I SÉRIE — NÚMERO 34
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Podemos, naturalmente, discordar da visão mais ou menos equilibrada que esta jurisprudência tem vindo a construir, mas o que é facto é que, perante mais uma decisão do Tribunal Constitucional, a Câmara tem de se conformar com aquelas que são as linhas sobre as quais pode legislar. E é com esse propósito que o Grupo Parlamentar do PS, em diálogo, também, com o Grupo Parlamentar do PSD, proporá à Câmara uma solução que vai ao encontro desta última decisão do Tribunal Constitucional.
Aquilo que ficou claro da última decisão é que não pode haver, em momento algum, a aceitação de uma ideia de conservação generalizada destas duas categorias de dados: dados de tráfego e dados de localização. Assim sendo, na linha desta orientação que o tribunal transmite, o que há a fazer é identificar que só com autorização judicial poderá haver conservação destes dados para habilitar um eventual futuro acesso que possa vir a ser necessário no quadro de uma investigação. Naturalmente, fora disto estão aqueles casos de dados que são conservados com o consentimento dos seus próprios titulares, que, no âmbito das suas relações comerciais ou contratuais com os prestadores de serviços, contemplam a conservação desses dados.
Portanto, muito singelamente, as alterações que propomos introduzir no decreto vetado pelo Sr. Presidente da República são precisamente estas: sublinhar que o que temos de definir é um regime para os dados em que não há um consentimento expresso por parte dos titulares e dizer que ele só pode ter lugar mediante autorização judicial.
Obviamente, sabemos — e também foi isso que nos foi transmitido pelos órgãos de polícia criminal, pelas autoridades de investigação que foram ouvidas no Parlamento — que há alguma celeridade e urgência na obtenção destes dados, e portanto a configuração deste meio para a obtenção de autorização judicial tem de ser célere, tem de ser objeto de uma decisão que propomos vir a ser no máximo de 72 horas, mas em que é necessário acautelar, evidentemente, o efeito útil deste pedido de autorização.
Por isso, o que propomos é que, na pendência do pedido desta autorização judicial, que terá de ser emitida no prazo de 72 horas, obviamente, tenha de vigorar uma proibição de destruição dos dados que são requisitados — mais uma vez, reitero: um pedido concreto sobre o acesso a dados específicos necessários para uma investigação criminal, não um acesso generalizado depois de uma conservação generalizada —, e parece-nos que isto deve continuar a fazer-se nos termos que propúnhamos na versão que foi agora vetada, ao mais alto nível, em sede de uma formação específica do Supremo Tribunal de Justiça que se especialize nesta matéria.
Consequentemente, as alterações propostas procuram responder a estas dúvidas: só com autorização judicial, acautelando-se a celeridade do procedimento, garantindo-se a utilidade da decisão e também, obviamente, tendo em conta que estamos a falar apenas de duas categorias de metadados, e duas categorias de metadados em que previamente não houve um consentimento por parte do titular.
Parece-nos que é o fim de uma estrada que há muito procuramos trilhar. Esperemos que seja possível, desta forma, construir um regime jurídico, que pode não ser ideal, podemos não concordar com ele, mas é aquele para o qual a leitura jurisprudencial nos empurra e é aquele para o qual esperamos que a Câmara consiga construir uma solução.
Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — Para intervir em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem agora a palavra o
Sr. Deputado André Ventura. O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente de algumas bancadas, desejo um bom ano de 2024, a si e a
todos os Colegas. Este é um processo que era importante resolver de forma rápida e urgente. Como alertámos na altura, as
questões de inconstitucionalidade sobre os metadados poderiam colocar em causa — como colocaram, nalguns casos — o decurso de algumas investigações criminais importantes, investigações criminais que não eram só importantes pelo seu tema, pela sua materialidade, mas pelo impacto que tinham na sociedade, pois algumas relacionavam-se diretamente com problemas de ordem pública e de criminalidade grave, organizada e altamente violenta.
Falamos de crimes de rapto, falamos de crimes de tráfico de droga, falamos de crimes de terrorismo, ou de apoio ao terrorismo, ou de pertença a associação ou organização terrorista, falamos de uma panóplia de temas que era importante a Assembleia da República resolver.