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I SÉRIE — NÚMERO 36

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b) Se se atender às três circunstâncias que, nos termos do Estatuto dos Deputados, justificam

a suspensão temporária de mandato parlamentar, excluindo a «doença grave», que atende

à concreta condição de saúde do Deputado (mas também aí se concretizando o respeito

pela dignidade humana), as duas restantes — «exercício da licença por maternidade ou

paternidade e necessidade de garantir seguimento de processo nos termos do n.º 3 do

artigo 11.º» — carregam em si, necessariamente, uma ponderação de valores, que

entendemos consentida pelo artigo 18.º, n.º 2, da CRP: o princípio constitucional da

estabilidade parlamentar cede perante dois outros direitos e interesses constitucionais,

nomeadamente o direito fundamental à proteção à maternidade e à paternidade (artigo 68.º

da CRP) e o interesse inerente ao Estado de direito de realização da justiça;

c) Mas aceitando-se o catálogo fechado e dele não constando o direito constitucional à

participação política, tal tem por significado atribuir-se a este direito estruturante do Estado

de direito democrático uma valoração material inferior à proteção da maternidade e da

paternidade e da realização da justiça e, nessa medida, incapaz de fazer ceder o princípio

da estabilidade parlamentar;

1.11.1. Entendemos, pelo exposto, que a resposta no plano jurídico não pode reduzir-se ao disposto

no artigo 5.º do Estatuto dos Deputados, não podendo afastar-se a aplicação de preceitos

constitucionais, nomeadamente o contido no artigo 48.º, n.º 1, da Constituição, nos termos

do qual «Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direção dos

assuntos públicos do País, diretamente ou por intermédio de representantes livremente

eleitos», e do artigo 50.º, n.º 1, da Constituição, que determina que «Todos os cidadãos têm

o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos».

1.12. Aliás, o Estatuto dos Deputados determina, no seu artigo 1.º, n.º 3, que «Além das normas

constitucionais diretamente aplicáveis, o estatuto único dos Deputados é integrado pela

presente lei, pelas demais disposições legais aplicáveis, pelas disposições do Regimento da

Assembleia da República e pelas disposições regulamentares emitidas ao abrigo da lei» - o

próprio Estatuto dos Deputados parece afastar a interpretação de estarmos perante um catálogo

fechado;

1.13. O que nos conduz também à Lei Eleitoral para Presidente da República, dado que é nesta que

se alicerça a pretensão do candidato ao exercício do direito fundamental à participação política;

1.14. Nos termos do artigo 6.º, n.º 1, da Lei Eleitoral do Presidente da República10, «Desde a data da

apresentação das candidaturas e até ao dia da eleição os candidatos têm direito à dispensa do

exercício das respetivas funções, sejam públicas ou privadas, contando esse tempo para todos

os efeitos, incluindo o direito à retribuição, como tempo de serviço efetivo», sendo que, nos

termos do n.º 2 deste artigo, «Os magistrados judiciais ou do Ministério Público em efetividade

de serviço, os militares em funções de comando e os diplomatas chefes de missão, quando

candidatos, suspendem obrigatoriamente o exercício das respetivas funções, desde a data da

apresentação da candidatura até ao dia da eleição.»

1.15. Normas de idêntico alcance estão inscritas na Lei Eleitoral para a Assembleia da República;

1.16. Em ambas as leis eleitorais, verificamos que o legislador teve a clara preocupação de garantir

que a todos os cidadãos, sem exceção, seja assegurada a sua capacidade eleitoral passiva,

apenas impondo aos candidatos que exercem determinadas funções a sua não acumulação

com a qualidade de candidato, determinando, nestes casos, a obrigatoriedade da sua

suspensão;

1.17. Tal circunstância inscreve-se também no disposto no artigo 50.º, n.º 3, da CRP, nos termos do

qual «No acesso a cargos eletivos, a lei só pode estabelecer as inelegibilidades necessárias

para garantir a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e independência do exercício dos

respetivos cargos», garantindo assim o direito fundamental da participação política (artigo 48.º,

órgãos autárquicos. Este argumento, levado à letra, conduziria ao seguinte resultado: em vez de substituídos, os Deputados estariam ausentes, o que conduziria a uma Assembleia da República a funcionar com dezenas de cadeiras vazias. 10 Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de maio, na redação atual.