I SÉRIE — NÚMERO 15
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É também por isto que não podemos ceder nas condições laborais de quem aqui trabalha e que, mais uma
vez, não decide sobre erros ou acertos da linha de montagem, da falta de trabalhadores, da falta de meios e
materiais em que a obsessão pelo lucro teima em não investir.
É frequente encontrar nestes espaços, onde assistimos a situações de maus-tratos dos animais, questões
de pobreza, assédio laboral, exploração e falta de cumprimento de regras laborais básicas, mas também a
questões de saúde pública e problemas ambientais.
Não será coincidência que as suiniculturas em Leiria sejam das maiores poluidoras dos recursos hídricos
daquela região ou que muitas contaminações por bactérias multirresistentes estejam associadas a produções
industriais de carne.
Tudo isto tem de ter melhor resposta e esta será tanto melhor quanto se compreenda o que impulsiona
essas indústrias e o tratamento global de desprezo e de coação contra qualquer empecilho ao lucro, seja o
ambiente, os trabalhadores ou os animais.
O Bloco de Esquerda reafirma que esta é uma proposta errada que não coloca a tónica nos meios
necessários à garantia de recursos de fiscalização por parte do Estado, de mínimos de investimento
obrigatórios por parte das empresas, à contratação de mais pessoas, ao reconhecimento dos direitos laborais
e da equiparação dos técnicos da desmancha aos veterinários, aos canais de denuncia mais eficazes para os
trabalhadores.
Uma câmara que é controlada por quem já detém o poder e que a pode utilizar de forma intimidatória é
uma ferramenta com a qual não concordamos e, aliás, entendemos que, existindo coragem política, podemos
fazer muita outra coisa para avançar no bem-estar animal sem atentar contra os trabalhadores e sem criar
uma sociedade onde vigiar e punir é o mote.
Estamos, por isso, em desacordo total com este último projeto e reforçamos novamente esta posição.
Reitero o que disse em março de 2018: «Só se garantirá o bem-estar animal se os responsáveis pelas
indústrias alimentares forem fiscalizados de forma pública, transparente e coerente.»
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PCP. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias.
O Sr. João Dias (PCP). — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos hoje dois projetos de lei, ambos na área do bem-estar animal, que o PAN nos traz, tendo um deles a ver com a necessidade de instalar circuitos
fechados de televisão em matadouros.
Srs. Deputados, devemos ter uma premissa de base neste debate: independentemente de o fim dos
animais nos matadouros ser o abate, isso não implica que não se respeitem todas as normas de bem-estar e
de garantia de que os animais são bem tratados. Esta é uma premissa que temos de ter, que temos de
defender e o que temos de analisar é a forma e a motivação que leva a que o PAN traga aqui esta temática.
De facto, o problema que o PAN tem, como revela com a apresentação deste projeto, não é com o bem-
estar animal nos matadouros. O problema do PAN é o da existência de matadouros, porque para o PAN se se
terminasse com os matadouros terminar-se-ia com o problema, até porque, olhando aos motivos que levam a
que o PAN traga aqui este projeto de lei, a primeira coisa que vemos é que responsabiliza os trabalhadores
dos matadouros criando a ideia de que esses trabalhadores são insensíveis e que, além de mais, não
respeitam, deliberadamente, as normas e as regras que estão estabelecidas e definidas na lei. Esta é uma
acusação que é feita aos trabalhadores por parte do PAN.
Depois, faz outra acusação: lança uma suspeita sobre os inspetores sanitários. Esta suspeita está, preto no
branco, no próprio projeto de lei, que diz que os circuitos fechados de televisão nos matadouros são um, e cito,
«meio de identificar problemas de bem-estar animal ou incidentes que podem não ser identificados por quem
estiver no local a observar;». Ou seja, os inspetores sanitários não estão a trabalhar, estão a «observar». O
PAN está a pôr em causa e a lançar uma suspeita sobre os inspetores sanitários!
Mais, Srs. Deputados, o PAN recorre ao Código do Trabalho para justificar a utilização de câmaras de TV,
mas eu fiz um esforço imenso para encontrar, no Código do Trabalho, um instrumento que determine as
relações laborais entre os trabalhadores e as identidades empregadoras e não encontrei nada relacionado