I SÉRIE — NÚMERO 7
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Passaram-se quatro longos anos e foi preciso uma escassez de sangue, causada pela pandemia, os
protestos de ativistas e coletivos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgénero), o projeto de lei da Juventude
Socialista e várias audições parlamentares para o estudo sair da toca.
Mas, Srs. Deputados, o estudo está feito e a sua conclusão é clara — e cito: «Não existe evidência científica
que suporte a suspensão da dádiva entre homens que têm sexo com outros homens».
É por isso que, desde março, a norma da DGS está revista. Os profissionais do IPST já receberam formação
e está planeado que todos os hospitais também a recebam.
Mas, se a ciência é clara, a igualdade não pode estar sujeita a novas ambiguidades. Ela precisa de força de
lei. É isso que o PS quer fazer com o projeto que hoje discutimos.
Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, está na hora de o Parlamento, mais uma vez, intervir.
Está na hora de encorajarmos a dádiva de sangue e de dizer que a homofobia não tem lugar nesse gesto
nobre e solidário.
Está na hora de dizer que toda a dádiva de sangue é vital para salvar vidas e que nenhuma deve ser
desperdiçada em razão do preconceito.
E, por isso, está na hora de dizer que o preconceito não se pode mascarar de fundamentos científicos que
já se demonstrou não existirem.
Está na hora de o Parlamento pôr na letra da lei que ninguém pode ser impedido de dar sangue em razão da
sua orientação sexual.
Está na hora de garantir que, parafraseando Ary, ninguém mais cerra as portas que a ciência abriu.
Aplausos do PS e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN, para apresentar o
projeto de lei do seu partido.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O sangue é talvez das maiores
dádivas que um ser humano pode dar. A dádiva de sangue é um ato de cidadania que deve ser reconhecido e
respeitado, como devem ser respeitadas todas as pessoas que o doam.
O processo de doação de sangue tem de cumprir, como sabemos, parâmetros científicos e técnicos que
garantam a sua segurança em todo o processo, mas não podem entrar nesta equação critérios de natureza
subjetiva ou discriminatória.
A única discriminação que pode existir é a discriminação de quem tem elegibilidade científica e clínica para
doar sangue e quem não tem. E essa elegibilidade, Sr.as e Srs. Deputados, não se prende com características
pessoais, mas com critérios individuais de risco.
Em Portugal, senhoras e senhores, foram diversas as situações de discriminação em função da orientação
sexual dos dadores, sendo erroneamente assumido que os homens que têm relações sexuais com outros
homens, gays e bissexuais, são pessoas com comportamentos sexuais de risco.
Ora, Sr.as e Srs. Deputados, os comportamentos sexuais de risco existem independentemente da orientação
sexual de cada pessoa. É de comportamentos que falamos, não de pessoas. O risco só pode ser associado,
portanto, a uma pessoa e ao seu comportamento, nunca a um determinado grupo de referência.
Sr.as e Srs. Deputados, a atuação desinformada e subjetiva de alguns profissionais levou a que muitas
pessoas no nosso País tenham sido sujeitas à suspensão temporária da possibilidade de proceder à dádiva de
sangue. Sabemos bem que esta é uma situação com bastantes avanços e recuos há demasiado tempo no nosso
País.
Basta lembrarmos que, em 2016, o Governo já tinha assegurado à Assembleia da República que havia sido
«removida qualquer discriminação com base na orientação sexual» e que era dado o enfoque a comportamentos
de risco independentemente da orientação sexual de cada um. Mas, pouco tempo depois, a norma foi
republicada, retrocedendo nesse avanço e reforçando novamente as práticas de discriminação.
Mas, por pressão política e associativa, e face à visibilidade dada por várias pessoas através de denúncias,
a 19 de março de 2021 é novamente publicada uma norma aplicada à Seleção de Pessoas Candidatas à Dádiva
de Sangue com Base na Avaliação de Risco Individual, que constata finalmente que não existem evidências
científicas que corroborem qualquer suspensão da dádiva de sangue em função da orientação sexual.