em política conhecemos bem esse sentimento, só que nem sempre
lidamos bem com ele. É essencial perceber que qualquer escolha implica sempre deixar alguma coisa para trás.
O que é importante é que aquilo que rejeitemos não seja o essencial.
Quarta nota: o envelhecimento. Não ativo nem passivo, a condição de sermos velhos, a forma como nos
relacionamos com os outros e a forma como os outros se relacionam connosco, com o passar dos anos.
As inúmeras expressões que nos identificam são reveladoras do mal-estar e do incómodo que continuamos
a causar na sociedade. Uma sociedade do já, em que tudo é mais ou menos efémero, em que as relações entre
as pessoas são cada vez mais frágeis e individualizadas, até porque as pessoas se distanciam pelo fator
mobilidade ou por qualquer outro. É preciso ser moderno a todo o custo, diria moderninho. Um mundo em que
as marcas comerciais substituíram, em parte, os fatores de sedução, aliás, mais baratos e apelativos.
Não vejam neste desabafo um azedume, não é isso, só que por vezes é muito cansativo e irritante ser velho!
Por exemplo, em vez de nos apelidarem de velhos, que é o que nós somos, inventam um número disparatado
de epítetos: sénior, idoso (o pior!), experiente, antigo, e acrescentam ativo ao envelhecimento para verem se
adoçam o conceito.
Risos do PS.
Não precisamos de nada disto. Precisamos apenas que não nos discriminem e que não nos arranjem umas
gaiolas mais ou menos decentes onde nos depositam…
Aplausos do PS e do Deputado do BE José Moura Soeiro.
…mas que nos incluam e nos responsabilizem.
Pois bem, esta foi uma responsabilidade que assumi. Sou a pessoa mais velha da Assembleia da República,
deste Plenário, de todos os partidos e dos diferentes géneros e sim, assumo, quis provar alguma coisa.
Pretendi, sobretudo, demonstrar que uma pessoa velha se enquadra e se integra num coletivo e que, sim, o
seu contributo é útil.
Aplausos do PS, dos Deputados do BE José Manuel Pureza e José Moura Soeiro e do Deputado não inscrito
Paulo Trigo Pereira.
Aliás, desculpem a imodéstia, dificilmente dispensável, porque ninguém consegue com eficácia dar o salto
em frente de que a humanidade tanto precisa se não compreender o passado e, mais, se não souber com ele
construir a ponte necessária.
Aplausos do PS.
Espero que o meu contributo também tenha constituído um alerta nesse sentido.
Por fim, um esclarecimento: com uma agenda cada vez mais carregada tive receio de perder esta
oportunidade, mas não é uma despedida. Não me vou já embora. Não sou de abandonar os meus
compromissos, mas não voltarei.
Um pedido final a todos os grupos parlamentares: não ponhamos os velhos em guetos, como fizemos anos
a fio com as mulheres,…
Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.
…com o falacioso argumento de um pretenso e especial habitat. Não! Somos todos cidadãos do mundo e
como cidadãos do mundo temos de nos misturar: origens, raças, géneros, idades, ideologias e religiões.