I SÉRIE — NÚMERO 11
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o que disse, tendo demonstrado o conhecimento que detinha sobre este tema em específico, tenha agora esta proposta, que, na prática, traz o que de pior existia no suplemento de recuperação processual.
Por outro lado, é ainda mais perversa esta nova verdade. O Partido Socialista dirá, daqui a minutos, «bem, mas dantes o suplemento era de 10 % e agora é de 20 %, é mais», mas isto significa a «escravidão» total, que foi a palavra que a Sr.ª Deputada Paula Cardoso usou e que os oficiais de justiça também usam. É a escravidão total, é a disponibilidade permanente!
Mais ainda: não é só a disponibilidade permanente. O que isto significa é que, se acontecer alguma coisa — o que é normal acontecer na vida pessoal de cada um dos trabalhadores em geral, e os oficiais de justiça também são trabalhadores, também são pessoas —, toda a remuneração específica deste suplemento, daquele mês, fica em causa. Repito, toda! Imaginemos, por exemplo, que há um problema com um filho, com um familiar, a que se tem de dar apoio. Isso significa que esse suplemento vai à vida. Isto faz sentido?! Faz sentido, até, para um Governo que se diz socialista? Eu creio que é incompreensível. Faz sentido esta lógica de horas extraordinárias indiscriminadas? Isso ainda é mais absurdo.
Julguei que não teríamos de repetir isto, no século XXI, mas pedimos que haja direitos humanos, Código do Trabalho e lei do trabalho aplicados aos oficiais de justiça — que haja, pelo menos, esse respeito, por parte do Ministério da Justiça, na proposta de estatuto que faz.
Aplausos do BE. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Vamos agora passar para o segundo grupo de pedidos de esclarecimento,
tendo já a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do Grupo Parlamentar do PCP. A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, em primeiro lugar, queria
cumprimentá-lo pelo tema que trouxe, que, como todos sabemos, é de extrema urgência e tem que ver com o estado da justiça no nosso País.
De facto, por muito que a Sr.ª Ministra da Justiça diga que 2023 é o ano dos funcionários judiciais, estamos visivelmente muito distantes da resolução dos seus problemas, como se tem comprovado, aliás, pela manutenção das ações de luta por todo o País, que daqui também saudamos e às quais queremos dar força.
Desde a tentativa do Governo de promover, através de exigências várias, a divisão entre os oficiais de justiça — ao não equacionar seriamente um processo de equivalência para todos os oficiais até à extinção do suplemento dos 10 %, com a não efetivação das progressões e promoções a que cada trabalhador tem direito, com a ineficácia no combate à precariedade que hoje grassa nos tribunais, com as questões relativas à aposentação —, comprova-se que não há solução à vista, que conste de qualquer proposta governamental digna desse nome.
Na verdade, a carreira dos oficiais de justiça e a sua valorização são aspetos centrais e imprescindíveis para o bom funcionamento da justiça. Não obstante a exiguidade dos concursos abertos, a verdade é que estes, muitas vezes, não ficam preenchidos, porque a carreira não existe e não é valorizada.
As consequências disto são muito concretas e muito observáveis. Por exemplo, numa matéria que todos clamam ser de grande prioridade, que é a violência doméstica, a gritante falta de funcionários judiciais nas secções especializadas e integradas de violência doméstica — que estão a funcionar, a título experimental, desde 2022 — tem mostrado os impactos reais desta ausência de investimento e de valorização destes funcionários e da justiça.
Posto isto, aquilo que nos resta questionar é, tendo em conta, digamos assim, o momento cronológico e parlamentar em que nos encontramos, com o início da discussão do Orçamento do Estado, se não consideram que esta seria a altura ideal para uma consideração séria e concreta da resolução dos problemas.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada. A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. Falo da inclusão no vencimento do suplemento de recuperação processual, do pagamento a 14 meses, da
abertura a promoções e de novos lugares, da revisão de carreiras, de acordo com as expectativas legítimas dos trabalhadores, assim como de um regime de aposentação digno.