8 DE JULHO DE 2021
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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, do PSD.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor integra o maior Governo de sempre,
o Governo mais caro de sempre, mas nem essa circunstância impede que este Governo dificilmente chegue a
tempo e a horas ao que quer que seja.
Sr. Secretário de Estado, a presente proposta de lei é apenas mais um exemplo a somar a muitos outros,
nomeadamente ao caso que diz respeito à lei das comunicações eletrónicas. Repare: a diretiva da União
Europeia a que a presente iniciativa legislativa diz respeito data de 11 de dezembro de 2018, entrou em vigor a
4 de fevereiro de 2019 e o prazo para a transposição para o direito nacional terminou no dia 4 de fevereiro do
corrente ano, mas só agora o Parlamento é chamado a apreciar a proposta de lei do Governo que, exatamente,
consagra a transposição desta diretiva comunitária.
Sr. Secretário de Estado, o Governo teve tempo — mais do que tempo — para chegar a tempo e horas. Esta
circunstância é ainda mais evidente quando é do conhecimento público que a Autoridade da Concorrência
remeteu ao Governo uma proposta de anteprojeto deste diploma a 3 de abril de 2020, ou seja, há mais de um
ano.
Sr. Secretário de Estado, não sabemos as razões do atraso do Governo, não sabemos por que razão o
Governo omitiu, na exposição de motivos desta proposta de lei, a referência àquele anteprojeto da Autoridade
da Concorrência. Omitiu, também, quaisquer outros estudos ou pareceres que tenham fundamentado a sua
apresentação. Não sabemos, Sr. Secretário de Estado, e até poderíamos relevar tudo isso, se, ao menos, nos
apresentasse uma boa proposta de lei, que operasse uma boa transposição desta diretiva comunitária, mas não
é nada disso que nos é apresentado.
Sr. Secretário de Estado, o que nos é apresentado é uma proposta de lei que evidencia diversos riscos de
uma incorreta transposição da diretiva, que incorre, terminologicamente, em diversas incorreções que reduzem
o âmbito dos poderes de investigação da Autoridade da Concorrência, e isto em desconformidade com a diretiva
e com o direito da concorrência da União, e que, como já foi aqui referido na intervenção que me antecedeu,
suscita sérias dúvidas da sua compatibilidade com as normas constitucionais, como se infere da nota técnica
elaborada pelos serviços do Parlamento, como se infere do parecer da Autoridade da Concorrência e como se
infere do parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Mas, se tudo isso não bastasse, Sr. Secretário de Estado, o que nos é apresentado é uma proposta de lei
que atenta contra a independência e a autonomia da Autoridade da Concorrência, quando o expectável era
exatamente o contrário.
Na verdade, a proposta de lei, Sr. Secretário de Estado, não só não prevê adequadas garantias de autonomia
financeira e de gestão de recursos humanos como faz pior do que isso, introduzindo uma nova modalidade de
intervenção do Governo sobre a missão da Autoridade da Concorrência, como, aliás, está bem visível na
redação do artigo 40.º desta proposta de lei. O Sr. Secretário de Estado leu a primeira parte, mas não leu a
segunda parte do artigo 40.º e, por isso, vou lê-lo na totalidade. Disse o Sr. Secretário de Estado: «A Autoridade
da Concorrência é independente no exercício das suas funções e não se encontra sujeita a superintendência
ou tutela governamental, não podendo o Governo dirigir instruções ou recomendações nem emitir diretivas ao
conselho de administração sobre a sua atividade, nem sobre as prioridades a adotar na prossecução da sua
missão…». O que não disse foi a segunda parte: «… podendo contudo ser destinatária de regras estratégicas
gerais ou orientações em matéria de prioridades não relacionadas com inquéritos setoriais ou com processos
específicos para aplicação dos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.»
Sr. Secretário de Estado, devo dizer que esta posição do Governo não nos surpreende de todo, pois há muito
que sabemos que o Governo lida mal com a independência dos reguladores. Lida mal com a independência dos
reguladores e não perde uma oportunidade para os controlar, como se vê, uma vez mais, com esta proposta de
lei.
Aplausos do PSD.